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Musicoterapia e a Maternidade

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Revista Nursing

Artigo Completo gentilmente cedido pela Revista Nursing – Ed. portuguesa.

 

Sónia Isabel Horta Neto

Enfermeira

Doutorada em Ciências de Educação na Universidade Moderna

Hospital Distrital de Faro – UCINP: Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais e Pediátricos

INTRODUÇÃO

O uso da música é tão antigo como o próprio Homem. Desde os papiros médicos egípcios do ano de 1500 A.C., que se faz referencia ao encantamento da música relacionada com a fertilidade da mulher. Na Bíblia, encontramos como David efectuava música curativa frente ao Rei Saul. Em diversas culturas, lendas, cosmogonias e cultos sobre a origem do Universo, o som joga um papel decisivo.

Assim, a música foi para o Homem primitivo um meio de comunicação com o infinito, por exemplo: para os egípcios o Deus Thot criou o mundo com a sua voz. Os médicos bruxos utilizavam os seus rituais mágicos, canções, sons, danças e expressão corporal para expulsar os espíritos malignos que existiam no doente.

Por sua vez, os gregos deram à música um emprego razoável e lógico, sem implicações mágicas ou religiosas, utilizaram-na como prevenção e cura de algumas doenças físicas e mentais (Maranto, 1992).

Se pensarmos bem, durante toda a nossa vida, relacionamo-nos com a música. Desde muito cedo, na nossa vida, ainda “in útero”, começamos a estar familiarizados com os sons e a música e continuaremos até ao final da nossa vida. Ouvimos música quando estamos tristes e queremos pensar. Ouvimos música quando estamos alegres e dançamos. Ouvimos música quando queremos concentrar-nos para estudar e etc.

A toda a hora, minuto ou segundo estamos ouvindo sons: o cão que ladra, o som da televisão, pessoas a falarem, música do rádio, etc. Porque não utiliza-la num doente em coma? Sabemos que conseguem ouvir-nos. Porque não utiliza-la para relaxar e diminuir a dor dos doentes terminais? Porque não utilizá-la para curar ou prevenir?

Porque não utilizá-la para os pais comunicarem com o seu bebé in-utero ou recém-nascido, que é um ser ultra-sensível?

A MÚSICA COM FINS TERAPÊUTICOS

DEFINIÇÃO DE MUSICOTERAPIA

O termo Musicoterapia provoca confusão, porque a música em si não tem um verdadeiro efeito curativo. Poderia-se utilizar melhor o termo de “Técnicas psicomusicais de reabilitação ou de estimulação musical para o desenvolvimento”.

A Musicoterapia é o uso da música para melhorar o funcionamento físico, psicológico, intelectual ou social de pessoas que têm problemas de saúde ou educativo. Pode então ser definida como “um processo de intervenção sistemática, na qual o terapeuta ajuda o paciente a obter a saúde através de experiências musicais e de relações de se desenvolvem através delas como as forças dinâmicas para a troca” (Bruscia, 1998[1]).

Segundo a teoria biomédica[2] a musicoterapia “é a melhoria das capacidades humanas através do uso organizado das influências da música sobre o funcionamento do cérebro humano”.

INDICAÇÕES DA MUSICOTERAPIA

A musicoterapia tem um campo de acção bastante extenso podendo ser utilizada em crianças, adultos e idosos com diferentes problemas físicos, emocionais, intelectuais ou sociais. E ainda para melhorar o bem-estar pessoal, para desenvolver a criatividade,

melhorar a aprendizagem, para melhorar as relações interpessoais e para o alívio do stress.
Sendo assim, a Musicoterapia a quem beneficia?
· A crianças com:
o Dificuldades na aprendizagem;
o Problemas de conduta;
o Transtornos profundos no desenvolvimento (autistas);
o Deficiência mental;
o Dificuldade na socialização;
o Baixa auto-estima;
o Transtornos médicos crónicos e/ou degenerativos (cancro, cardiopatias, problemas da dor, etc.);
· A pessoas com:
o Doenças degenerativas devido à idade (Alzheimer entre outras);
o Problemas de farmacodependência e abuso de substâncias;
o Dano cerebral devido a doenças ou traumatismos;
o Incapacidades físicas devido a doenças degenerativas ou a acidentes;
o Problemas de dor aguda ou crónica devido a diversas condições (sequelas de acidentes, cancro, etc.);
o Pessoas com doenças terminais.
· A pessoas que não têm problemas de saúde, mas que lhes permite utilizar a música para:
o Reduzir o stress fazendo e ouvindo música;
o Nas mulheres, como apoio no processo do parto;
o Aumentar a criatividade e a capacidade de resolver problemas;
o Para diminuir a ansiedade;
o Para melhorar a auto-estima;
o Controlar o stress.
· A Musicoterapia permite às pessoas:
o Explorar os seus sentimentos;
o Fazer trocas positivas no seu estado de ânimo e no seu estado emocional;
o Desenvolver um sentido de controlo das suas vidas através de experiências de êxito;
o Aprender a pôr em prática habilidades para resolver problemas e conflitos;
o Melhorar as habilidades de socialização.

FORMAÇÃO DO MUSICOTERAPEUTA

O Musicoterapeuta recebe uma formação dentro de quatro áreas:
· Área musical;
· Área pedagógica;
· Área da medicina;
· Áreas específicas da Musicoterapia.

ÂMBITOS DE APLICAÇÃO

A musicoterapia pode funcionar em dois âmbitos de aplicação, sendo eles:
· Preventiva
· Curativa

EFEITOS DA MUSICOTERAPIA

A música pode afectar a vários níveis no Ser Humano. Sendo assim, pode ter efeitos:
· Cognitivos;
· Espirituais e transcendentes;
· Bioquímicos;
· Fisiológicos;
o Pressão do sangue;
o Ritmo cardíaco e pulso;
o Ritmo da respiração;
o Resposta galvânica da pele;
o Respostas musculares e de motricidade;
· Psicológicos;
· Sociais

METODOLOGIA

A metodologia utilizada na Musicoterapia pode ser de dois tipos:
· Activa (os métodos activos consistem na improvisação musical, canto, dança e etc.);
· Passiva ou receptiva (os métodos passivos consistem na audição musical).

MUSICOTERAPIA E A MATERNIDADE

IMPORTÂNCIA DA MÚSICA NA GRAVIDEZ

O bebé é um ser ultra-sensível, capaz de ouvir, sentir, ver e ouvir In útero. Sendo assim, leva-nos a pensar: Será que os sons, a música o influenciam? Sim, ele sente e inclusive consegue responder através da respiração, movimento da cabeça, tronco e olhos, gestos, e nas suas expressões faciais. Existe ainda uma relação causa-efeito entre vozes e musica nos bebés. Aliás, através da voz e da música que escuta, fortalece-se e nutre a relação mãe-filho, além de ajudar ao desenvolvimento das ondas cerebrais e ao sistema nervoso conjunto do bebé. Sendo assim, a música que o bebé ouve antes de nascer pode enriquecer o seu desenvolvimento físico, emocional e intelectual.
O facto de o bebé ouvir música traz benefícios a curto e longo prazo. A curto prazo, porque melhora a alimentação, diminuem o choro e dormem melhor. A longo prazo, porque a música estimula o cérebro para aumentar e melhorar as formas do pensamento (Bobak e Jensen, 1999).
O bebé por nascer consegue ouvir diversos sons desde batimentos cardíacos, movimentos intra-uterinos, a voz materna e sons do ambiente, tais como vozes, ruídos e música. É um ser ultra-sensível às trocas com os seus pais e desta forma, a mãe é para o bebé o interlocutor interactivo privilegiado. Este estabelece redes de comunicação possibilitadas pelas capacidades sensoriais e forma-se um “espaço acústico” ocupado pelos sons produzidos por ambos. Este novo espaço, inclui-se dentro do mundo acústico circundante familiar, social e cultural. A voz da mãe representa a continuidade da vida intra-uterina. Nas suas características há esquemas referentes à forma, intensidade, ritmo e emoção que oferece referências sensoriais que favorecem o vinculo de apego, este serve de laço e quanto mais precoce for esta “comunicação”, melhor o vínculo mãe-bebé. A voz materna entonada é mais eficaz que o próprio rosto para sossegar o bebé. No entanto, o bebé não é apenas um receptor passivo, ele também responde e é um interlocutor activo. Tem uma activa e intensa participação na interacção com a mãe e é produtor de efeitos sonoros capazes de produzir efeitos na mãe (Gispert, 1990).
Contudo, os bebés não respondem todos da mesma forma aos mesmos sons, isto porque, cada um responde melhor ao estilo de música a que se expôs durante a vida intra-uterina repetidamente. Este factor depende dos gostos e cultura maternos: chamada a história sonoro-musical, como por exemplo, as músicas de embalar de diferentes origens e países.

MUSICOTERAPIA NA PREPARAÇÃO PARA O PARTO

A sessão de musicoterapia consiste em exercícios de relaxamento físico e na audição musical. Na preparação para o parto, utiliza-se a música conjugada com técnicas específicas, tais como:
· Técnica Lamaze (onde se utiliza o conhecimento e a relaxação para controlar a dor);
· Grantly Dick-Read (combina técnicas de relaxamento e educação pré-natal para combater o medo, a tensão e a dor na sala de parto);
· Bradley (centra-se numa boa dieta e utiliza o exercício para aliviar as dores e preparar os músculos para o parto e os seios para a amamentação).
Alguns investigadores defendem que a utilização da música juntamente com as técnicas mencionadas, potenciará os resultados, pelas seguintes razões:
· A música é um meio muito eficaz como foco de atenção;
· A música é um meio de distracção que não reduz a experiência subjectiva do mesmo;
· A música é um estímulo agradável;
· A música como estimulo condicionado para o relaxamento;
· Permite utilizar mais facilmente o método de imaginação guiada.

A preparação para o parto com utilização da música deverá aplicar-se em várias sessões, como se pode evidenciar no exemplo seguinte:
· 1º sessão: Durante 30 minutos explica-se a cada um em que vai consistir a experiência e técnicas se utilizarão;
· 2ª sessão: Cada mãe escuta 20 temas musicais para seleccionarem a que gostam mais;
· 3ª sessão: Faz-se exercícios de relaxamento utilizando diferentes métodos durante 50 minutos, juntamente com a audição musical;
· 4ª sessão: Repete-se a sessão anterior e trata-se de despertar confiança e diminuir a ansiedade tanto quanto seja possível. Pede-se à paciente que repita os exercícios em sua casa;
· 5ª sessão: Escolhe-se a música que a paciente deseja ouvir no momento do parto. O tipo de música em geral é eufórico e muitas vezes envolve lembranças da vida dos pais;
· 6ª sessão: Repetição das sessões 4 e 5 com menos verbalizações.

2.3 – MUSICOTERAPIA NO PARTO

O musicoterapeuta começa a sessão no momento do parto. No momento em que se pede à mãe para fazer força a cada contracção, o tempo, intensidade e energia da música aumentaram para ajudar a mãe a dar-lhe mais energia.
O ritmo da música é utilizado sincronizado com o ritmo da respiração. A audição musical acaba quando nasce o bebé.
Está comprovado que as experiências musicais activas e passivas podem:
· Diminuir o medo e a ansiedade;
· Reduzir o tempo que duram as dores de parto;
· Servir como ponto focal de distracção (método Lamaze);
· Regular a respiração;
· Aumentar a euforia do nascimento;
· Reduzir a dor;
· Fomentar o bem-estar da criança;
· Diminuir o período de trabalho de parto;
· Influir no tempo de dilatação.

A MÚSICA E O RECÉM-NASCIDO

A música pode ajudar ao recém-nascido a três níveis:
· Emocionalmente, através das canções de embalar e a audição musical;
· Fisiologicamente, através de massagens e movimentos corporais suaves com música de fundo;
· Cognitivamente, mediante a estimulação sensorial com ajuda da música.
O bebé deve começar a ser estimulado quando in útero, mas deve continuar a ser estimulado. A estimulação do recém-nascido faz-se através do baby talk e canções de embalar. O baby talk é a modificação da fala dos adultos ao aproximar-se do bebé e esta promove o desenvolvimento da linguagem, sensibilidade e atitude musical da criança. As canções de embalar apesar de terem todas o mesmo objectivo, as características divergem muito umas das outras dependendo da sua origem tal como mencionado anteriormente (Whaley e Wong, 1999).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Enquanto enfermeiros devemos aconselhar a grávida a fazer preparação para o parto se possível com música, a relaxar uns minutos com uma música que goste e a comunicar com o seu bebé in útero e depois recém-nascido. Deve ser explicado à futura mãe que o bebé é um ser sensível às trocas com os seus pais. E este tipo de conhecimento é, crucial para as mães. Deve ser valorizada a sua interacção com o seu filho e para não o desvalorizar. Porque, o bebé, apesar da sua aparência engraçada devido ao pequeno tamanho, membros curtos, olhos brilhantes, testa ampla e face redonda, é capaz de despoletar um sorriso e sensação de carinho a qualquer pessoa. Este bebé é também portador de uma grande inteligência e interage com a sua mãe através do contacto visual, tacto, expressões faciais e principalmente auditivas.
Deve ser realçado junto da mãe que se não estimular o seu filho, se não se “comunicar” com ele, este tem poucas oportunidades para manifestar as suas capacidades.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBAK, Irene; JENSEN, Margaret – Enfermagem na Maternidade. 4º ed. Loures: Lusociência, 1999. ISBN 972-8383-09-6

KINDESRLEY, Dorling – Enciclopédia de medicina. Lisboa: Selecções Reader’s Digest, 1997

OPPERMAN, Cathleen; CASSANDRA, Kathleen – Enfermagem Pediátrica Contemporânea. Loures: Lusociência, 2001. ISBN 972 8383 19 3

GISPERT, Carlos – Enciclopédia da Psicologia Infantil e Juvenil – Desenvolvimento da criança. Braga: Lusodidacta, 1990

WHALEY; WONG – Enfermagem Pediátrica – Elementos essenciais à intervenção electiva 5ª edição. Rio de Janeiro: Editora Guanobara Koogan S.A., 1999

http://educacao.sapo.pt/XE062/248726.html

http://www.encolombia.com/musicoterapia.htm

http://www.mtonline.it/

http://www.musicoterapia.com.ar/

http://www.musicoterapia.it/

http://www.pamonline.it/

http://planeta.clix.pt/esca/musicoterapia.html

http://webspace.pronet.it/fedim/Musicoterapia.htm

MARANTO, Cheryl Dileo – Aplicaciones de la musica en medicina. 20p. [S.l.]: 1992

In http://www.musicoterapia.it/
In http://planeta.clix.pt/esca/musicoterapia.html