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Mudar ou não de hospital?

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Revista Nursing

O ingresso e mobilização dos profissionais e concretamente dos enfermeiros nos hospitais denominados, genericamente, hospitais públicos, tem sofrido algumas alterações nos últimos anos.

Título:

Mudar ou não de hospital?

Contributos da identidade organizacional e profissional no grupo dos enfermeiros

To change or not of hospital? – Contributes of the organizational identity and professional in the group of the nurses

Nursing nº248

Autora:

Isabel Rodrigues Gonçalves.

Enfermeira Especialista em Saúde  Infantil e Pediátrica e Mestre em Comportamento Organizacional.

Enfermeira Coordenadora

Hospital da Luz
Âmbito da realização do estudo:

Dissertação de Mestrado em Comportamento Organizacional no Instituto Superior de Psicologia Aplicada.

Resumo

Este estudo teve como objectivo analisar os contributos da identidade profissional e organizacional na permanência dos enfermeiros nas organizações hospitalares. Estudaram-se 22 enfermeiros. As suas idades variaram entre os 22 e 50 anos, o tempo de exercício profissional é em média de 10 anos e para metade destes enfermeiros a instituição actual é a primeira onde trabalham. Quanto ao vínculo, 82% dos enfermeiros pertencem ao quadro da função pública.

Para a recolha da informação foi utilizada a técnica da entrevista e, para a operacionalização desta, foi construído um guião como instrumento de colheita de dados. A abordagem seleccionada foi a qualitativa, tendo o conteúdo das entrevistas sido submetido a análise de conteúdo.

Dos resultados encontrados, verifica-se que, a imagem dos enfermeiros acerca da sua organização e da profissão, bem como a identificação que sentem com ambas, desempenham um papel importante tanto na sua identidade organizacional como profissional. Por outro lado, a identidade profissional de um grupo específico actua sobre a identidade organizacional do hospital e vice-versa e ambas influenciam e são influenciadas pelas várias identidades que coexistem no hospital. A associação de todos estes factores actua na permanência dos enfermeiros nos hospitais.

Abstract 

This paper reports a study whose purpose was to analyze the contribution of professional and organizational identity of the nurses’ permanence in hospital organizations. The study sample was composed of 22 nurses. Their ages range between 22 and 50 years old. Their professional experience presents an average of 10 years and for half of them the present institution is the first one they work for. 82% of these nurses are civil servants in National Health Service.

The interview was used to collect data and to take this into operation an interview script was conceived. The approach was qualitative and the interviews were submitted to content analysis.

From the results one may observe that nurses image about their organization and profession, as well as their self identification with both, have an important role, either for their organizational identities or for their professional ones. On the other hand, the professional identity of a specific group acts upon the organizational identity of the hospital and vice versa, and both influence and are influenced by several identities co-existing in the hospital. The association of all these factors acts upon the permanence of nurses in the hospital.

1. Introdução 

Relativamente a Portugal e de acordo com a informação disponível das estatísticas de saúde da Direcção Geral de Saúde (2005), nos hospitais da sub-região de Lisboa, trabalhavam, em 2003, 7561 enfermeiros. Este é, de facto, o grupo profissional mais numeroso nas organizações hospitalares. O ingresso e mobilização dos profissionais e concretamente dos enfermeiros nos hospitais denominados, genericamente, hospitais públicos, tem sofrido algumas alterações nos últimos anos. A mobilidade tornou-se mais flexível e mais susceptível a factores tradicionalmente pouco relevantes neste sector, como sejam as leis do mercado e da concorrência.

Com uma maior flexibilização da mobilidade no sector da saúde e especificamente no grupo profissional dos enfermeiros, é possível que ocorra também um aumento da rotatividade destes profissionais. A rotatividade (turnover), entendida como saída efectiva dos trabalhadores, tem vindo a ser alvo de estudo há já várias décadas. Ela encontra-se intimamente ligada à gestão dos recursos humanos das empresas e estes permanecem como um dos pilares fundamentais para o sucesso organizacional. São várias as implicações da grande rotatividade em termos de recursos humanos, em qualquer organização, e, como tal, também nas organizações hospitalares. Uma grande rotatividade impede a constituição de equipas estáveis, bem treinadas, com capacidade de responder com qualidade à grande diversidade e complexidade de situações que ocorrem habitualmente nas organizações hospitalares. Collins (2004) refere que os custos com o turnover podem, em média, rondar os 150% dos gastos com os salários anuais dos trabalhadores nos serviços de saúde. Relativamente aos enfermeiros a literatura fornece-nos alguns contributos no que respeita ao turnover. Newman, Maylor e Chansarkar (2002), referem que, em Inglaterra, o turnover dos enfermeiros no sistema nacional de saúde foi, em 1997, de 16% em média. Nos Estados Unidos da América a média de turnover entre os enfermeiros nos hospitais variou entre 10 e 30% no ano 2000 (Holtom e O’Neill, 2004). Waldman, Kelly, Arora e Smith (2004) estudaram os custos do turnover num conjunto de hospitais e verificaram que anualmente era gasto, com a saída dos profissionais, cerca de 5% do orçamento disponível, sendo o maior dispêndio no grupo profissional dos enfermeiros. O custo associado à baixa de produtividade dos novos contratados é igualmente significativo, embora este seja o aspecto mais difícil de quantificar, segundo os autores.

1.1 – Identidade Profissional

A identidade a um nível individual e de um ponto de vista social é uma construção que resulta da interacção com os outros. Segundo Tajfel e Turner (1987, cit por Caetano e Vala, 1994), na sua teoria da identidade social, os indivíduos tendem a classificar-se e a classificar os outros como membros de grupos ou categorias sociais. Segundo Sainsaulieu (1996), o modo como se processam as relações socioprofissionais, no âmbito das organizações, permite-nos compreender a distinção entre categorias profissionais, tendo por base as diferenças de estatuto, definidas pela conjunção entre a qualificação obtida na própria organização e a posição ocupada numa escala de lugares de responsabilidade crescente.

A construção da identidade profissional resulta da forma como os indivíduos nos diferentes grupos se identificam com os pares, os chefes e os outros grupos (Dubar, 1997). De acordo com Tajfel (1983), o facto dos indivíduos serem membros de vários grupos sociais faz com que essa pertença contribua de forma positiva ou negativa para a imagem que têm de si próprios. Um grupo com um baixo estatuto social é implicitamente ameaçado por um grupo que tenha um estatuto social mais elevado. Por outro lado, um grupo com elevado estatuto social mais dificilmente se sente ameaçado e menor necessidade tem de afirmação.

São os próprios enfermeiros que necessitam construir a sua identidade profissional, contribuindo para tal a definição muito clara da sua área de actuação. Verifica-se que existe uma falta de compreensão, genericamente, por parte da sociedade sobre o trabalho que é efectuado pelos enfermeiros (Buresh e Gordon, 2004).

Carapinheiro (1998), no seu estudo acerca dos saberes e poderes no hospital, refere que os enfermeiros sentem dificuldades em afirmar a sua identidade e autonomia porque a sua actividade se desenvolve integrada num processo produtivo organizado em redor de vários poderes (médico, administrativo, enfermagem, doente) e no qual é dominante o poder médico; constituindo um forte condicionalismo estrutural nas formas e limites de autonomia dos outros grupos. O reconhecimento do papel psicossocial como o papel dominante da profissão de enfermagem e indutor da “verdadeira” autonomia e o facto do seu estatuto social ser determinado pela sua posição objectiva na produção de cuidados, pode contribuir para alguma contradição na identidade profissional dos enfermeiros. Não tendo herdado as bases de um ofício nem as bases de uma profissão que funda os seus alicerces no domínio da escrita, torna-se difícil à enfermagem forjar uma identidade relacionada com a natureza da prestação e dos serviços oferecidos aos olhos dos beneficiários dos cuidados. No entanto, tal como Collière (2003) refere, “explicitar a natureza dos cuidados prestados continua a ser a condição imperiosa para o reconhecimento de uma identidade profissional de enfermagem” (p.98).

1.2 – Identidade Organizacional

A identificação que os indivíduos desenvolvem com as suas organizações influencia o empenho, lealdade e turnover dos mesmos relativamente a essas organizações (Asforth e Mael, 1989; Dutton, DuKerich e Harquail, 1994; Foreman e Whetten, 2002).

De acordo com Albert e Whetten (1985), identidade organizacional pode ser definida da seguinte forma:

  1. O conjunto de principais características que são identificadas como sendo a essência da organização, ou seja, aquilo que são os aspectos centrais do seu carácter.
  2. O conjunto das principais características que distinguem aquela organização das demais, ou seja, os aspectos que definem a distinção entre a organização e as outras.
  3. O conjunto das características que exibem algum grau de semelhança ou continuidade ao longo do tempo, isto é, os aspectos organizacionais que transmitem a continuidade temporal da mesma.

Ainda segundo Albert e Whetten (1985), não é possível definir concretamente, com um conjunto de propriedades mensuráveis, aquilo que se entende por características centrais, na medida em que cada organização pode ter um enfoque em características essenciais diferentes, de acordo com a natureza e o objectivo pretendido quando se questiona sobre a identidade da organização. Esta reflecte-se nos valores partilhados, na missão, na estrutura e processos, na cultura e clima organizacional sendo mais abrangente do que cada um destes conceitos per si (Ashforth e Mael, 1989).

Dutton et al. (1994) referem que quanto mais atractiva é a identidade organizacional para os membros organizacionais maior será a sua identificação com a organização. A identidade organizacional e a sua consistência ou inconsistência ajudam a perceber quando, onde e como os indivíduos se motivam para levar por diante, ou não, as iniciativas da organização. Quando as acções organizacionais são entendidas pelos seus membros como consistentes com a identidade da mesma promovem-se sentimentos positivos (Dutton e Dukerich, 1991).

De acordo com Albert, Ashforth e Dutton (2000), quer a identidade quer a identificação são  aspectos bastante importantes na vida das organizações actuais. Numa perspectiva macro, quando o ambiente se torna mais dinâmico e complexo, as organizações necessitam ser mais flexíveis. As hierarquias são cada vez menos verticais e o aumento do empowerment das equipas de trabalho bem como a atribuição das competências secundárias a empresas de outsourcing, são formas de criar pólos flexíveis de trabalho. Na ausência de estruturas burocráticas externas, torna-se mais importante que internamente na organização se saiba exactamente o motivo da existência da mesma e para onde se pretende ir, isto é, um claro sentido de identidade organizacional. “A noção de identidade serve de leme para navegar em águas difíceis” (Albert et al. p.13).

Dum ponto de vista micro, ainda segundo Albert et al. (2000), identidade e identificação são igualmente importantes nas organizações actuais; quando se assiste a processos massivos de downsizings nas empresas e à redução das relações contratuais de longo termo. A noção de identificação e de lealdade para com a organização parece ser quase utópica. É, no entanto, por esta perda de âncoras organizacionais que a identidade e identificação dos indivíduos para com as organizações se torna particularmente importante.

A questão de partida deste estudo foi saber de que modo a identidade organizacional e a identidade profissional contribuem para a fidelização dos enfermeiros às organizações hospitalares, partindo do pressuposto que, com este conhecimento, será possível encontrar estratégias que auxiliem a redução do turnover neste grupo profissional. Em termos de identidade profissional, procurou-se conhecer como se identificam estes profissionais com a profissão, tendo em conta a evolução que a mesma tem sofrido ao longo dos últimos tempos. Procurou-se também analisar se o hospital seria o meio para os enfermeiros poderem concretizar a sua profissão ou um espaço com o qual se identificam. Procurou-se, igualmente, conhecer quais os comportamentos que os enfermeiros adoptam nos locais onde exercem a sua actividade e que possam contribuir para a compreensão da fidelidade que estes têm, à sua organização.

Como objectivos do estudo foram definidos os seguintes:

  • Analisar os contributos da identidade organizacional na permanência dos enfermeiros nas organizações hospitalares;
  • Analisar os contributos da identidade profissional na permanência dos enfermeiros nas organizações hospitalares;
  • Identificar outros factores organizacionais que possam interferir na permanência dos enfermeiros nos hospitais.

2 – Material e método

Este é um estudo exploratório e descritivo, tal como diz Robson (2002), na medida em que se procura conhecer e descrever uma determinada realidade. Na recolha da informação, foi utilizada a técnica da entrevista e, para a operacionalização desta, foi construído um guião como instrumento de colheita de dados. As entrevistas foram efectuadas por um entrevistador (a autora), individualmente, a cada um dos participantes. A modalidade de entrevista utilizada foi a semi-estruturada (Robson, 2002).

A primeira parte do guião da entrevista destina-se à caracterização sócio-demográfica dos indivíduos. O restante guião pretende dar resposta aos objectivos do estudo, nomeadamente, conhecer as contribuições da identidade organizacional e profissional na permanência dos indivíduos nas organizações. Tendo sido identificadas na literatura as variáveis identidade organizacional e profissional, estas serviram de base à elaboração dos grandes grupos de questões constituintes do guião. Porque o estudo é efectuado em organizações hospitalares, onde convivem diversas profissões que podem influenciar a identidade organizacional, profissional e, nomeadamente, a permanência dos enfermeiros nestas organizações, considerou-se relevante incluir também um grupo de questões relativo a este aspecto. Desta forma o guião da entrevista constituiu-se em quatro partes:

1 – Dados Sócio-Demográficos;

2 – Identidade Organizacional;

3 – Identidade Profissional;

4 – As diferentes Identidades Profissionais na Organização.

Os participantes foram seleccionados de dois hospitais com idêntico número de camas, de acordo com a facilidade em termos de acessibilidade ao número de indivíduos necessário para obtenção da saturação da amostra. A recolha de informação foi efectuada em meio hospitalar através de entrevista individual e o conteúdo das entrevistas foi sujeito a gravação áudio mediante autorização dos participantes, respeitando os princípios éticos inerentes a este tipo de estudo.

Para o estudo foram seleccionados enfermeiros de ambos os sexos. Procurou-se também incluir na amostra enfermeiros das várias categorias profissionais que estão na prestação directa de cuidados, abrangendo-se, desta forma, um leque mais vasto de idades, por se entender que as suas percepções de identidade organizacional e profissional poderão ser diferentes. Os indivíduos foram seleccionados de uma forma não probabilística e por conveniência.

Os critérios utilizados foram os seguintes:

  • Enfermeiros portugueses a exercerem funções em organizações hospitalares pertencentes à Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT).
  • Enfermeiros que trabalham na instituição há seis meses ou mais. Os primeiros seis meses de trabalho numa instituição foram considerados como o tempo de integração e adaptação ao trabalho e à instituição.
  • Categoria profissional – Aqui foram consideradas as categorias definidas na carreira para os enfermeiros do Sector Público Administrativo (S.P.A.):- Enfermeiro – até seis anos de experiência profissional
  • – Enfermeiro graduado – mais de seis anos de experiência profissional
  • – Enfermeiro especialista – necessária uma pós–graduação numa área de especialização de enfermagem.

Os enfermeiros que não pertencem ao quadro da função pública foram incluídos na primeira categoria por nesta caberem todos os enfermeiros com menos de seis anos de experiência profissional; situação em que estes enfermeiros se encontram actualmente.

Dos 22 participantes estudados, verifica-se que a média das idades é de 35 anos e a maioria dos participantes (16) são do género feminino correspondendo a 73% do total de sujeitos. Quanto à categoria profissional, 7 enfermeiros, correspondendo a 32%, encontram-se na categoria profissional de enfermeiro; a mesma percentagem na categoria de enfermeiro graduado e 8 enfermeiros (36%) na categoria de enfermeiro especialista. A média de tempo de exercício profissional encontrada entre os participantes é de 12 anos, sendo o mínimo de 8 meses e o tempo máximo de 28 anos. Já no que respeita ao tempo de exercício profissional dos participantes no hospital actual, verifica-se que a média é de 10 anos, com o mínimo de 8 meses e o máximo de 27 anos, havendo, no entanto, uma percentagem significativa de 45% (10 indivíduos) que se encontra no hospital num período igual ou inferior a cinco anos. Verificou-se igualmente que metade dos participantes referem ser o hospital actual o primeiro hospital onde trabalham. Em relação ao número de instituições nas quais os participantes trabalharam antes do actual, verifica-se que metade nunca trabalhou noutra instituição. Dos restantes, 32% trabalhou previamente numa instituição e em igual percentagem, 9%, respectivamente, em duas e três instituições. Quanto ao tipo de vínculo a grande maioria dos participantes, 82%, pertence ao quadro da função pública e apenas 18% possui como vínculo à instituição onde exerce funções, um contrato individual de trabalho.

3 – Resultados

As entrevistas efectuadas foram sujeitas a uma transcrição integral de todo o conteúdo verbal, obtendo-se assim o corpus, o qual foi, por sua vez, submetido a análise de conteúdo, tendo por base os conceitos de Bardin (1991) sobre análise de conteúdo, bem como os contributos de Vala (1999) e Huberman e Miles (1988).

As categorias foram obtidas previamente a partir do referencial teórico que suporta o estudo e correspondem, genericamente, às questões do guião da entrevista, agrupadas segundo as áreas em análise. Áreas essas que são a identidade organizacional, identidade profissional e um conjunto de categorias acessórias e complementares às anteriores, denominando as diferentes identidades profissionais na organização.

Por cada categoria foram definidas sub-categorias que emergiram dos conteúdos analisados, tendo sido igualmente contabilizada a frequência de sujeitos que referiram cada sub-categoria. Foi efectuada uma definição conceptual de cada categoria, com base nos dados já trabalhados, de onde emergiram temas por categoria. Em seguida, estes temas foram agrupados em grandes temas. Apresenta-se um quadro resumo com as categorias, temas emergentes e grandes temas por área de estudo. No final apresenta-se um modelo no qual se pretende, de forma sintética, fazer uma súmula conclusiva dos dados obtidos.

Quadro I – Categorias / Temas / Grandes temas da Identidade Organizacional

CategoriasTemasGrandes Temas
Descrição do hospitalImagem:

  • Aspectos estruturais;
  • Aspectos do exercício profissional.
Imagem
Escolha do hospitalCarreira profissionalFactores profissionais
LocalizaçãoFactores pessoais
Aconselhamento do hospital enquanto local de trabalhoCaracterísticas positivas

Características negativas

Identificação
Descrição da relação desenvolvida com o hospitalLigação positiva:

  • Ao serviço;
  • Ao hospital.

Ausência de ligação

Relacionamento
Evolução da vida profissional e o hospital actualOportunidades profissionaisFactores profissionais
Motivos familiaresFactores pessoais
Motivos para a permanência no hospitalLaços afectivosRelacionamento
Apoio organizacional

Acomodação

Factores organizacionais
Motivos para a mudança de hospitalSatisfação profissionalFactores profissionais
Vida pessoalFactores pessoais
Perdas resultantes da saída do hospitalPerdas institucionaisFactores organizacionais
Perdas afectivasRelacionamento
Ganhos resultantes da saída do hospitalGanhos profissionaisFactores profissionais
Ganhos pessoaisFactores pessoais
Contributo individual dado ao hospitalInvestimento pessoal

Cumprimento das normas

Identificação
Contributo do hospital no desenvolvimento individualDesenvolvimento profissional Factores profissionais
Lealdade sentida ao hospitalSatisfação das expectativas

Sentimento de pertença

Ausência de lealdade

Identificação

No que respeita à análise do quadro I, relativo às categorias, temas e grandes temas da Identidade Organizacional, identificaram-se seis grandes temas, nomeadamente, imagem, factores profissionais, factores pessoais, factores organizacionais, relacionamento e identificação.

Quadro II – Categorias / Temas / Grandes temas da Identidade Profissional

CategoriasTemasGrandes Temas
Escolha da profissão de enfermagemSaída profissionalAcessibilidade de emprego
Profissão aliciante Identificação
Significado da profissão de enfermagemCuidar numa perspectiva holística
Riqueza de afectos

Autonomia

Factores emocionais
Motivos para a mudança de profissãoProfissão para a vida

Incapacidade

Identificação
Aconselhar ou não a profissãoCaracterísticas pessoaisIdentificação
Falta de enfermeirosAcessibilidade de emprego
Reconhecimento social Imagem
A classe profissional dos enfermeirosUnião para o exterior
Competição no interior da profissãoFactores emocionais
Aspectos mais gratificantes nas funções desempenhadasRelação de ajudaIdentificação
Reconhecimento do doente Factores emocionais
Aspectos menos gratificantes nas funções desempenhadasIncompreensão

Desgaste psicológico

Carga de trabalhoOrganização do trabalho
Factores que contribuem positivamente para o desempenho profissionalOrganização dos processos
Relações interpessoais

Factores emocionais

Reconhecimento do trabalho desenvolvidoValorização do trabalho do enfermeiro
Importância atribuída ao reconhecimento do trabalhoContributo para a motivação
Opinião da sociedade em relação aos enfermeirosImagem geral redutora

Imagem positiva dos doentes

Contributo negativo da comunicação social

Imagem

A realidade da profissão e a opinião da sociedadeProfissão fundamental na saúde

Escassez de informação sobre a profissão

Enfermeiros como actores fundamentais na mudança de imagem

No que respeita à  análise do quadro II, relativo às categorias, temas e grandes temas da Identidade Profissional, identificaram-se cinco grandes temas, nomeadamente, acessibilidade de emprego, identificação, factores emocionais, imagem e organização do trabalho.

Quadro III – Categorias / Temas / Grandes temas das diferentes identidades profissionais no hospital

CategoriasTemasGrandes Temas
Papel do enfermeiro na equipa de saúdeEquidade de papéisAfirmação dos enfermeiros como profissão
Enfermeiro como figura central da equipa Poderes profissionais diferentes
Relação entre os enfermeiros e restantes elementos da equipaQualidade nas relações intergrupais
Relações entre os enfermeiros no hospitalSolidariedade profissionalAfirmação dos enfermeiros como profissão
Relacionamento dentro do serviço

Serviço como unidade funcional

Existência de equipa de enfermagem no serviçoCoesão do grupo
Atitudes mais frequentes na equipa de enfermagem do serviçoDisponibilidade do grupo

Chefe como gestor de conflitos

Défice de comunicação dentro da equipa

No que respeita à  análise do quadro III, relativo às categorias, temas e grandes temas das diferentes Identidades no hospital, identificaram-se três grandes temas, nomeadamente, afirmação dos enfermeiros como profissão, poderes profissionais diferentes e serviço como unidade funcional.

Figura – Modelo final de fidelização dos enfermeiros às organizações hospitalares

Este modelo pretende sintetizar a informação obtida a partir da análise dos dados. Nele encontram-se os grandes temas identificados para cada uma das áreas temáticas em estudo. A associação de todos estes factores actua na permanência dos enfermeiros nos hospitais.

4 – Discussão

Optou-se por fazer a apresentação da discussão dos resultados em função das áreas em análise, procurando, desta forma, dar resposta aos objectivos do estudo. Na primeira parte, são analisados os resultados referentes à identidade organizacional, seguem-se os referentes à identidade profissional e, numa terceira parte, será incluída a análise relativa aos restantes resultados.

I Parte – Contributos da identidade organizacional 

Neste estudo a identidade organizacional dos enfermeiros é influenciada pela imagem que os mesmos têm acerca do seu hospital, da identificação que sentem com ele, dos relacionamentos desenvolvidos, de factores específicos do hospital enquanto organização, de factores profissionais e pessoais.

De forma sintética, um hospital pequeno é entendido como familiar e acolhedor, sendo a estrutura física também valorizada, neste caso, pelo lado negativo por estar envelhecida e degradada.

A relação dos indivíduos com o seu hospital é também determinante na forma como o descrevem, sendo, sobretudo, valorizadas as relações afectivas com o serviço onde exercem funções. A antiguidade superior a cinco anos, na instituição, foi identificada, neste estudo, como aquela a partir da qual é possível encontrar uma relação dos indivíduos com o hospital como um todo, o que necessita de confirmações posteriores em outros estudos. Em todo o caso, o modo como os indivíduos definem e se identificam com a sua organização influencia a sua permanência na mesma, o que vai de encontro ao que dizem Asforth e Mael (1989), Dutton et al. (1994) e Foreman e Whetten (2002).

O desenvolvimento profissional que é possível fazer dentro do hospital, decorrente da variedade de especialidades que este possui, e a possibilidade de realizar formação, são aspectos bastante valorizados neste estudo, no que se refere à identidade do hospital. A mudança de hospital é equacionada sempre ou por motivos pessoais ou em prol do desenvolvimento profissional.

II Parte – Contributos da identidade profissional 

Os contributos da identidade profissional na permanência dos enfermeiros nas organizações hospitalares estão presentes na valorização que os indivíduos fazem à vertente psicossocial da sua profissão. Tal será, provavelmente, o resultado daquilo que lhes é incutido durante a formação e depois consolidado com os pares nos espaços profissionais. Estes resultados vão de encontro aos estudos de Dubar (1997), quando refere que as identidades profissionais vão-se construindo no espaço social, adquirindo particular importância os momentos da formação. Por outro lado a identificação dos indivíduos em grupos ou categorias sociais não está dissociada da identidade profissional (Tajfel 1983). Esta, por sua vez, vai sendo reforçada no convívio diário com os pares e os outros grupos profissionais (Sansalieu, 1996).

Contrariamente ao que alguns profissionais referiram, nomeadamente os mais antigos na profissão, não se verificaram diferenças no modo como os elementos mais jovens definem a profissão e os aspectos dela que mais valorizam. De salientar ainda que os enfermeiros deste estudo se identificam com a profissão, mesmo quando esta não foi a sua primeira escolha em termos profissionais, e assumem-se como tendo um papel fundamental no sistema de saúde.

III Parte – Contributos de outros factores identificados

No seu conjunto, os resultados deste estudo indicam a existência de vários factores de âmbito organizacional e profissional que se cruzam, influenciando o modo como os enfermeiros se posicionam nos hospitais. A imagem que os enfermeiros têm do seu hospital é influenciada pela identificação que sentem com o mesmo. Esta, por sua vez, está relacionada com a ligação que estes profissionais desenvolvem com a sua instituição. A qual, por sua vez, está associada a factores organizacionais como seja o apoio institucional que sentem ter, factores pessoais, nomeadamente aspectos da vida familiar, ou factores profissionais, como a possibilidade de desenvolvimento profissional. O confronto da identidade da classe profissional dos enfermeiros com as restantes identidades profissionais influencia também o modo como estes profissionais se posicionam no hospital, podendo actuar no sentido de reforçar, ou não, a sua identificação com a organização.

Conclusões

Pode dizer-se deste estudo que a identidade organizacional dos enfermeiros é frágil, na medida em que descrevem o seu hospital fazendo referência, essencialmente, às características negativas do mesmo. Por outro lado, o estudo aponta para alguns aspectos organizacionais relevantes para a fidelização dos enfermeiros aos hospitais, nomeadamente o contributo que estes dão na formação profissional dos mesmos, a possibilidade de escolherem a área em que querem desenvolver a sua actividade profissional e as oportunidades de carreira oferecidas.

São valorizadas também, no estudo, as relações dos enfermeiros, sobretudo as afectivas, com o serviço onde desempenham funções e com o hospital. Clarificar a importância da antiguidade na relação desenvolvida por estes profissionais às suas organizações, sugerida por este estudo, é uma possibilidade para o desenvolvimento de estudos futuros; nomeadamente validar a influência da antiguidade superior a cinco anos na existência de uma ligação à organização como um todo. Igualmente importante será analisar os contributos de outros factores como a motivação ou a satisfação na permanência dos enfermeiros nas organizações hospitalares.

No que respeita à  identidade profissional, o estudo aponta para a importância dos modelos formativos na construção da mesma, na medida em que a profissão é descrita de forma idêntica pela maioria dos entrevistados, tendo por base os princípios teóricos que fundamentam a profissão e supostamente interiorizados enquanto alunos.

De referir ainda que, no estudo, a consolidação da identidade profissional dos enfermeiros é muito baseada no confronto com outras identidades profissionais, sobretudo dos médicos. Estes resultados vão de encontro aos estudos de Sansalieu (1996), relativamente à identificação com os pares e à comparação com outros profissionais no fortalecimento da identidade profissional.

O hospital é uma organização onde convivem diversas profissões, com identidades diferentes. Neste estudo verifica-se que os enfermeiros procuram conquistar e afirmar a sua identidade num território complexo, no qual convergem interesses variados. A definição muito clara das competências de cada grupo profissional nas organizações hospitalares e uma maior valorização do papel dos enfermeiros, contribuindo para o fortalecimento da sua identidade profissional, seriam, talvez, formas de aumentar a fidelização deste grupo profissional a estas organizações.

Do ponto de vista metodológico, este estudo contemplou enfermeiros, maioritariamente com vínculo à função pública. Seria interessante alargar o leque aos enfermeiros com outro tipo de vínculos. Nomeadamente, conhecer as expectativas desses enfermeiros no que respeita à mobilidade e compará-las com as deste estudo.

Em termos práticos, as sugestões deste estudo, no que respeita à fidelização dos enfermeiros às organizações hospitalares, apontam para uma aposta forte na formação profissional e nas oportunidades de desenvolvimento profissional nestas organizações. Promover o empowerment destes profissionais será também uma forma de fortalecer a sua identidade profissional e fidelizá-los. Igualmente importante é a redução de conflitos entre grupos profissionais, uma gestão mais transversal e uma chefia directa com uma liderança capaz de motivar e envolver estes profissionais. A existência de número adequado de enfermeiros nos serviços, a fim de possibilitar a prestação de bons cuidados de enfermagem, é também um aspecto relevante na permanência dos enfermeiros nas organizações hospitalares.

5 – Referências bibliográficas

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