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IV Curso Pós-Graduado sobre Envelhecimento: Geriatria Prática

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IV Curso Pós-Graduado sobre Envelhecimento: Geriatria Prática

No passado mês de Setembro, nos dias 21 e 22, realizou-se no auditório dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC), o IV Curso Pós-Graduado sobre envelhecimento. Curso este organizado pelo Serviço de Medicina I dos HUC, com o patrocínio de diversos laboratórios.

Sérgio Ferreira
Enfermeiro

No passado mês de Setembro, nos dias 21 e 22, realizou-se no auditório dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC), o IV Curso Pós-Graduado sobre envelhecimento. Curso este organizado pelo Serviço de Medicina I dos HUC, com o patrocínio de diversos laboratórios.

Apesar de ser um curso que nos anteriores era quase que exclusivamente virado para médicos, este ano tiveram a preocupação que os temas fossem também do interesse de outros técnicos de saúde. Assim, na assistência encontrava-se um grande número de enfermeiros, fisioterapeutas, assistentes sociais, além da classe médica.

A conferência de abertura, intitulada “Geriatria. Passado, presente e futuro” foi apresentada pela Prof.ª Doutora Helena Saldanha, e serviu de apresentação ao curso que ali se iniciava.

O primeiro painel, denominado “Orientação Diagnostica do Idoso com Perturbações do Equilíbrio e Tremor”, foi moderado pelo Dr. Gomes Ermida, médico reformado do serviço de medicina dos HUC e grande defensor da especialidade de geriatria. O Dr. Rui Pina falou das perturbações do equilíbrio, enquanto o Dr. Grilo Gonçalves se encarregou do tremor.

A conferência seguinte foi apresentada pelo Mestre Raul Martins e comentada pelo Prof. Doutor Teixeira Veríssimo. Esta conferência, a que deram o nome de “Que actividade física aconselhar ao idoso”, pretendeu mostrar a importância da actividade física nos idosos, e que com exercícios bastante simples se pode combater o sedentarismo na terceira idade.

Seguiu-se uma conferência em que o tema central era a diabetes. Apelidada de “O idoso diabético. Regras iguais ou diferentes?”, foi apresentada pelo Dr. Almeida Ruas e comentada pelo Dr. Mário Rui Ferreira. A diabetes foi, nesta conferência, titulada de “epidemia do século XXI”. Foi dito que apenas 31% dos diabéticos estão controlados, o que faz da diabetes uma doença a combater e acima de tudo a prevenir.

Falou-se também que a presença de comorbilidades dificulta o controlo da diabetes. Assim, é importante estabelecer alvos realistas para a Tensão arterial (uma das comorbilidades) e para a diabetes. Tem que se organizar uma monitorização rigorosa, a nível da Hipertensão arterial, da dislipidémia e da diabetes, e promover alterações terapêuticas adequadas, alterações do estilo de vida, combatendo o sedentarismo e promovendo o aumento da actividade física, de acordo com as capacidades funcionais do idoso em questão.

Também foi dito que o tratamento da diabetes deve incidir numa terapêutica precoce e combinada, tendo o Dr. Almeida Ruas afirmado que a “terapêutica precoce e combinada não é uma opção. É uma necessidade.” Foi também apresentado um artigo realizado pela European Association for the study of Diabetic em Agosto, que defende que o tratamento da diabetes se deve iniciar com alterações do estilo de vida, associadas com a metformina, e logo que possível introduzir a insulina. Assim, é importante a educação/ motivação da família, uma alimentação equilibrada, o exercício físico, o equilíbrio metabólico e a terapêutica adequada.

Seguiu-se o simpósio da MSD/ Schering-Plough, em que foi debatido “o poder de inibir a absorção e produção do colesterol”. Simpósio este que foi moderado pelo Prof. Doutor Teixeira Veríssimo e apresentado pelo Prof. José Manuel Silva.

Após o almoço, os trabalhos continuaram com mais um painel denominado “Prevenção Cardiovascular no Idoso”. Painel este moderado pelo Prof. Abílio Serra e Silva, em que participaram o Prof. Manuel Carrageta, o Prof. Mário Espiga de Macedo e o Dr. Pedro Marques da Silva, em que falaram respectivamente no risco cardiovascular global no idoso, na hipertensão arterial (HTA) nos idosos portugueses e no tratamento da HTA nos idosos.

Foi transmitido, como todos já temos conhecimento, que os factores de risco cardiovascular são a HTA, o tabagismo, o colesterol elevado, o sedentarismo, entre outros. Assim, as novas guidelines defendem o combate aos factores de risco (não fumar, exercício físico e alimentação saudável), bem como uma pressão arterial controlada (< 140/90 mm/hg), o colesterol total < 190mg/dl, o colesterol LDL < 115mg/dl e um bom controlo da glicemia nos idosos diabéticos. Foi ainda focado que a prevalência da HTA em Portugal é de 42% e que é maltratada e mal controlada.

Assim, o tratamento da HTA nos idosos deve ser gradual, com terapêutica gradual e deve-se titular doses ou associar terapêutica. Deve-se modificar o estilo de vida e, em relação à terapêutica, usar terapêutica combinada (2 fármacos adjacentes), a partir da combinação: diurético, antagonistas do receptor de angiotensina (ARA) ou inibidor da enzima de conversão da angiotensina (IECA) e um bloqueador dos canais de cálcio.

O último painel do dia teve como tema central “Nutrição do Idoso. Orientações Práticas”. Moderado pelo Prof. Fernando Santos, e com apresentações da Prof.ª Lélita Santos (“Avaliação do estado de nutrição”), da Dr.ª Cláudia Afonso (“Conselhos práticos para a alimentação”) e da Dr.ª Isabel Fonseca (“Alimentação por sonda no domicílio. Indicações e complicações”). Neste painel que a desnutrição é muito frequente nos idosos portugueses, o que leva a um aumento da incapacidade física, a um aumento da morbilidade, a um aumento da mortalidade e a uma diminuição da qualidade de vida. Em relação aos conselhos práticos da alimentação, uma questão se levantou: Suplementação: sim ou não? Foi então dito que quando a selecção alimentar é limitada, deve-se proceder a uma suplementação.

Assim, deve-se respeitar o padrão alimentar a que o idoso está habituado, aumentar a qualidade olfactiva e gustativa (são sensações que diminuem com a idade), quando ocorre uma diminuição do apetite deve-se apostar na sopa “enriquecendo” esta e por último banir as dietas restritivas.

Por fim falou-se da alimentação entérica, que tem como principais objectivos: evitar a redução ponderal, recuperar o peso, recuperar o estado nutricional e hidratação do doente. Deve ser usada quando há alterações da deglutição, obstrução do tubo digestivo alto, aumento das necessidades nutricionais, falência parcial do intestino e perturbações psiquiátricas como por exemplo a anorexia. Em relação à presença de uma sonda para alimentação, os principais medos dos familiares cuidadores são a deslocação da sonda; a obstrução da sonda que ocorre geralmente por administração de fármacos mal triturados, à administração de soluções espessas e não lavar a sonda regularmente com água.

Outro dos medos diz respeito à pneumonia de aspiração que pode ser provocada por estase gástrica, sonda mal posicionada e cabeceira da cama não elevada durante e após as refeições. Assim, antes de iniciar uma refeição deve-se elevar a cabeceira da cama 30 ou 40º, confirmar o posicionamento da sonda, verificar a estase gástrica, e no fim da refeição lavar a sonda com água.

O segundo e último dia de trabalhos começou com um painel intitulado “A patologia neuro-psiquiátrica na prática clínica”, moderado pelo Prof. António Leuschner. O Prof. Marcelo Feio abriu o painel falando das “orientações para o diagnóstico precoce da demência”. Seguiu-se o Dr. Luís Ferreira a falar da “Orientação do idoso com depressão”.

A depressão na população idosa é secundária a outras doenças, como por exemplo o cancro, a doença de parkinson, a demência, a diabetes, entre outros, ou ao uso de medicamentos, como anti-hipertensivos, corticosteróides, ou outros. A juntar a tudo isso temos aquilo que se denomina por perdas: o fim da vida profissional, as baixas reformas, morte dos amigos, dos familiares e/ ou do cônjuge. No tratamento, além do uso de anti-depressivos é importante o estímulo social.

Este painel terminou com a Enf.ª Graça Melo a falar da doença de alzheimer (“Doença de Alzheimer. Orientações práticas para cuidadores”). O cuidador é o principal parceiro de cuidados; assim, tem que se capacitar o cuidador a tomar decisões informadas e estabelecer um elo entre cuidador e serviços. É importante que a pessoa que cuida tome consciência de que é um cuidador, compreenda a demência, saiba viver com a pessoa com demência. Tem que saber lidar com perturbações da comunicação, da funcionalidade e do comportamento. Tem que tomar consciência que se torna fundamental o olhar, a palavra e o toque. O cuidador tem que ser capaz de promover a independência e controlo das AVD’s; tem que ser capaz de identificar os antecedentes possíveis, bem como as razões e consequências que possam levar a alterações do humor e a ansiedade; tem que ser capaz de atender as necessidades fisiológicas; promover uma rotina no quotidiano da pessoa demente; saber ocupar o idoso com actividades significativas e simplificar o ambiente se este for demasiado confuso. No entanto, não nos podemos esquecer que tem que ser feito um acompanhamento ao próprio cuidador, a nível da educação e treino, suporte emocional e suporte social por parte dos serviços de saúde.

Seguiu-se o simpósio GlaxoSmithKline sobre a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) moderado pelo Prof. Carlos Robalo Cordeiro, em que participou a Prof.ª Cristina Bárbara e o Prof. Carlos Robalo Cordeiro. A DPOC é uma doença crónica que diminui a capacidade respiratória. Quando usamos o termo DPOC de uma forma genérica, referimo-nos a todas as doenças obstrutivas pulmonares mais comuns como a bronquite crónica, o enfisema pulmonar, a asma brônquica e bronquiectasias. No entanto, muitas vezes e erradamente, ao falarmos de DPOC apenas nos referimos à bronquite crónica e ao enfisema pulmonar. Neste simpósio foi mais uma vez transmitida a ideia que o melhor tratamento é a prevenção, e que assim, por exemplo, devemos evitar que um não fumador se torne fumador, mas devemos lutar para que um fumador se torne não fumador.

Antes de almoço ainda houve tempo para mais um simpósio. Simpósio MSD intitulado “Osteoporose – Garantir a eficácia terapêutica”, moderado pelo Prof. Teixeira Veríssimo e com os prelectores Prof. José António Pereira da Silva e a Dr.ª Anabela Cardoso.

O primeiro painel da tarde teve como tema “Orientação Prática de Problemas Frequentes no Idoso” e foi moderado pelo Dr. Carlos Dias. O Prof. Arnaldo Figueiredo falou sobre a incontinência urinária na mulher, e em como é muitas vezes descurada pelos clínicos. A incontinência tem um grande impacto na qualidade de vida, é muito comum, não é uma característica normal que surge com o envelhecimento e é curável. O Dr. Eduardo Pereira encarregou-se da obstipação crónica.

A obstipação, tal como a incontinência urinária aqui já referida, diminui a qualidade de vida. Muitos médicos consideram a obstipação um sintoma “minor”. 10% da população é obstipada. 20 a 30% são idosos, cerca de 50% são idosos institucionalizados e cerca de 60% são idosos institucionalizados. A obstipação é mais frequente no sexo feminino e na raça negra. Os factores predisponentes são a baixa ingestão de fibras e líquidos, desnutrição e deficit alimentar, sedentarismo, falta de privacidade nas instituições, inibição frequente da urgência na dejecção e medicação como por exemplo os Antiácidos, os diuréticos, os suplementos de ferro e cálcio, os AINE’s, os opióides, bem como o uso excessivo de laxantes que poderá ter um efeito contrário ao desejado e causar obstipação (ter em conta que muitos idosos auto medicam-se com laxantes). A obstipação crónica pode ter diversas complicações como a impactação fecal (obstipação intestinal, retenção urinária, “falsas diarreias”, perfuração intestinal), patologia anorectal e diverticulose.

O Dr. Pedro Ribeiro apresentou a sua comunicação sobre as insónias. 30 a 50% dos idos têm perturbação do sono e é mais frequente no sexo feminino. As benzodiazepinas, os sedativos e os hipnóticos apenas aliviam os sintomas, não sendo a cura para as insónias.

Este curso chegou ao fim com um painel onde se debateu o futuro da geriatria. Assim, o Prof. José Manuel Silva moderou o debate intitulado “Geriatria. Especialidade, Sub-especialidade, Competência ou nada?”, onde participaram o Prof. Gorjão Claro, o Dr. João Sá (Presidente cessante do Colégio da Especialidade de Medicina Interna) e o Dr. Silva Henriques (Presidente do Colégio da Especialidade de Clínica Geral). Aqui se discutiu aquilo a que eu chamo o «sexo dos anjos», pois debate-se e debate-se e não se chega a conclusão nenhuma. Os que defendem que a geriatria nada deve ser dizem que “somos o que somos até agora, não precisamos de ser geriatras. Somos internistas”. Defendem que sempre trataram idosos e que não necessitam de dividir a medicina interna em sub-áreas, pois dizem que se aparecer a geriatria vai haver uma quebra no número de médicos, principalmente na Medicina Interna e na Medicina Familiar. Defendem ainda que a clínica é igual, e que o importante é fazer uma boa terapêutica qualquer que seja a idade. Os defensores do não à geriatria acabaram quase em tom de apelo a dizer “não fraccionar a Medicina Interna”.

Aqueles que defendem a existência de uma especialidade geriátrica, acreditam que o idoso tem que ser tratado de forma diferente de um outro adulto, afirmando mesmo que “tratar idosos é diferente de tratar adultos”. Dizem que o idoso apresenta polipatologias, é polimedicado, tem diminuições funcionais a nível de diversos órgãos, e que por isso deveria ser tratado por especialistas geriátricos e vão ainda mais longe dizendo que o surgimento da geriatria não vai levar à divisão da Medicina Interna e da Medicina Familiar.

Assim decorreu o IV Curso Pós-Graduado sobre Envelhecimento – Geriatria Prática, que serviu mais uma vez para debater o futuro da geriatria, que tão maltratada tem sido no nosso país. Serviu ainda para discutir várias temáticas associadas aos idosos. Cabe a cada um de nós interiorizar aquilo que ouvimos, colocarmos em prática e transmitir aos outros aquilo que aprendemos, de forma a melhorar a nossa prestação de cuidados. Espero sinceramente que este resumo daquilo que foi transmitido neste curso em Coimbra seja útil e vos ajude no vosso dia a dia.