O recurso à restrição física /contenção (física e ou mecânica) deve ser só efectuada em situações de excepção, quando o utente se torna perigoso para si próprio ou para com terceiros e, principalmente, quando necessita de cumprir terapêutica e/ou efectuar exames complementares de diagnóstico e no caso de risco de queda.
Sinais Vitais nº 75
A Revista Sinais Vitais vai, a partir deste número, utilizar este espaço para incentivar o debate ou a reflexão sobre temas de importância para a enfermagem. Chamámos-lhe FORUM TEMÁTICO e é o que pretendemos que seja. Em cada número convidaremos enfermeiros para através da sua escrita reflectirem sobre um qualquer aspecto dos cuidados de saúde que se entenda dever ser debatido entre os enfermeiros.
No passado mês de Maio a DGS através da normativa nº 08/DSPSM/DSPCS regulamenta a aplicação de contenções físicas nos doentes agitados, convidámos 4 enfermeiros com experiência e opinião sobre o assunto e é o resultado da reflexão de cada um que espelhamos nesta rubrica que aqui iniciamos.
A circular normativa nº 08/DSPSM/DSPCS de 25 de Maio de 2007 pode ser analisada segundo vários planos, entre eles, a sua necessidade, a sua utilidade, o seu conteúdo e a forma como “aparece”.
1. Haveria necessidade duma circular normativa sobre medidas preventivas de comportamentos agressivos / violentos de doentes – contenção física?
Julgamos que sim. A prática de contenção física nas nossas instituições de saúde é relativamente comum. Pensamos que na maioria dos casos claramente justificada. Mas, admitindo que haveria uma minoria em que assim não fosse, uma circular pode ajudar a consciencializar todos os técnicos para a importância, sensibilidade e perigosidade deste acto. De facto, Mohr, Petti e Mohr (2003) num artigo de meta-análise relatam incidentes ocorridos com doentes em contenção: morte por asfixia, morte por aspiração, fractura ao nível do tórax, aumento súbito da produção de catecolaminas com repercussões ao nível cardíaco, potencialização dos efeitos secundários da medicação com psicotrópicos, embolias pulmonares e graves efeitos psicológicos. Aqui julgamos que a circular poderia ter sido mais pedagógica na sua introdução e posteriormente na fundamentação.
2. Quanto à utilidade, a existência duma circular pode ajudar a uniformizar critérios e técnicas de contenção, incentivar a discussão em torno dos direitos do doente, da responsabilidade dos técnicos de saúde, mas sobretudo das formas de prevenção, a identificação de factor (es) precipitante (s) interno (s) e/ou externo (s), os meios (in) existentes, as características do espaço, o acompanhamento necessário para intervir preventivamente. Estudos recentes mostram a eficácia da dinamização desta discussão na redução de estratégias de isolamento / contenção (Pollard, Yanasak, Rogers & Tapp, 2007). Também por isso julgamos que esta circular é bem-vinda.
Mas estarão os serviços / gestores disponíveis para essa discussão e adaptação para que a “evolução positiva das últimas décadas” se mantenha e se reforce? A afirmação de que “é fundamental que as instituições estejam dotadas de pessoal suficiente e com competências técnicas específicas, de forma a garantir a qualidade dos cuidados, nomeadamente enfermeiros, para acompanhar com segurança os doentes …” parece-nos importante. Um ratio correcto enfermeiro / doente diminuiria a probabilidade de episódios de agressividade e violência pelo doente e as agressões a “outros” incluindo os técnicos de saúde!
3. Relativamente ao seu conteúdo, gostaríamos de ter visto mais ênfase na prevenção das medidas de contenção. Destacar as técnicas comunicacionais parece ser relevante para os enfermeiros, reforçando a importância desta temática na formação graduada, pós-graduada e ao longo da vida. Pensamos que os enfermeiros especialistas em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica poderão ter um papel relevante como formadores para uma melhor identificação do doente, melhor gestão do stresse e ansiedade, treino da equipa na intervenção em crise, desenvolvimento duma equipa de intervenção em crise e discussão assídua e aprofundada da situação dos doentes em contenção ou isolamento. Noutros contextos medidas similares acompanhadas por um sistema de incentivos para a equipa de saúde permitiram uma diminuição acentuada nas medidas de contenção, sem o aumento de outros incidentes (McCue, Urcuyo, Lilu, Tobias & Chambers, 2004).
4. Desconhecendo a forma como esta circular foi discutida, como foram envolvidos os representantes dos cidadãos, os técnicos, as suas organizações representativas quer no momento da elaboração quer na sua redacção final e aprovação, parece-nos claro que a saída da circular sem o compromisso de maior envolvimento na formação, treino e desenvolvimento de estudos em torno das condições de internamento, não produzirá os efeitos desejáveis: melhor segurança e diminuição do número de contenções físicas e redução da duração das mesmas. A saída de legislação somente não será suficiente, como o confirmou um estudo recente na Finlândia, onde 15 anos após a saída de legislação nesta matéria o risco de se recorrer ao isolamento ou à contenção física não diminuiu (Keski-Valkama, Sailas, Eronen, Koivisto, Lonnqvist & Kaltiala Heino, 2007). Por outro lado, a discussão de normas mais pormenorizadas, com inclusão de medidas dissuasoras, metas e objectivos poderia ser sinónimo de maior participação / problematização / discussão desta temática. A Associação Americana de Enfermeiros de Psiquiatria aprovou recentemente (26 de Maio de 2007) a revisão das normas publicadas em 2000. Envolveu diversos fóruns de discussão, com inúmeros enfermeiros, com um painel de experts, tendo posteriormente o relatório final sido aprovado pelos órgãos sociais da associação. Mobilizou, consciencializou, formou. Certamente os doentes colherão os frutos. E por cá, como foi feito?
Embora não havendo evidências científicas da eficácia terapêutica desta intervenção, verificamos que a intervenção permite interromper e controlar o comportamento violento do indivíduo (Walsh & Randell, 1995). Por outro lado, alguma imprevisibilidade pode acompanhar este tipo de comportamentos agressivos / violentos.
Tornar a contenção física menos comum, menos danosa para o doente, família e técnicos de saúde, de forma a “que a pessoa doente ultrapasse com segurança a situação de crise” será certamente um objectivo de todos. Aguardemos os dados do registo nacional na Direcção Geral de Saúde.
José Carlos Santos
Bibliografia
Keski-Valkama, A., Sailas, E.; Eronen, M.; Koivisto, A.; Lonnqvist, J. & Kaltiala-Heino, R. (2007). A 15-year national follow-up: legislation is not enough to reduce the use of seclusion and restraint. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 42(9): 747-752.
McCue, R.; Urcuyo, L.; Lilu, Y.; Tobias, T. & Chambers, M. (2004) Reducing restraint use in a public psychiatric inpatient service. The Journal of Behaviour health Services and research, 31(2): 217-224.
Mohr, W.; Petti, T. & Mohr, B. (2003). Adverse effects associated with physical restraint. Canadian Journal of Psychiatry, 48(5):330-337.
Pollard, R.; Yanasak, E.; Rogers, S. & Tapp, A. (2007). Organizational and unit factors contributing to reduction in the use of seclusion and restraint procedures on an acute psychiatric inpatient unit. The Psychiatric Quartely, 78(1): 73-81.
Walsh, E. & Randell, B. (1995). Seclusion and restraint: what we need to know. Journalof Child and Adolescent PsychiatricNursing, 8(1): 28-40.
A área da saúde é reconhecida, a nível nacional e internacional, como bastante vulnerável no domínio da violência/agressividade no local de trabalho, principalmente nas áreas onde os profissionais estão em contacto directo com o público e com casos de elevada ansiedade e stress.
Vários estudos referem que os enfermeiros são a classe profissional que mais se encontra exposta a actos de violência/agressividade e ainda que um serviço de urgência é dos locais onde se verificam maior número destes episódios. Actualmente, as pessoas vivem num frenesim, um corre – corre, num contra-relógio constante, implicando que todas as suas necessidades sejam urgentes e de imediata resolução.
Quando se dirigem a um serviço de urgência, como doentes ou como familiares/acompanhantes estão sujeitos a altos níveis de ansiedade, pedem e exigem eficiência e eficácia no atendimento e, fundamentalmente, rapidez, o que em determinadas situações se pode tornar contraproducente. Por outro lado, a equipe de saúde está sujeita a pressões, tanto profissionais como pessoais, além do grande número de doentes a cuidar, que os obriga a rápidas e eficazes respostas. Estes dois tipos de atitudes e comportamentos quando se encontram podem ser geradores de conflitos e agressividade.
A Organização Mundial de Saúde define agressividade como “todo o uso intencional de força física ou de poder, real ou ameaça, contra a própria pessoa, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que pode resultar em, ou tem alta probabilidade de resultar em morte, lesão danos psicológicos, alteração de desenvolvimento ou de privação.” Este é um tema que preocupa bastante todos os profissionais que no seu quotidiano contactam com doentes, em estado psicótico agressivo, tendo sido preocupação recente da Direcção Geral de Saúde, que em Maio de 2007 publicou a Circular Normativa nº 08/DSPSM/DSPCS sobre “Medidas preventivas de comportamentos agressivos/violentos de doentes – Contenção Física” a aplicar em hospitais do Serviço Nacional de Saúde e ARS, serviços locais e regionais de Saúde Mental, Instituto da Droga e Toxicodependência e unidades de cuidados pertencentes à Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados.
Esta circular visa proteger o doente em estado psicótico de agressividade que se dirige a estes serviços, os profissionais que aí trabalham e também os outros doentes. “…torna-se necessário adoptar medidas de contenção, tendo em vista a sua protecção e a do meio envolvente…” .
A agressividade num doente pode surgir de uma forma inesperada. Logo que ela surja e, sempre que possível, deve ser tentada a realização de uma abordagem verbal como forma prioritária de contenção. Quando esta abordagem não for eficaz poder-se-á recorrer à contenção física, sempre com o objectivo de evitar danos à integridade física do doente, da equipe multidisciplinar, de outros doentes, bem como de danos materiais e patrimoniais da instituição.
A contenção física, quando não evitável, deve ser feita de forma adequada, sendo necessária a colaboração de cinco profissionais (quatro para imobilizar os membros e um para proceder à sua contenção), que coordenadamente, e o mais calmamente possível, procederão à imobilização do doente. Toda esta actuação deve ser realizada em local recatado, respeitando a privacidade do doente a imobilizar e protegendo também, desta forma, os outros doentes do contacto com a agressividade da situação. “Quando a situação clínica do doente é impeditiva… da administração de fármacos, poder-se-á recorrer à contenção física” O enfermeiro perante uma situação de agressividade inesperada, que o poderá ser considerada quase na sua totalidade, deverá actuar já que está a exercer o seu mandato profissional sobre a égide do Regulamento do Exercício Profissional do Enfermeiro e do respectivo Código Deontológico. A decisão da imobilização não é tomada de ânimo leve, é uma decisão reflectida, tendo em consideração toda a avaliação da situação clínica do doente, respeitando a sua integridade física, a sua privacidade e a sua dignidade como pessoa.
No ponto 9 desta Circular Normativa podem encontrar-se dezoito itens referentes à vigilância e avaliação contínuas do doente, estando sempre inerentes a esta tomada de decisão os princípios éticos da profissão. A garantia da privacidade, a temperatura adequada e a conveniente ventilação do local onde é feita a contenção física; a contínua vigilância; a inexistência no local de objectos perigosos que possam por em causa a integridade física do doente; faixas de contenção devidamente apropriadas para a situação; camas com grades laterais como forma de protecção, apoio e segurança; enfaixamento dos membros superiores, inferiores e tórax; enfaixamento adequado prevenindo-se as lesões resultantes da fricção; vigilância dos sinais de alteração da circulação e perfusão dos tecidos, resultantes da compressão do enfaixamento, em intervalos regulares nunca superiores a 30 minutos, são normas obrigatórias a seguir durante a contenção física como forma de respeito pela integridade, a privacidade e a dignidade do doente como pessoa necessitada dos cuidados de enfermagem.
Em todos estes itens estão necessariamente implícitas e inerentes as boas práticas dos profissionais. Esta contenção física deve ser limitada no tempo, privilegiando a contenção farmacológica ou outra, devendo para isso estar atenta toda a equipe de saúde, principalmente os enfermeiros por serem os mais presentes prestadores de cuidados. Todo este procedimento de contenção física terá obrigatoriamente de ficar registado, em todas as suas particularidades, no processo clínico do doente. Numa visão global, observando como se actuava antes e após Maio de 2007, ou seja, antes e depois da publicação da Circular Normativa, poder-se-á constatar que as boas práticas dos enfermeiros mantêm-se existindo agora um documento normativo que rege e legitima toda a actuação neste domínio.
Sendo esta uma temática em estudo já antiga, a publicação da circular normativa, vem reforçar as reflexões, contudo já se podem discernir algumas sugestões com o intuito de prevenir ou minimizar os actos de agressividade e a necessária contenção física:
Dotar as instituições de recursos materiais e adequar estruturas físicas que permitam actuar conforme as orientações da Direcção Geral de Saúde;
Diminuir tempos de espera nos serviços de urgência;
Fornecer maior informação aos doentes familiares sobre os procedimentos a realizar e tempos de espera nos serviços de urgência;
Melhorar segurança para doentes em estados psicóticos de agressividade;
Implementação de momentos de reflexão, entre os profissionais de saúde, sobre esta temática,
Aumento da formação e informação dos profissionais de saúde.
A contenção física deverá ser o último dos recursos na abordagem do doente em estado agressivo, privilegiando a contenção verbal e farmacológica. Perante esta situação, a imobilização física deve ser fruto de reflexão da equipe de saúde, tendo sempre em conta que os eventuais efeitos contraditórios dessa contenção para o doente serão sempre muito inferiores às eventuais lesões causadas a si próprio, a terceiros ou ao meio envolvente provenientes do seu estado de agitação e agressividade.
As boas práticas devem estar presentes de modo a respeitar a integridade física do doente e também todos os seus direitos como pessoa humana.
Rita Fonseca
http://www.dgs.pt/upload/membro.id/ficheiros/i008801.pdf 22/10/2007, pág. 1
http://www.dgs.pt/upload/membro.id/ficheiros/i008801.pdf 22/10/2007, pág. 2
No passado dia 25 de Maio a Direcção-Geral da Saúde produziu uma Circular Normativa que tem como objectivo emanar normas relativamente a “medidas preventivas de comportamentos agressivos/violentos de doentes – contenção física”, para além de vários aspectos relativos ao assunto mencionado, faz várias referências aos enfermeiros, clarificando que os enfermeiros têm a competência necessária para dar inicio a medidas de contenção em situação de urgência, esta não é uma novidade para todos nós, no entanto sabemos que há quem se depare com dificuldades na tomada de decisão para adoptar medidas de contenção. Dificuldades que não são de ordem ética, dado que todos temos presente, por dever, a preservação do valor intrínseco e dignidade de cada pessoa, a promoção do maior bem, os direitos, deveres e objectivos de todos os participantes no processo de cuidar. Esta circular esclarece, aos que eventualmente ainda tinham dúvidas que quando está em risco a integridade física do doente ou de terceiros, o enfermeiro deve adoptar as medidas necessária para minimizar esse risco; esta responsabilidade era já assumida por todos nós há muitos anos e confirmada em forma de Dec.-Lei desde 1998 (Regulamento do Exercício da Profissão dos Enfermeiros e Código Deontológico do Enfermeiro). Enfatiza ainda a importância da avaliação das medidas de contenção ser efectuada pela equipa terapêutica, esta é já uma prática corrente nas equipas de saúde, embora nem sempre assumida formalmente. Analisando mais atentamente o documento, verificamos que logo na introdução se faz menção à necessidade de as instituições estarem dotadas de pessoal suficiente, com competências técnicas específicas, nomeadamente enfermeiros, para acompanhar os doentes, curioso!!! Perguntamo-nos se esta Direcção-Geral não faz parte do mesmo Ministério da Saúde que não está a renovar contratos a enfermeiros, promove a redução de enfermeiros nos serviços não atendendo às horas de cuidados necessárias para a prestação de cuidados, permite que haja enfermeiros no desemprego quando há unidades de saúde e populações que necessitam destes profissionais.
Quando faz referência a enfermeiros com competências específicas para lidar com episódios de agressividade, são certamente Enfermeiros Especialistas em Saúde Mental e Psiquiátrica, sabendo que houve um interregno de vários anos na formação de enfermeiros especialistas e que não são visíveis os esforços para recrutar estes profissionais, não estaremos na presença de mais uma declaração de boas intenções, uma vez que verificamos a sobreposição das razões económicas, ou antes economicista sobre as de ordem ás técnica. A circular apresenta um conjunto de normas, explicita o que se entende por contenção física, em que circunstâncias se deve adoptar este procedimento e o recurso a isolamento, regras a seguir na contenção física, alerta para a limitação no tempo destas medidas e necessidade de avaliação frequente pela equipa terapêutica, necessidade de consentimento informado (quando possível), bem como a importância de ter presente a Lei de Saúde Mental nos internamentos compulsivos, cria o registo nacional de episódios de contenção física. Este conjunto de normas não nos suscitam grandes questões de ordem ética, técnica ou legais, entendemos como útil a criação de um registo que nos permita conhecer a dimensão do problema a nível nacional, no entanto surgem-nos dúvidas de ordem operacional. Não basta emanar normas e criar registos para normalizar procedimentos, é verdade que o arsenal terapêutico tem vindo a ser cada vez mais eficaz no controlo das situações de agressividade e agitação, os meios técnicos permitem diagnósticos mais rápidos, os meios para contenção e isolamento disponíveis permitem evitar danos ao doente, os enfermeiros acompanham a evolução cientifica, no entanto é necessário que exista vontade efectiva, dotando os serviços com o número de enfermeiros necessários e preparação adequada, para que a circular normativa não seja letra morta.
As duas últimas linhas do documento fazem apelo à inscrição do processo de contenção física nas prioridades de formação dos profissionais de saúde, os enfermeiros têm demonstrado ao longo dos anos grande capacidade de adaptação desenvolvendo os seus percursos formativos de acordo com os desafios que se lhe apresentam, pelo que nas suas prioridades de formação inscreverão também outras estratégias que devem estar a montante deste procedimento limite.
Estamos certos que a DGS vai ser coerente na relação discurso/prática. Cá estaremos para aplaudir, se for caso disso.
José Carlos Januário
INTRODUÇÃO
Os hospitais gerais, sendo instituições que prestam cuidados de saúde, onde acontecem com alguma frequência situações de comportamentos agressivos/ violentos, por parte de alguns utentes, nomeadamente, nos serviços de medicina, cirurgia, ortopedia, urgência entre outros, exigem da parte dos enfermeiros cuidados especiais.
Atendendo que estes comportamentos podem provocar danos físicos quer para o próprio mas também para terceiros, torna se necessário adoptar medidas de contenção, tendo em vista a protecção do utente e todo meio envolvente.
Baseado nestes pressupostos e dando resposta a uma exigência do projecto de acreditação em que o Hospital está envolvido, foi elaborado um procedimento no sentido de orientar os enfermeiros perante situações de ter que imobilizar os utentes.
Traçamos alguns objectivos: Normalizar atitudes e comportamentos dos colaboradores do Hospital perante a necessidade de imobilizar o utente; Uniformizar critérios de actuação face à imobilização do utente; Minimizar riscos para o utente.
DEFINIÇÕES:
Contenção Física – caracteriza-se pelo uso de força corporal no sentido de limitar a liberdade de movimentos de uma pessoa.
Contenção Mecânica – caracteriza-se pela utilização de um dispositivo físico (equipamento – amarras, lençóis, cintos e etc) para restringir o movimento de uma pessoa ou um movimento ou função normal de seu corpo.
Imobilização – Acto ou efeito de se tornar imóvel.
CONSIDERAÇÕES GERAIS
O recurso à restrição física /contenção (física e ou mecânica) deve ser só efectuada em situações de excepção, quando o utente se torna perigoso para si próprio ou para com terceiros e, principalmente, quando necessita de cumprir terapêutica e/ou efectuar exames complementares de diagnóstico e no caso de risco de queda.
Nunca a contenção física/mecânica deverá ser utilizada como castigo, punição, como resposta a desobediência, demonstração de poder e/ou conveniência dos funcionários.
Antes da equipa técnica decidir a restrição física ou o isolamento do utente, deve ter utilizado outras alternativas, nomeadamente, a intervenção verbal. O uso destas medidas de segurança implica que o utente seja considerado como incapaz de tomar livremente as suas decisões quanto aos tratamentos ao qual é submetido, portanto, encontra-se numa situação de restrição de liberdade temporária, em que outros é que decidem o que é melhor para ele.
Na tomada de decisão destas medidas devem ser envolvidas, sempre que possível, as pessoas significativas dos utentes a quem deverão ser dadas explicações sobre os procedimentos e a necessidade de intervenção.
Motivos de imobilização Desordem Cognitiva – Imobilizações usadas por alterações da actividademental associada ao pensamento, aprendizagem ou memória (utente que retiraconstantemente o soro ou a sonda; casos de Demência, TCE com agitação motora,AVC, pós operatório).
Risco de Queda – Imobilizações usadas para proteger ou prevenir quedas (utente obeso com risco de queda, insuficiência respiratória com agitação, criança irrequieta e outras).
Comportamento Disruptivo – Imobilizações usadas resultante de comportamentos inapropriados que possa colocar o utente ou outros em risco de lesões (utente com síndrome de abstinência, utente violento).
Para Facilitar o Tratamento – Imobilizações usadas em contexto de tratamento médico, é exemplo, utentes com necessidades de ventilação artificial, utentes com lesão craniana, etc).
DESENVOLVIMENTO DO PROCEDIMENTO
1. Aspectos da comunicação
(regras que se aplicam na entrevista inicial e em todas as situações em que contactamos com o utente agitado)
Apresentar uma aparência calma;
Falar baixo e de forma não provocatória;
Evitar as críticas ou emitir juízos de valor;
Falar de forma simples, concreta e directa;
Demonstrar respeito pelo utente;
Evitar olhar para o utente de forma provatória;
Demonstrar que temos a situação controlada, evitando uma postura autoritária;
Facilitar que o utente exprima o que sente;
Ouvir o utente;
Não prometer nada ao utente se não formos capazes de cumprir;
Colocar um espaço entre e o profissional de saúde e o utente.
2. Cuidados a ter em conta aquando da contenção
Quando estamos perante um utente que necessita de ser imobilizado, o enfermeiro responsável no serviço assume esta decisão (a imobilização pode ser assegurada por enfermeiros, auxiliares de acção médica, seguranças, médicos, ou outros considerados necessários).
A um primeiro sinal de auxílio todos os profissionais e/ou auxiliar acção médica requisitados, devem comparecer junto do utente. Esta demonstração de força poderá ser suficiente para que o utente colabore espontaneamente e sem necessidade de o conter. Caso este tipo de abordagem não resulte, como último recurso, deve-se recorrer à contenção física.
Cuidados aquando da contenção:
Evitar danos físicos no utente;
Evitar a exaustão;
Os restantes utentes não fiquem perturbados com o incidente;
Os outros utentes não sejam agredidos;
Os profissionais não fiquem magoados;
O utente se acalme rapidamente após o incidente;
Retirar todos os objectos que possam ser usados na agressão;
Aconselhável um quarto individual, mas os vidros e os materiais sensíveis devem ser retirados;
Não permitir que o utente se possa barricar no interior do quarto;
Quando há necessidade de recorrer à contenção física fazê-lo sempre em grupo;
Segurar o utente pelas principais articulações (ombros, quadris em vez de cotovelos);
Utilizar só a força necessária, geralmente quando o grupo de pessoas é elevado o utente deixa de “lutar”;
Evitar promessas irrealistas que levam à perda de confiança;
Evitar ameaças e não entrar em conflitos;
Sempre que se recorre à força o utente pode magoar-se, nesta situação é conveniente haver testemunhas para salvaguardar possíveis queixas e posteriores averiguações;
Deve ser preenchida a Notificação de Risco.
2.1 Contenção física
Caso não haja cooperação por parte do utente, a um segundo sinal, devemos recorrer à contenção física.
Cada um dos elementos presentes, deve imobilizar e conter os membros do utente, fixando as articulações adequadamente. O Enfermeiro Responsável deve apoiar a cabeça, é ele que transmite as informações para o utente, realçando sempre que esta técnica está a ser usada para sua segurança e não como castigo. É fundamental que os elementos envolvidos hajam com firmeza, segurança e sem medo, durante a contenção física.
2.2 Contenção mecânica
Após a contenção física ter sido eficaz, o utente deverá ser encaminhado para o leito ou cadeirão para ser contido mecanicamente.
Aspectos fundamentais:
O local onde o utente irá ficar deve ser calmo e tranquilo;
O material a usar deve ser resistente e adequado para o efeito;
Material de contenção deve estar previamente montado e pronto a usar;
O elemento que coordena deve aplicar o material de contenção mecânica, enquanto os restantes elementos fixam os membros;
O utente deverá ser posicionado confortavelmente em decúbito semi-lateral 30º; (recorrer a material para a redução da pressão, para evitar complicações, como a pneumonia aspirativa ou úlceras de pressão, respectivamente)
Aquando da aplicação do material deve-se evitar o estrangulamento de vasos sanguíneos ou nervos. É fundamental, deixar em aberto a possibilidade de acessos Venosos.
Devemos, novamente, fazer um esforço no sentido de explicar ao utente qual o objectivo da contenção mecânica e para que serve, mesmo que possamos pensar que ele não entende.
3. Recomendações a ter em conta perante o utente
Assegurar que o médico assistente tenha conhecimento da contenção mecânica, a fim de tomar as devidas providencias no sentido da prevenção de eventuais complicações;
Vigiar e monitorizar o utente de forma continua (observação directa). Na observação pessoal directa são recomendados intervalos de 15-15 minutos. Deve ser vigiado e monitorizado, quanto a:
Segurança e conforto;
Parâmetros vitais;
Glicemia capilar;
Estado de consciência;
Compromisso neuro-vascular;
Zonas de pressão;
Realizar registos claros e concisos;
Registar a reacção do utente face à imobilização e qual a razão da sua necessidade;
Não retirar as contenções sozinho. Devemos retirar o material de forma gradual, envolvendo o utente nesta decisão e vigiando sempre as suas respostas e comportamentos
NOTAS FINAIS
Queremos realçar, que a partir da aprovação do presente procedimento em Março deste ano, pela direcção de enfermagem e do cumprimento das orientações por parte dos enfermeiros dos serviços da instituição, o número de utentes submetidos a imobilizações, diminuíram e as complicações associadas também.
Salientamos que a circular normativa da Direcção-Geral da Saúde, intitulada: medidas preventivas de comportamentos agressivos/violentos de doentes – contenção física, não foi ainda revogada pela Direcção Regional de Saúde da Região Autónoma dos Açores e por conseguinte aplicada nas instituições.
José Martins
Bibliografia
Busselo, M.T, et el (2006). Cuidados com o doente agitado, violento ou psicótico nas urgências: um protocolo provisório para uma doença em crescimento. An Pediatr (ed.port)
Claudino, Angélica. O paciente violento: intervenção e tratamento. Disponível em: http://www.adroga.casadia.org/tratamento/pacientes_violentos.htm
Nuno, Esperanço (2006). Contenção física e mecânica – Intervenção de emergência. GPTUPdo HMB. Artigo cedido pelo autor.
Santeiro, Kátia (2004). Proteção no controlo de crises comportamentais em pessoas com autismo.Psychiatry on Line Brazil. Disponívelem:http://www.polbr.med.br/arquivo/art1204.htm
Teixeira, Vítor; Morais, Paula (2002). Urgência Psiquiátrica: o utente agressivo/violento. Nursing