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Doença de Alzheimer e Cuidadores Informais

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Revista Sinais Vitais

A demência mais frequente na Europa Ocidental e nos Estados Unidos da América, segundo Friedland et al. (1997), é a doença de Alzheimer.

Sinais Vitais nº 75

Resumo:

Com este artigo pretendo levar os enfermeiros a reflectir sobre a problemática do cuidar de um doente com Alzheimer.

Quando um indivíduo fica doente, a família assume a responsabilidade de cuidar do seu membro. Com a evolução da doença de Alzheimer o familiar afectado torna-se cada vez mais dependente daqueles que o rodeiam. Esta situação acarreta enormes esforços, quer a nível físico, quer a nível psicológico, especialmente por parte do indivíduo que assume o papel de cuidador.

Nas últimas décadas temos registado uma transformação técnica e sócio-económica que conjuntamente com os avanços na medicina e na farmacologia, deram origem a uma melhoria da qualidade de vida das pessoas. Esta melhoria conduziu ao aumento da esperança média de vida, sem precedentes na história da humanidade. Este facto fez com que actualmente muitos países enfrentem as dificuldades que advêm do envelhecimento da população. Com o aumento da idade média de vida as patologias intimamente relacionadas com o envelhecimento assumiram uma importância crescente. Entre elas podemos destacar o grupo das demências, pela sua difusão e pelos problemas sociais que acarretam. A demência é definida por Pruit (1997) como “(…) um síndrome caracterizado por um declínio generalizado e mantido da função intelectual (…). È um distúrbio caracteristicamente progressivo, mensurável em meses ou anos (…). O declínio das capacidades mentais tem uma base alargada envolvendo habitualmente a memória, as capacidades cognitivas (…)”.

A demência mais frequente na Europa Ocidental e nos Estados Unidos da América, segundo Friedland et al. (1997), é a doença de Alzheimer. A nível neuropatológico, esta caracteriza-se pela morte das células em determinadas áreas do cérebro, formando tranças neurofibrilares e placas senis (Gambert, 1998).

A doença afecta 20 milhões de pessoas em todo o mundo, isto segundo Phaneuf (1998). No que concerne ao nosso país, Pinto (2000) refere que, a doença de Alzheimer atinge cerca de 60 mil portugueses.

Geralmente quem assume a tarefa de cuidar destes doentes são os familiares. Durante o desempenho deste papel assistem de forma impotente ao declínio mental e físico de alguém que amam, dado que, o doente passa da situação de ser activo, responsável pelos seus actos, para um ser dependente dos que lhe são mais chegados, sem muitas vezes terem consciência do que se passa ao redor. Tal facto é gerador de muito sofrimento para os familiares, especialmente para o cuidador.

Hay (1996) complementa desta ideia referindo que, quando surge a demência todos os membros da família são afectados, uns mais intensamente do que outros. Esta situação frequentemente “obriga” a alterações do comportamento, do estilo de vida, das relações familiares e na distribuição de papéis. Todas estas mudanças conduzem ao aparecimento de emoções emocionais negativas. De acordo com a mesma autora, inúmeras vezes o familiar presta cuidados durante 24 h por dia, o que causa uma enorme pressão psicológica, surgindo deste modo sentimentos de frustração, raiva, insegurança, incerteza, medo, ansiedade, culpa, ressentimento e muitos outros. Para além das alterações emocionais o cuidador enfrenta ainda alterações a nível financeiro e social. No entanto, não é só o stress a causa destes problemas. Burns et al (1997) mencionam que, estes ficam a dever-se igualmente ao facto de cuidarem de “.. alguém que não é capaz de expressar gratidão, que habitualmente não coopera, é teimoso, persistente, mal humorado e desconfiado.”.

Segundo a linha de pensamento dos mesmos autores, cuidar de um adulto provoca níveis elevados de stress, que consequentemente elevam o risco de aparecimento de vários problemas, que podem ser de ordem física e emocional. Este facto toma contornos mais acentuados quando o cuidador tenta ao mesmo tempo manter o emprego e educar a família.

Os autores supracitados referem que, a consequência mais comum é a depressão, que normalmente surge após um ano. Mas podem ocorrer outros distúrbios como as perturbações do sono, a ansiedade, o isolamento, a fadiga crónica, a hipertensão e a doença cardiovascular. Num estudo realizado por Choen e Eisdorfer citados por Luders e Storani (1986) verificou-se que, 55% dos familiares dos doentes com a doença de Alzheimer, preencheram os critérios de depressão clínica. George e Guryther citados pelos mesmos autores, descrevem um maior índice de stress, assim como, um consumo significativo de psicotrópicos entre estes cuidadores. Estes cuidadores são habitualmente designados como as vítimas ocultas da doença, na perspectiva de Burns et al (1997), isto porque, o familiar passa a viver a vida do doente ignorando as suas próprias necessidades.

Perante este quadro todos nós percebemos a exigência subjacente ao cuidar de um doente com Alzheimer. Facilmente compreendemos que o desempenho do papel de prestador de cuidados informal, é uma situação emocionalmente perturbadora e cansativa. As vivências dos familiares cuidadores durante o processo de cuidar influenciam de forma determinante a prestação dos cuidados ao doente. Deste modo, surge a necessidade do enfermeiro e restantes profissionais de saúde estarem sensibilizados em relação à problemática dos cuidadores de um doente com Alzheimer. Se estivermos despertos para o aparecimento dos sentimentos negativos, as dificuldades e necessidades sentidas e se mostrarmos disponibilidade para escutar estes cuidadores poderemos ajuda-los a lidarem com estas.

Deveremos tentar envolver toda a família na prestação de cuidados, com o intuito de proporcionar ao cuidador períodos de repouso, distracção e a possibilidade de “recuperarem” as suas relações sociais fora do contexto familiar, que se foram perdendo. Estou convicto que se os cuidadores se sentirem mais apoiados terão uma maior qualidade de vida, o que se vai repercutir nos cuidados que prestam ao seu familiar.

BIBLIOGRAFIA

  • BURNS, Robert et al – Aconselhamentos das pessoas que cuidam dos doentes. Pacient Care, edição portuguesa. Lisboa,
  • ISSN:0873-2167, Setembro, 1997.
  • FRIENDLAND, Robert et al. – Demência no idoso : será uma doença de Alzheimer ?. Pacient Care, edição portuguesa. Lisboa, ISSN: 0873-2167, Setembro, 1997.
  • GAMBERT, Steven R. – É doença de Alzheimer?. Postgraduate Medicine. Mem Martins, ISSN: 0872-6590, vol. 9, n.º 1, Janeiro, 1998.
  • HAY, Jennifer – Doença de Alzheimer e demência. Lisboa: Plátano Edições Técnicas, 1996.
  • LUDERS, Selenita Lia Afonso e STORANI, Maria Silva Barros. Demências: Impacto para a Família e a Sociedade. In: NETTO,
  • Matheus Papolio – Gerontologia, a Velhice e o Envelhecimento em visão globalizada. São Paulo: Athneu. 1994.
  • PHANEUF, Margot – Démarche de soins au vieillissement perturbé – Démences et maladie d’Alzheimer. Paris : Masson, 1998.
  • PINTO, Jorge – Actualidades. Geriartria. Lisboa, ISSN: 0871- 5386, vol. 3º, nº123, Março, 2000.
  • PRUIT, Amy A. – a abordagem da demência. In: GOROLL, Alle H. et al – Cuidados Primarios em Medicina. 3ª edição. Alfragide: Mcgraw-Hill, 1997.