A doença de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa, em que as alterações e destruição do tecido nervoso são graduais e progressivas
Título
Demência de Alzheimer: Impacto na pessoa doente e na família
Alzheimer disease: Impact on patient and family
Nursing nº268
Autora:
M. A. Costa
Enfermeira Especialista na Área de Enfermagem Médico-Cirúrgica,
Mestre em Observação e Análise da Relação Educativa e Doutoranda em Enfermagem
Assistente do 2º Triénio na Escola Superior de Saúde de Beja
Resumo
A doença de Alzheimer deteriora a pessoa em geral e em concreto a nível cognitivo, mais tarde ou mais cedo, outros domínios da vida mental são atingidos, e o funcionamento do organismo no seu todo acaba por ser afectado. Isto vai condicionar alterações não só do doente, mas também na família ou meio onde está inserido, pois a perda progressiva de independência obriga sempre a que alguém, de uma forma natural, ou não, assuma os cuidados ao doente. A comunicação é a ponte que se deve manter entre cuidador e a pessoa com demência. Desta forma, o doente pode permanecer conectado consigo mesmo e com o mundo que o rodeia.
Palavras-chave: Défices Cognitivos; Família; Cuidador; Habilidades de Comunicação.
ABSTRACT
Alzheimer’s disease deteriorates the people in generality and in specifically the cognitive level, more late or more early, in other dominions of mental life are affected, and the functioning of the organism, in his generality it finishes for being affected. This condition will change not only the patient but also her family or environment where it operates, as the progressive loss of independence requires that whenever someone in a way, or not, take care of the patient. Comunication is the bridge which should be maintained between caregiver and the people with dementia. In this way, the patient can stay connected with yourself and with the world around him.
Keywords: Cognitive Limitations; Family; Caregivers; Comunication Abilities.
INTRODUÇÃO
Uma das preocupações recentes das sociedades ocidentais reporta-se ao envelhecimento progressivo de um número cada vez mais alargado de pessoas. Vive-se cada vez até mais tarde nos países ditos desenvolvidos, com a percepção de que pelo facto de se acrescentarem anos à vida, isso nem sempre tem significado uma melhoria correspondente na qualidade de vida das pessoas idosas. Na verdade, sendo a idade um factor de risco para o declínio cognitivo, o aumento da população idosa levará ao aparecimento de um cada vez maior número de pessoas com síndromes demenciais, sobretudo com doença de Alzheimer, o que constituirá um grave problema de saúde pública. Segundo as perspectivas epidemiológicas actuais, a partir dos 60 anos, a prevalência da doença aumenta de forma exponencial com a idade e, segundo alguns estudos epidemiológicos recentes, 4,6% das pessoas com mais de 65 anos, e 25% a 47% dos idosos com mais de 85 anos possuem a doença (Santana, 2005).
No grupo das demências, a doença de Alzheimer é a mais frequente, sendo uma doença neurológica degenerativa e irreversível, habitualmente com evolução lenta e insidiosa. A etiologia é desconhecida e não existem métodos de avaliação que permitam afirmar o diagnóstico da doença. O diagnóstico definitivo só se alcança com o exame histológico do cérebro.
Embora se considere que as demências são frequentes no idoso, representam de facto um grupo de patologias cujo diagnóstico é muitas vezes omitido, ou colocado tardiamente devido à ausência de queixas da pessoa ou dos que a rodeiam. Uma deterioração intelectual, mesmo que seja grave, é considerada muitas vezes como normal e relacionada com a idade. A doença de Alzheimer deteriora a pessoa em geral e em concreto a nível cognitivo, mais tarde ou mais cedo, outros domínios da vida mental são atingidos, e o funcionamento do organismo no seu todo acaba por ser afectado. Os défices de ordem cognitiva e comportamental determinam a perda progressiva da capacidade para realizar de forma autónoma as actividades de vida diárias, até à completa dependência.
As alterações decorrentes desta doença incapacitante têm repercussões a nível físico, psíquico e social e, consequentemente, diminuem a qualidade de vida não só da pessoa afectada, como do restante sistema familiar. Dada a extensão e complexidade desta doença que atinge essencialmente os idosos, esta patologia repercute-se sobre a família como um todo e, especialmente, sobre o cuidador. O cuidador de uma pessoa afectada pela doença de Alzheimer é, na maioria das vezes, o parente próximo que habitualmente com ele coabita, é quem mantém as necessidades básicas do doente, quem o orienta e quem o vigia.Cuidar de uma pessoa doente dependente com deterioração cognitiva não é fácil, pode traduzir uma sobrecarga intensa que pode comprometer a saúde e o bem-estar emocional. Geralmente, os laços afectivos que unem cuidador e pessoa doente, são na maioria das situações fortes, o que traz igualmente factores positivos na relação entre o cuidador e o doente, que favorecem uma relação satisfatória e geram sentimentos de prazer e de conforto.
ESTÁDIOS NA EVOLUÇÃO DA DOENÇA DE ALZHEIMER
A doença de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa, em que as alterações e destruição do tecido nervoso são graduais e progressivas. Consequentemente, as suas manifestações são a princípio insidiosas e escapam muitas vezes às pessoas que convivem com o doente. Garcia (2000) refere que, no início só os próprios doentes reconhecem a doença, mais tarde ela é reconhecida pelos doentes, pelos familiares e pelos médicos e que, posteriormente, ela só é reconhecida pelos familiares e pelos médicos e já não pelos próprios doentes.
A demência consiste numa perda das funções mentais, geralmente associada com a idade avançada, envolvendo problemas com a memória e o raciocínio. A perda de capacidades mentais é suficientemente grave para interferir com a capacidade de uma pessoa agir normalmente, no trabalho ou em sociedade. É caracterizada por um defeito nas memórias de curto e longo prazo, e pela desintegração da personalidade devido a alterações no discernimento e no julgamento. A demência é um problema sério de saúde pública, com impacto importante em milhões de pessoas afectadas e nas suas famílias.
As dificuldades na memória, no processamento da informação, atenção, concentração, linguagem e no controlo motor que afecta a fala e a voz, classificam-se normalmente em estádios ou fases. A demência segundo Santana (2005), pode ser classificada em: incipiente, ligeira, moderada e severa.
Estádio de Demência Incipiente (Defeito Puro de Memória)
Os doentes com Alzheimer começam por apresentar um defeito de memória que afecta predominantemente a memória recente. A evocação de factos antigos está relativamente preservada, relativamente à capacidade para memorizar os acontecimentos do dia-a-dia. Neste estádio, actualmente designado por defeito cognitivo ligeiro, os sintomas podem passar despercebidos aos familiares próximos e a pessoa pode utilizar mecanismos de defesa (negação, isolamento e regressão) que os ajudam a enfrentar a doença, os sintomas também podem ser atribuídos a “depressão”. Em muitos casos, ambas a situações concorrem para emergência das alterações cognitivas. O doente nesta fase, não reúne os critérios de demência porque está relativamente autónomo, e assim pode permanecer por um período relativamente longo.
Demência Ligeira
Nesta fase o doente começa a demonstrar dificuldades em planear e executar as tarefas profissionais mais complexas (orientar as finanças, organizar o trabalho diário, conferir trocos, etc.). Uma alteração também frequente é o “defeito de nomeação” (evocar nomes de objectos e de pessoas). Nesta fase, a pessoa perde alguma da sua autonomia e os défices são notados pelos familiares.
Demência Moderada
À medida que os défices descritos se tornam progressivamente mais incapacitantes, começam também a evidenciar-se dificuldades de concentração e de orientação espacial, o doente torna-se repetitivo (perseveração), deixa de reconhecer as pessoas menos íntimas (prosapagnosia), confunde os objectos menos habituais (agnosia), fica mais lento e mais apático e não reconhece os seus défices (anosognosia). São também muito frequentes nesta fase algumas alterações do comportamento e outros sintomas psiquiátricos: displicência com a sua apresentação pessoal e higiene, agitação vs. apatia, insónia, desconfiança e agressividade.
Demência Severa
O defeito de memória é muito grave, não existindo praticamente retenção de informação; o discurso, quando existe, é fragmentado e vazio, o doente não reconhece os familiares próximos, é incapaz de assegurar as actividades de vida diária. São também habituais as alterações do ritmo de sono, agitação vs. apatia, e alguns sintomas psicóticos (alucinações e agressividade). Na fase terminal o doente fica acamado, incontinente e sem comunicação verbal.
O facto de ser uma doença que se manifesta por alterações cognitivas, da conduta social e psicopatológicas, que provocam perda progressiva da capacidade funcional, vai agravar ainda mais as consequências dependentes do envelhecimento. As alterações cognitivas (memória, orientação no tempo e espaço, linguagem, planeamento, juízo crítico, apraxia e agnosia, etc.) interferem na capacidade da pessoa exercer a sua profissão, de planear a sua vida quotidiana, de lidar com diversos instrumentos que fazem parte do funcionamento social e até das actividades básicas da vida diária. O doente vai perdendo progressivamente a sua independência, necessitando cada vez mais de ajuda de outra pessoa. É referido por Schulz (2000), que para valorizar adequadamente o impacto familiar e pessoal da Doença de Alzheimer devemos considerar que se trata de uma patologia neurológica crónica, incurável e degenerativa, pelo que os seus sintomas só pioram e é inevitável a invalidez funcional do doente, levando a uma maior dependência dos seus cuidadores e exigindo uma dedicação cada vez mais exclusiva.
REPERCUSSÕES DA DOENÇA DE ALZHEIMER
Na Dinâmica Familiar
No contexto sociocultural actual, a família continua a desempenhar um papel fundamental e a ser a unidade básica em que nos desenvolvemos e socializamos. É essencialmente nela e com ela que cada indivíduo procura o apoio necessário para ultrapassar os momentos de crise que surgem ao longo da sua vida. A doença, nomeadamente uma doença incapacitante como é o caso da Doença de Alzheimer, exige um reajustamento enorme, com implicações frequentes na dinâmica familiar, Lezaun e Salanova (2001) sublinham que não há doença crónica que requeira tanto ajuste familiar como a demência. Quando uma família é confrontada com a doença de um dos seus membros, todos os elementos vão sofrer de ansiedade e stress, assim, o início da doença constitui uma situação de mudança para o sistema familiar, pois implica um processo de reajustamento da estrutura, papéis, padrões de comunicação e das relações afectivas dos membros da família. O aparecimento de uma doença crónica, como a demência de Alzheimer, no seio de uma família altera completamente a dinâmica familiar. A perda das capacidades funcionais observadas em idosos com doença crónico-degenarativa, implicam reorganização do núcleo familiar no sentido de redefinir papéis e responsabilidades, além de desarticular a dinâmica familiar e desestabilizar as relações interpessoais experimentadas no seu quotidiano (Lezaun e Salanova, 2001).
As alterações decorrentes da doença incapacitante como a demência de Alzheimer têm repercussões a nível físico, psíquico e social e, consequentemente, diminuem a qualidade de vida não só da pessoa em causa, como do restante sistema familiar (Evans et al., 1992). Uma pessoa dependente na esfera familiar altera indiscutivelmente o movimento natural do ciclo vital familiar, podendo ocorrer mudanças a nível da individualidade e da autonomia de todos os elementos da família, como também alguns poderão ter necessidade de alterar ou de desistir de alguns projectos de vida, contribuindo tudo isto para modificar a estrutura familiar e para criar novas relações entre os seus membros (Imaginário, 2003).
De alguma maneira, a patologia individual converte-se em patologia familiar, porque todos sentem a influência negativa do sofrimento. A família, como tal, não é a mesma antes, durante e depois da doença. Esta “nova família” surgirá em função da sua estrutura anterior, mas também do momento evolutivo da história familiar, do membro afectado pela doença, da gravidade, do tipo do processo patológico e das crenças associadas a essa doença em concreto. Na perspectiva de Martins (2003), a funcionalidade conseguida vai, sem dúvida, interferir na forma como a família integra a doença e a crise subsequente, bem como na reorganização que consegue implementar.
Face às repercussões da doença, há necessidade de uma atenção integral à família, tendo em conta todas as suas necessidades biológicas, psicológicas, sociais e espirituais, e todo o seu contexto familiar. Pensamos ser necessário promover a maior colaboração de todos por forma a considerarmos a família a instituição fundamental na vida das pessoas e da sociedade. Como parceiros do cuidar, os familiares poderão ter um papel activo na prestação de cuidados ao doente, assim como na tomada de decisões no cuidado ao mesmo. No que se refere à situação dos familiares como receptores de cuidados, eles requerem informação e acompanhamento por parte dos profissionais, de forma a reunirem as melhores condições para lidarem com a situação/problema.
No Cuidador
A doença de Alzheimar vai condicionar alterações não só no doente, mas também na família ou meio onde está inserido, pois a perda progressiva de independência obriga sempre a que alguém, de uma forma natural ou não, assuma os cuidados ao doente. A dependência funcional sendo consequência de uma deficiência e/ou de uma incapacidade/restrição da actividade, constitui uma desvantagem social/restrição da participação, que leva à necessidade de ajuda de terceiros para a execução de determinadas actividades (Botelho, 1999). O cuidador é a pessoa que mantém as necessidades básicas do doente, que o orienta, que o vigia, podemos dizer que é um instrumento muito valioso no seu tratamento. O conceito de cuidador é muito discutido, pode ser designado como alguém que assume a responsabilidade de cuidar, dar suporte ou assistir alguma necessidade da pessoa cuidada, visando a melhoria da sua saúde (Duarte, 2000). Pode acontecer que o cuidador não se encare a si mesmo como tal nem goste do termo, vendo-se mais como companheiro, filho ou amigo. A origem do cuidador pode ser determinada pela proximidade parental, proximidade física e proximidade afectiva (Martins, 2003). A pessoa que presta cuidados a um doente afectado de doença de Alzheimer é, na maioria das vezes, o parente próximo que habitualmente com ele coabita, em cerca de 70% das situações é o marido ou a mulher quem cuida, com o auxílio dos filhos de outros parentes e vizinhos, ou sem qualquer outra ajuda. Esta relação doente-cuidador é considerada normal segundo as regras sociais e, por isso, considerada na maioria das situações como natural e inevitável. Estima-se que cerca de 40% dos cuidadores não recebam ajuda de ninguém, até mesmo de parentes próximos mas também é verdade que eles tendem a rejeitar o apoio externo, por vezes por sentimentos de culpa ou obrigação moral (Flórez, 1997).
Os cuidados ao doente vão variando com a progressão e características da doença. Na fase inicial são os problemas e as consequências do diagnóstico, que mais afectam ambos (doente e cuidador). As dificuldades em tarefas mais complexas e instrumentais da vida diária vão obrigando o cuidador a assumir e/ou orientar tarefas complexas que o doente está incapaz de cumprir e que, muitas vezes, o cuidador não está habituado a realizar. Á medida que a doença evolui, o doente vai tendo cada vez mais dificuldades e o cuidador tem de assumir todas as tarefas que competiam ao doente e a orientação em tarefas mais simples. A tarefa de cuidar de uma pessoa com doença de Alzheimer é árdua, fatigante e difícil, muito alargada no tempo, normalmente sem descansos e, às vezes, com responsabilidades que ultrapassam o razoável (Sánchez, 2004).
A desorientação, a perda da crítica e as alterações da conduta social, obrigam a uma vigilância quase constante do doente, isto vai exigir muito dos prestadores de cuidados e afectar-lhes a saúde física, mental, a vida familiar, o trabalho e as finanças. Cuidar de uma pessoa com demência é diferente de cuidar de outros doentes, visto que esta doença requer mais tempo e tem um maior impacto no emprego, na força do cuidador, na sua saúde física e psicológica e nos conflitos familiares (Mittelman,1995). Cuidar de uma pessoa doente dependente com deterioração cognitiva não é fácil, pode traduzir uma sobrecarga intensa que pode comprometer a saúde, a vida social e o bem-estar emocional do cuidador, cujo papel está bem evidente nos diferentes estudos realizados por Schneider (1999), Grand (1999), Rodriguez (2003), Sansoni (2004), citados por Garrett (2005), para a identificação dos factores que contribuem para os sentimentos de sobrecarga e depressão neste grupo.
Para além do enorme impacto psicológico de ver um ente próximo perder a sua capacidade intelectual e compostura social, segundo Garrett (2005), outras razões existem para a sobrecarga do cuidador:
- Perda de liberdade, incapacidade de usufruir de tempos de lazer, de férias de fins-de-semana, etc.;
- Sobrecarga de trabalho e muitas vezes o ter de assumir tarefas nunca realizadas;
- Desconhecimento sobre a forma como a doença se manifesta e da forma de lidar com essas manifestações;
- Dificuldades financeiras;
- Presença de alterações psicopatológicas.
Para além destas, existem sobrecargas “escondidas”(WHO, 2001):
- Rejeição social que leva ao isolamento do doente e do cuidador;
- Dificuldade de acesso a uma vida familiar e social normal para ambos;
- Dificuldade no acesso ao apoio médico e a redes de suporte sociais.
Quando a doença progride, os cuidadores ficam frequentemente sem contacto com o resto da família, os amigos e fora das actividades sociais habituais. Mesmo os cuidadores mais dedicados lutam com sentimentos de culpa, ressentimento ou frustração quando lidam com as difíceis mudanças comportamentais que a demência causa. É referido por Coen e Swanwick (1997) que o doente começa a apresentar alterações psicopatológicas tais como agressividade e agitação, falsas interpretações e alucinações que vão dificultar a sua relação com quem o cuida.
Contudo, os cuidadores diferem na forma como lidam com a situação, sendo uns melhor sucedidos que outros, num estudo realizado por Vugt et al (2004) concluíram que o sexo, a educação e a personalidade do cuidador são determinantes importantes na gestão dos cuidados. A forma como o cuidador lida com a pessoa doente é um factor preditivo de agitação no doente e exaustão do próprio cuidador.
A sobrecarga do cuidador, segundo Braithwaite (1992) citado por Martins (2003), é uma perturbação resultante do lidar com a dependência física e a incapacidade mental do indivíduo alvo da atenção dos cuidados. A autora descreve o processo de cuidar de um familiar idoso e/ou dependente como contínuo e quase sempre irreversível, comportando cinco situações de crise: consciência da degeneração, imprevisibilidade, limitações de tempo, relação afectiva entre cuidador e sujeito alvo dos cuidados e a falta de alternativas de escolha.
Se a tarefa de cuidar não é compartilhada com outras pessoas, se o cuidador não tem ajuda ou folgas, podem surgir situações de risco para o cuidador e para o utente, maus-tratos físicos resultantes do stress e tensão acumulados ao longo dos anos. O aparecimento das alterações psicopatológicas agrava a sobrecarga sobre o cuidador e modifica a relação entre eles. Esta é a fase crucial para o cuidador, pois para além da sobrecarga provocada pelos cuidados ao doente, junta-se a frustração pela inevitabilidade da progressão da doença (Mendes, 2003). Envolver a família e os amigos na tarefa de cuidar do doente, ajuda o cuidador e proporciona apoio à pessoa que recebe os cuidados. Se na família houver um clima de entreajuda só há que ser franco e esclarecer os outros membros como se poderão tornar úteis, quantas vezes as pessoas desejam poder ajudar mas desconhecem a situação, ou receiam fazer ofertas nesse sentido.
Deste modo, e dada a extensão e complexidade desta doença que atinge essencialmente os idosos, esta patologia repercute-se de tal forma sobre a família como um todo e, especialmente, sobre o cuidador. Este irá prestar os cuidados ao seu doente, muitas vezes sem conhecer as condutas adequadas face às manifestações da doença e exigências do cuidar. Assim, torna-se essencial a intervenção dos profissionais de saúde, não só para instruir o cuidador no acto de cuidar, mas também para avaliar as possíveis repercussões nesta pessoa que possam advir do acto de cuidar, bem como alertá-la para a ocorrência das mesmas. As intervenções terapêuticas junto dos prestadores de cuidados informais deverão ser conduzidas em relação a três vertentes principais: apoio psicológico, educação/informação e sistemas sociais de apoio (Brito, 2002).
Estratégias que tornam mais eficaz a comunicação
A comunicação é a forma que temos para nos relacionarmos uns com os outros, esta é uma máxima válida para todo o tipo de relação, mais ainda para as pessoas com deterioração cognitiva. A pessoa afectada pela doença de Alzheimer, se não pode comunicar verbalmente, é sensível ao meio que a rodeia e à forma como as pessoas se relacionam com ela. Uma comunicação interpessoal apropriada pode evitar, por exemplo, a necessidade de medidas de contenção física ou farmacológica (Hoewe e Lettieri, 1999).
Uma comunicação adequada é importante porque favorece a relação e, fomenta a autonomia da pessoa com demência. A orientação verbal e não verbal é fundamental para a realização das tarefas nas pessoas com demência. Está documentado que quando surge compromisso da linguagem verbal, a utilização da linguagem não verbal, o toque e o contacto visual podem ser estratégias e constituir elementos eficazes na comunicação com a pessoa demente (Kelly, 1997). O conjunto de alterações que afectam a esfera cognitiva da pessoa com doença de Alzheimer fazem com que a relação com estes doentes seja particularmente difícil, necessitando os cuidadores não só de conhecimentos técnicos e específicos sobre a doença, mas também de habilidades relacionais e de comunicação para cuidá-los com competência.
A comunicação é o elo que se deve manter entre cuidador e a pessoa com demência, desta forma, o doente pode permanecer conectado consigo mesmo e com o mundo que o rodeia. Segundo Castro-Caldas (2006) e Bermejo (1999) para que os cuidadores mantenham uma relação adequada com uma pessoa doente devem utilizar habilidades de comunicação como:
- Identificar o doente pelo nome e identificar-se também pelo nome;
- Aproximar-se do doente pela frente, mantendo o contacto visual;
- Falar com o doente num local sossegado sem ruídos;
- Falar calmamente com clareza de forma gentil e tranquilizadora;
- Adequar a comunicação verbal ao nível de compreensão do doente, utilizar palavras familiares;
- Utilizar gestos para acompanhar as mensagens verbais;
- Dar tempo para o doente responder;
- Utilizar comunicação não verbal (olhar, sorrir, tocar);
- Deve considerar-se o doente como um adulto, não infantilizar;
- Devem evitar-se estímulos e situações que induzem perturbação de comportamento (posturas interpretáveis como agressivas ou ameaçadoras);
- Quando o doente se apresentar irritado ou agressivo, procurar distrai-lo ou mudar a actividade para algo do seu interesse;
- A discussão com o doente é inútil e a sua contenção física deverá sempre que possível ser evitada;
- Não corrigir o doente de forma sistemática;
- Utilizar frases na positiva, curtas e directas;
- Se não compreender o que o doente quer, tentar utilizar perguntas fechadas para respostas sim ou não;
- Dar reforços positivos, não poupar elogios;
- Estimular comportamentos autónomos;
- Manter o doente ocupado e activo;
- Utilizar o humor;
- Utilizar a reformulação;
- Ajudar a comunicar através da leitura;
- Manter-se calmo, evitar exteriorizar a irritação (contar até dez antes de responder).
A comunicação efectiva entre cuidador e doente, é crucial para a realização dos cuidados no quotidiano e o sucesso da comunicação depende, em grande parte, das capacidades do cuidador neste domínio.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando se fala de demência tem-se em especial atenção o conjunto de alterações que afectam a esfera cognitiva, por serem essas as perturbações que mais precocemente chamam a atenção dos familiares. A doença de Alzheimer gera uma deficiência global que determina perda de independência e autonomia, bem como diminuição do papel social. A situação evolui do défice cognitivo ligeiro ao défice cognitivo grave. Para os doentes e seus cuidadores, o declínio funcional pode ser um aspecto problemático, dado que a perda de capacidade para realizar as Actividades de Vida Diárias aumenta a necessidade de cuidados.
O número de pessoas que sobrevivem com problemas de certa forma incapacitantes como no caso da Doença de Alzheimer está a aumentar. Em termos sociais, a realidade que um doente dependente pode esperar não é animadora. Mudanças rápidas e profundas no sistema de valores e nos estilos de vida, juntamente com a multiplicação dos problemas sociais, têm tornado mais complexa quer a vida social, quer a das próprias famílias sujeitas a profundas transformações e crises. Sendo a família a primeira instituição a que normalmente recorremos para garantir o suporte necessário, esta necessita não só de conhecimentos técnicos e específicos sobre a doença, mas também necessita de habilidades relacionais e de comunicação para minimizar as incapacidades e maximizar as capacidades das pessoas que sofrem desta doença, que ainda não tem cura neste momento e que o melhor tratamento é o cuidado e o afecto. O cuidador de um doente de Alzheimer, seja ele quem for, é a pedra- chave do tratamento, com uma importância social fundamental.
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