O diagnóstico é feito durante a gravidez através da medição sérica maternal da alfa fetoproteína, ecografia, amniocentese, e da electroforese da acetilcolinesterase.
Sinais Vitais nº 69
Luísa Azevedo (Enfermeira Graduada, Hospital S. João, Serviço de Neonatologia)
Paula Azevedo (Enfermeira Graduada, Hospital S. João, Serviço de Neurologia Pediátrica)
Paula Janeiro (Enfermeira Graduada, Hospital S. João, Serviço de Neurologia Pediátrica)
Em escavações arqueológicas foram encontrados corpos de crianças com mielomeningocelo, com mais de 3000 anos. Já Aristóteles e Hipócrates descreveram esta malformação. Estas crianças eram abandonadas ou era lhes dado infanticida, uma vez que era desconhecido o tratamento médico. Os primeiros tratamentos a serem efectuados incluíam a aplicação de substâncias esclerosantes à base de iodo e o enfaixamento do mielomeningocelo, normalmente mal sucedidos.
Foi nos dois últimos centenários, com o aparecimento de novas tecnologias, que se verificou um progressivo aperfeiçoamento no tratamento. Em 1990 com o aparecimento de técnicas como shunts valvulares, das algaliações intermitentes, próteses ortopédicas, torna-se então possível o tratamento da criança particularmente de complicações como: hidrocefalia, problemas ortopédicos e urinários. O encerramento cirúrgico do mielomeningocelo torna-se também possível.
Mas apesar destes extraordinários progressos, ainda há muito por descobrir e aperfeiçoar no sentido de proporcionar uma melhor qualidade e vida à criança/ pais com mielomeningocelo.
O mielomeningocelo é uma das 3 formas de apresentação da espinha bífida. A espinha bífida caracteriza- se por uma malformação congénita da coluna vertebral que surge entre a 3ª e 4ª semana de gravidez, em que a parte posterior das lâminas vertebrais não se fecha. Quando existe um defeito dos arcos posteriores, acompanhado por uma hérniação com envolvimento meningeo e elementos neurais (medula e/ou raízes dos nervos raquidianos), designa-se por mielomeningecelo1. O mielomeningocelo pode aparecer em qualquer segmento da coluna vertebral, mas o mais frequente é na região lombo-sagrada. Pode estar associado a outras malformações do sistema nervoso, tais como a hidrocefalia e a malformação de chiari.
Há 3 tipos de apresentação do mielomeningocelo:
• Mielomeningocelo forma aberta ulcerada – É a forma mais grave do mielomeningocelo, uma vez que a medula espinal fica na superfície corporal totalmente a descoberto(aparece com cor vermelha escura no centro, que corresponde à medula, ladeada por uma zona branca acinzentada que corresponde à piamater). Complicação frequente é a meningite ascendente.
• Mielomeningocelo forma fechada epitilizada– Nesta forma, a herniação apresenta-se recoberta por uma fina camada de pele na sua parte central aumentando de espessura para a periferia.
• Mielomeningocelo com lipoma – Entre a pele e a medula intercala-se tecido adiposo, formando um
lipoma. A pele que recobre está integra, por vezes apresenta-se em angiomas planos. Em 1769, Mongani explica a origem a origem desta malformação, como resultante da super distensão do tubo neural e consequente ruptura do mesmo. Esta super distensão está relacionada com a circulação de licor.
Recklinghausen, em 1886, defende que o mielomeningocelo surge devido a uma falha no encerramento do tubo neural durante o período da embriogénese. Esta é a teoria mais aceite. Apesar de extensos estudos epidemológicos, a causa mantêm-se desconhecida, sendo provavelmente multifactorial:
• Factores teratógénicos – Adição de determinadas substâncias/agentes durante as primeiras semanas da embriogése (agentes bloqueadores do canal de cálcio, fosfolipase c, vitamina A. Deficiência maternal ou fetal em ácido fólico.
• Factores genéticos – Alterações ligadas ao génese PAX 3. Existe uma maior incidência no sexo masculino e em crianças de raça caucasiana.
• Radiações.
• Causa viral – Tem se verificado uma maior incidência durante os meses de inverno.
O diagnóstico é feito durante a gravidez através da medição sérica maternal da alfa fetoproteína, ecografia, amniocentese, e da electroforese da acetilcolinesterase. Devem ser feitos entre a 16ª e a 18º semana de gravidez a fim de permitirem o aborto terapêutico. Após o nascimento a TAC, a RMN, o raio X, a eco-transfontanelar, o electromiograma, a cistografia, a urografia e a cistometria são importantes no despiste dos défices existentes e de outras malformações associadas. As complicações dependem do nível e da extensão da lesão. Quanto mais alta a lesão maiores serão os défices.
A hidrocefalia é também um défice neurológico frequente, 15% dos casos existem há nascença e 80% desenvolvem-se posteriormente. Caracteriza-se por uma acumulação anormal do líquido cefalorraquidiano a nível craniano. As crianças são submetidas à colocação de um shunt ventriculo-peritoneal ou a ventriculocisternostomiaO encerramento cirúrgico é feito nas primeiras 24 horas de vida e tem como objectivo prevenir a infecção e proteger os nervos espinhais.
Os cuidados de Enfermagem são planeados em função dos défices presentes:
• Nas primeiras 48 horas é fundamental manter a criança em decúbito ventral (dorsal se for permitido);
• Fazer penso único de acordo com a prescrição;
• Efectuar balanço hídrico pois pode existir perda de liquor e soro pela mal formação;
• Vigiar sinais de infecção.
– Dificuldade alimentar, engasgo, estridor, apneia, paralisia das cordas vocais, acumulação de secreções e espasticidade, podem indicar a malformação de Chiari.
– Aumento do perímetro encefálico, fontanela hipertensa, olhos em sol poente, dilatação das
veias do couro cabeludo, vómitos, irritabilidade, crises convulsivas e alteração do estado de consciência são indicativos de hidrocefalia activa. É fundamental avaliar diariamente o perímetro cefálico, fazer uma monitorização contínua de sinais vitais e uma avaliação neurológica sempre que necessário.
– Se existe uma bexiga neurogénica flácida é importante iniciar treinos vesicais. É função do enfermeiro fazer ensino aos pais sobre algaliação, bem como avaliar a eficácia desse ensino.
– Se existe diminuição da sensibilidade dolorosa é importante que a criança não sofra acidentes, para isso é necessário ensinar a mãe sobre a importância de afasta-lo de fontes de calor, objectos cortantes e objectos pesados.
– Se a criança apresenta gessos correctivos é importante vigiar sinais e sintomas de comprometimento neurocirculatório, observando as características da pele (cor, retorno vascular, temperatura) e movimentos voluntários.
O prognóstico da saúde da criança com mielomeningocelo depende do défice neurológico presente ao nascimento, incluindo a capacidade motora, a enervação vesical assim como a presença de lesões cerebrais associadas. A morte precoce deve-se normalmente a infecção do sistema nervoso central ou à hidrocefalia grave. A morte tardia é causada por infecção do tracto urinário, insuficiência renal ou complicação do Shunt.
É de fundamental importância o apoio aos pais, com o encaminhamento para as instituições de apoio. Devem entrar em contacto com a assistência social para se informarem das ajudas que existem a nível nacional. Existe a Associação de Espinha Bifída e Hidrocefalia de Portugal que patrocina ajudas técnicas (carrinhos, andarilhos, etc.), ensino especial, colónia de ferias e subsídios que estes pais podem requerer para os seus filhos.
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