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A Dor no Recém-nascido… O desafio da avaliação

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Revista Nursing

A subjectividade da dor gera uma grande dificuldade para a elaboração de um método único de avaliação e de fácil aplicação na clínica diária

Nursing nº 233

S. P. Souto

Enfermeira grau I, Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde

RESUMO

O trabalho que aqui se apresenta, intitulado – O Desafio da Avaliação da Dor no Recém-nascido – aparece como um contributo para a qualidade nos cuidados de saúde neonatais e pretende ser o suporte objectivo dotado de validade científica a partir do estado actual da investigação no campo das ciências biomédicas para a avaliação da dor no recém-nascido, assumindo-se como um compromisso e responsabilidade profissional de todos.

O artigo de revisão elaborado encerra em si, como objectivo geral: promover o desenvolvimento profissional e ético, no âmbito da avaliação da dor no recém-nascido.

Foram revistos livros de texto e artigos sobre os parâmetros de observação e interpretação implicados no processo de avaliação da dor no recém-nascido.

É possível constatar que em decorrência da subjectividade da dor e da inabilidade do recém-nascido em relatar verbalmente a sua dor, o profissional de saúde deve estar atento às alterações fisiológicas e comportamentais que acompanham o episódio doloroso, além de saber utilizar instrumentos de avaliação da dor nessa faixa etária.

Da valorização e adequada avaliação da dor, em Neonatologia, advém o cumprimento de um dos grandes imperativos éticos que norteiam a excelência da conduta clínica e que se relaciona com a humanização dos cuidados dirigidos ao recém-nascido.

PALAVRAS-CHAVE: Dor, Recém-nascido, Avaliação

ABSTRACT

The Challenge of the Pain´Valuation in Newborn – is a work which contributes for the improvement of neonatal health care, and intends to be an objective scientific source based on the current scientific status of investigation in the field of biomedical sciences for the evaluation of pain in newborn, thus assuming itself as a commitment and professional responsibility of all.

The main goal of this revision article is to promote the professional and ethical development, in the extent of the evaluation of pain in new-born.

Text books and articles were revised on the parameters of observation and interpretation implicated in the process of evaluation of the pain in the newborn.

It’s possible to verify than as a result of the subjectivity of the pain and the new-born’s inability in reporting verbally his pain, the health care professional must be alert to the physiologic and behavioral modifications resulting of the painful episodic, and most of all, know how to use evaluation pain instruments on this age group.

The increase in value and appropriate evaluation of the pain, in Neonatology, represents the fulfilment of an ethical imperative, witch leads the excellence of clinical conduct and it connected with the humanization of the care directed to a new-born.

KEYWORDS: Pain, Newborn, Evaluation

INTRODUÇÃO

O profissional da saúde deve ser portador de um conhecimento científico do conteúdo, visando construir em si os contornos da complexidade das suas práticas, mas também o fascínio de as tornar simples em cada acto profissional reflexivo e competente, em cada acto de Bem Fazer e Fazer Bem. É segundo este paradigma que parece da maior actualidade e importância a realização de um trabalho sobre a Dor no Recém-nascido, uma vez que, nas últimas décadas, tem aumentado a preocupação com a dor, principalmente, nas Unidades Neonatais.

Durante muito tempo acreditou-se que os recém-nascidos eram incapazes de sentir dor em virtude da dificuldade de pesquisar a resposta à dor. Um corpo substancial de conhecimentos solidificou-se e vem ramificando-se nos últimos anos, comprovando a existência de dor no período neonatal, bem como os seus efeitos e possíveis repercussões no bem-estar do recém-nascido. De facto, avanços científicos importantes têm sido obtidos na compreensão trifásica do fenómeno doloroso, no contexto da Neonatologia, ao nível da prevenção, avaliação e tratamento.

Embora a comunidade médico-científica aceite, actualmente, que o recém-nascido é capaz de sentir dor e responder ao estímulo nociceptivo, esta problemática não tem merecido a atenção devida junto dos profissionais de saúde que prestam cuidados ao recém-nascido. Este lapso entre o conhecimento científico e a conduta na prática clínica deve-se, provavelmente, à dificuldade de avaliação da dor no neonato. Isso traduz-se na necessidade de os profissionais de saúde envolvidos nos cuidados ao recém-nascido, nomeadamente, os enfermeiros precisarem reconhecer em primeiro lugar que o recém-nascido é capaz de sentir dor e saber, igualmente, quais as medidas capazes de avaliar a dor e aplicá-las adequadamente. Neste sentido, estar-se-á a contribuir para um dos grandes imperativos éticos que norteiam a excelência da conduta clínica e que se relaciona com a humanização dos cuidados, sem se esquecer as competências técnicas e científicas. Devido à complexidade dos cuidados ao recém-nascido internado, não se pode descorar a importância da adopção de medidas relacionadas com a avaliação e tratamento da dor, traduzindo-se, num conjunto de iniciativas que visa a produção de cuidados de saúde capazes de conciliar a melhor tecnologia disponível com a promoção de um acolhimento holístico e respeito ético pelo recém-nascido 1.

O interesse demonstrado na elaboração de um trabalho sobre a avaliação da dor no recém-nascido fundamenta-se numa importância dicotómica: por uma lado, a reflexão sobre a actuação de enfermagem face ao fenómeno doloroso, em Neonatologia, como favorecedora de uma assistência mais humanizada e, consequentemente, contribuir para o exercício de uma prática de excelência e por outro lado, a necessidade de discussões alargadas sobre a existência de políticas de valorização e avaliação da dor durante o período neonatal a nível das instituições de saúde, nomeadamente, através da criação e implementação de protocolos de actuação estandardizados.

OBJECTIVOS

Os objectivos principais que precisam a elaboração do presente artigo são:

  • Conhecer e analisar a importância da percepção e valorização da dor no período neonatal;

  • Promover o desenvolvimento profissional e ético, na área da avaliação da dor no recém-nascido;

  • Actualizar e/ou renovar conhecimentos sobre a avaliação da linguagem de dor do recém-nascido, através da interpretação dos parâmetros físicos e comportamentais e da aplicação de escalas de avaliação da dor neonatal;

MATERIAL E MÉTODOS

Para garantir uma melhor compreensão do trabalho desenvolvido, torna-se fundamental apresentar os elementos metodológicos mais relevantes que caracterizam a sua concepção. Em primeiro lugar, apraz referir que foi elaborado um artigo sob a modalidade de revisão. Neste sentido, todo o trabalho é atravessado, transversalmente, por uma revisão bibliográfica sobre os parâmetros de observação e interpretação implicados no processo de avaliação da dor no recém-nascido.

Foram revistos textos de livros e artigos desde 12 de Junho até 27 de Julho de 2007.

Um outro aspecto metodológico que deve ser referenciado prende-se com a estruturação do artigo e o modo como os conteúdos teóricos pesquisados são apresentados. Assim, desde já é desvendada a posição que os resultados obtidos da pesquisa ocupam no artigo. Com efeito, inicialmente, é feita uma análise sobre o estado actual e importância da valorização da dor em Neonatologia. Os tópicos seguintespõem em evidência, primeiro, a avaliação da linguagem de dor do recém-nascido, testemunhada por parâmetros físicos e comportamentais e, posteriormente, a aplicação de escalas de avaliação da dor neonatal, como instrumentos de interpretação dos referidos parâmetros.

RESULTADOS

Valorização da dor no Recém-nascido: actualidade e importância

No prefácio de uma obra literária sobre a Dor, os seus autores dizem: “O problema da dor foi, portanto, transformado, de um mero sintoma a ser tratado por várias especialidades médicas, numa entidade própria que constitui, actualmente, um dos domínios mais excitantes, em franca progressão, da Ciência e da Medicina.” 2. A dor é, sem dúvida, um dos sintomas mais antigos e intrigantes da História da Humanidade e tem sido objecto de estudo de várias disciplinas. A dor constituiu um fenómeno universal e complexo caracterizado pela sua subjectividade e multidimensionalidade, ou seja, representa uma categoria de fenómenos que compreendem uma multidão de experiências diferentes e únicas 2,3.

A dor pela sua prevalência e potencial pode causar desconforto, stress e sofrimento, o que justifica uma actuação planeada e organizada cientificamente. A Direcção Geral de Saúde em colaboração com a Associação Portuguesa para o Estudo da Dor emite uma circular normativa que concebe a Dor como o “5º sinal vital” 3, o que implica que se definam modelos de organização nas instituições que promovam a abordagem da Dor como um direito do cliente e simultaneamente um dever dos profissionais de saúde, revelando competência e ética profissional.

Fazendo a correspondência entre esta necessidade de compreensão e intervenção no domínio da dor no indivíduo com a problemática em análise, constata-se que, muito embora nas últimas décadas, tenha aumentado a preocupação com a dor, nas unidades neonatais, o exercício da prática clínica encontra-se, ainda, balizado por uma filosofia de actuação que desvaloriza a dor no recém-nascido 4-19.

Pela diversidade das experiências dolorosas, explica-se porque tem sido impossível, até hoje, encontrar uma definição definitiva e satisfatória de dor. Se se considerar a definição de dor da Associação Internacional para o Estudo da Dor (ISPAD) 3,5,6,13, de 1986, como uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a uma lesão tecidual real ou potencial ou descrita em termos de tal lesão; ou também a descrita por McCaffery 6, em 1989, como dor é o que o indivíduo diz sentir e existe quando ele diz existir; ou ainda a concepção considerada por Seeley, Stephens e Tate 20, definindo a dor como “ (…) uma sensação que se caracteriza por um grupo de experiências perceptuais e emocionais desagradáveis, que desencadeiam respostas autonómicos, psicológicas e somatomotoras”, a primeira questão suscitada é: será o recém-nascido capaz de sentir dor?

Durante muito tempo acreditou-se que os recém-nascidos não sentiam dor, facto justificado pela crença de que o seu sistema nervoso, por ser imaturo, lhes proporcionaria uma prolongada insensibilidade à dor. Actualmente, evidências científicas reconhecem que as vias neurológicas e os núcleos cerebrais envolvidos nos processos sensoriais podem ser identificados a partir da 24ª semana de gestação 4,5,6,8,9,13. A mielinização incompleta é compensada pelas distâncias interneuronais e neuromusculares mais curtas, aumentando, assim, a velocidade média da condução nervosa 4,6,9. Deste modo, a crença de que os recém-nascidos não sentem a dor parece estar equivocada.

Os cuidados de saúde ao recém-nascido sofreram uma mudança considerável nas últimas décadas. O avanço tecnológico e farmacológico e o desenvolvimento profissional, em contexto neonatal, vêm proporcionando uma maior taxa de sobrevida e melhor assistência aos recém-nascidos. De facto, vários são os factores que contribuíram, decisivamente, para o desenvolvimento de novos desafios no domínio da Neonatologia, onde a percepção e valorização da dor começa a assumir, hoje, um lugar de destaque. Tomar consciência desta realidade é tanto mais importante quando se sabe, hoje, que a dor no neonato é real e que tem o potencial de desencadear complicações mais reservadas, ao nível do seu Bem-estar.

Considerando o recém-nascido como um sujeito de direito, a Carta da Criança Hospitalizada adoptada, em 1988, em Leiden na Holanda, assegura o direito a evitar todo o exame ou tratamento que seja indispensável, acrescentando que as agressões físicas e emocionais e a dor devem ser reduzidas. Apesar dessa garantia legal, é visível que ainda, hoje, esse direito não é assegurado em muitos dos cuidados dirigidos aos neonatos.

Avaliação da dor no Recém-nascido

O êxito da percepção ou valorização da dor no recém-nascido requer a capacidade de avaliação 4-19, 22-25. A avaliação da dor no recém-nascido não é um tema fácil. A simples tomada de consciência, pelos profissionais de saúde, de que os recém-nascidos são capazes de sentir dor é o elemento decisivo no reconhecimento e avaliação da dor 6,14,18,19,22. Existe um conjunto diversificado de factores que fazem com que a avaliação da dor no recém-nascido seja diferente e bem mais desafiante. Neste sentido, destaca-se a existência de suposições incorrectas e “mitos e preconceitos”, a adopção de atitudes erróneas, a realização de escassa investigação científica e a complexidade da valorização e interpretação da dor do recém-nascido, devido à sua incapacidade de a expressar verbalmente 6.

Nesse contexto, a dor dos indivíduos que não a podem exprimir através de palavras torna-se um fenómeno a parte. Os neonatos não verbalizam a dor que sentem. Assim, parece existir um modo “próprio” de expressão da dor pelo recém-nascido, ou seja, uma “linguagem” alternativa de dor. Isso significa que os profissionais de saúde, nomeadamente, os enfermeiros envolvidos os cuidados ao neonato devem estar aptos a descodificar a linguagem da dor evidenciada 6,7,12, 13,14, 17, 21.

A linguagem da dor no recém-nascido é avaliada por uma série de parâmetros físicos, que monitorizam a resposta orgânica do recém-nascido ao estímulo nociceptivo e parâmetros comportamentais, que registam a frequência de alterações de comportamento desencadeadas pela dor. As alterações fisiológicas estão, intrinsecamente, com a monitorização das frequência cardíaca e respiratória, tensão arterial, saturação de O2, tónus vagal, sudação palmar e alterações hormonais 4-7,12,13,14,16,17,18,19. Os indicadores fisiológicos, por não serem específicos para a dor, são difíceis de relacionar com a presença e intensidade da dor, ou seja, podem ser afectados por outras experiências que não a dor e estarão sujeitos ao processo de adaptação ao longo do tempo 14.

Por outro lado, a avaliação comportamental do neonato é feita, preferencialmente, através da observação da expressão facial, movimentação comportamental e do choro 4-7,12,13,14,16,17,18,19, que serão abordados mais pormenorizadamente, mais adiante. Outros autores referem que o padrão sono/vigília e as alterações na relação mãe-filho são parâmetros que não devem ser descorados na avaliação comportamental 12,14,16,18,19. Tem-se atribuído importância crescente a essas medidas comportamentais, uma vez que elas parecem representar uma resposta mais específica ao estímulo doloroso, quando comparadas aos parâmetros fisiológicos. Contudo, a avaliação comportamental perde consistência clínica pela falta de objectividade, dependendo da interpretação do profissional acerca dos comportamentos avaliados 6,14,18.

Mímica facial

As alterações da mímica facial vêm sendo uma das ferramentas mais empregadas no estudo da dor no recém-nascido: fronte saliente, fenda palpebral estreitada, sulco naso-labial aprofundado, lábios entreabertos, boca estirada, tremor do mento e língua tensa 14,16,17,18.

A observação da expressão facial constituiu um método não invasivo de avaliação de dor em recém-nascidos prematuros e de termo 4,7,14,23,24. A actividade facial dos recém-nascidos é expressiva e parece fornecer informações importantes sobre o estado emocional do recém-nascido, além da dor, satisfazendo, assim, o critério subjectivo, necessário para a determinação da presença da dor, segundo a definição da ISPAD. A análise da expressão facial fornece, portanto, informações válidas, sensíveis e específicas a respeito da natureza e da intensidade da dor, permitindo uma comunicação eficaz entre o neonato e as pessoas envolvidas nos cuidados.

Choro

Outro parâmetro que faz parte do repertório de expressões da dor no período neonatal e pediátrico é o choro, constituindo o método primário de comunicação nos neonatos 4,7,16,17,18. Será que existe, realmente, um choro específico de dor? Sabe-se que o choro do neonato, de maneira geral, apresenta uma fase expiratória definida, seguida por uma breve inspiração, um período de descanso e, de novo, uma fase expiratória. Quando ao estímulo doloroso, ocorrem alterações discretas nos parâmetros descritos: a fase expiratória fica mais prolongada, a tonalidade mais aguda, há perda do padrão melódico e a duração do choro aumenta 17,18. Tais evidências parecem indicar que existe, realmente, um choro específico de dor.

Apesar de o choro ser considerado um parâmetro importante na avaliação de dor, a prevenção e o tratamento da dor e do stress em neonatos referem que a falta de resposta comportamental, incluindo o choro e movimentos, não é, necessariamente, indicativo de falta de dor, o que tem dificultado a análise das características do choro e as suas relações com a dor 16.

Assim, o choro constitui outra “letra” do alfabeto da expressão da dor no recém-nascido, mas isoladamente torna-se pouco específico, não sendo capaz de fornece informações suficientes para a decisão clínica a respeito da necessidade de intervenção 18, 23,24.

Resposta motora

A análise da actividade motora constituiu um método sensível de identificação da dor, pois os recém-nascidos prematuros e de termo demonstram um repertório organizado de movimentos após a estimulação sensorial.

Diante de um estímulo doloroso, o recém-nascido apresenta rigidez do tórax e movimentos de flexão e extensão das extremidades. De facto, existe uma linguagem corporal em resposta ao estímulo doloroso no neonato. A questão que se coloca, quando se aceita a resposta motora como expressão de dor, é se tal resposta é específica ao estímulo doloroso. A movimentação corporal não aparece só em reacção à dor, mas pode ser obtida também diante de outros estímulos desagradáveis, porém não dolorosos. Além disso, parece haver uma variação individual na amplitude da resposta motora 4,5,7,16,17,18,23. Desse modo, a movimentação corporal parece ser mais uma “letra” do “alfabeto” da expressão da dor no período neonatal, mas outros elementos são necessários para que se formem “palavras” descodificáveis.

Escalas para a avaliação da dor no Recém-nascido

Uma análise da literatura revela uma variedade de instrumentos que foram desenvolvidos para coligir informação sobre episódios dolorosos que os recém-nascidos possam experimentar e que se manifestam, particularmente, fundamentais na “descodificação” da linguagem de dor expressa. A criação de escalas para avaliação da dor surgiu como tentativa de analisar de forma mais objectiva essas respostas à dor para se intervir de maneira adequada e reduz a possibilidade de interpretação errónea da dor no recém-nascido 5,18,19,23,24.

Neste sentido, foram desenvolvidas escalas multidimensionais, que tentam analisar os parâmetros comportamentais, anteriormente referenciados, associados a algumas respostas fisiológicas 23,24,25.

A subjectividade da dor gera uma grande dificuldade para a elaboração de um método único de avaliação e de fácil aplicação na clínica diária 22,24. Assim, como qualquer instrumento de mensuração, as escalas de avaliação da dor no período neonatal devem ser válidos, seguros, confiáveis, úteis e exequíveis.

Dos vários instrumentos descritos na literatura para a avaliação da dor no recém-nascido, os mais estudados são o Sistema de Codificação da Actividade Facial (NFCS), a Escala de Avaliação da Dor (NIPS) e o Perfil de Dor do Prematuro (PIPP).

Sistema de Codificação da Actividade Facial (NFCS)

Grunau & Craig, em 1987, conceberam um instrumento de avaliação da dor do recém-nascido, que pode ser utilizado para o estudo da dor ou para a sua avaliação clínica. Trata-se do Sistema de Codificação da Actividade Facial Neonatal (NFCS), que tem em consideração a presença ou ausência dos seguintes movimentos faciais: fronte saliente; olhos espremidos; sulco naso-labial aprofundado; boca esticada; lábios entreabertos; lábios franzidos; língua tensa e tremor do mento. Para cada movimento facial presente, é atribuído um ponto, sendo o score máximo de oito pontos. Considera-se a presença de dor quando a pontuação é superior a três (Quadro 1) 5,23, 24,25.

QUADRO Nº1

Escala de Avaliação da Dor Neonatal (NIPS)

A Escala de Avaliação da Dor (NIPS), concebida por Lawrence e seus colaboradores, em 1993, é composta por seis indicadores de dor, cinco comportamentais e um fisiológico, incluindo a expressão facial, o choro, a movimentação dos braços e pernas, o estado de sono/alerta e o padrão respiratório. Trata-se de uma escala válida, pois baseia-se nas alterações comportamentais frente ao estímulo doloroso, considerando-se que existe dor quando a pontuação é superior a três. A escala apresentada tem-se mostrado útil para a avaliação de dor em neonatos de termo e prematuros, conseguindo diferenciar os estímulos dolorosos dos não dolorosos (Quadro 2) 5,23,24,25.

QUADRO Nº 2

Perfil de Dor do Prematuro (PIPP)

O Perfil de Dor do Prematuro (PIPP) foi desenvolvido especialmente para avaliar a dor aguda de recém-nascidos prematuros e de termo e consta da avaliação do estado de alerta, variação da frequência cardíaca, saturação de oxigénio e três parâmetros de mímica facial: testa franzida, olhos espremidos, sulco naso-labial aprofundado. O PIPP reflecte diferenças entre estímulos dolorosos e não dolorosos, em toda a faixa etária neonatal. Esta escala valoriza o prematuro e preocupa-se com o facto de que ele pode expressar menos dor, constituindo um instrumento útil, específico e sensível para a avaliação da dor do cliente neonatal (Quadro 3) 5,23,24,25.

QUADRO Nº 3

Para que as escalas de avaliação sejam adequadamente utilizadas, há necessidade de treino dos profissionais envolvidos no cuidado ao recém-nascido.

A introdução de instrumentos de monitorização, da dor no recém-nascido, apropriados na prática clínica cria a visão de uma aproximação sistemática à avaliação da dor, um sistema no qual as crenças pessoais, atitudes e subjectividade são reduzidas ao mínimo 22.

DISCUSSÃO

Com ênfase na prestação actual dos Cuidados de Saúde/Cuidados de Enfermagem desenvolvidos, no contexto da Neonatologia, surgem várias obras literárias, que abordam a temática da dor no recém-nascido. O facto de se lidar com clientes pré-verbais e que expressam a suas reacções aos mais variados estímulos de forma similar, pode levar a grandes dúvidas na interpretação e avaliação das respostas à dor, impedindo uma intervenção congruente e eficaz. Dessa forma, um ponto fundamental para a abordagem terapêutica da dor neonatal é, sem dúvida, uma avaliação adequada da sua presença.

A pesquisa no que diz respeito à dor no recém-nascido irá continuar porque a compreensão da limitação do conhecimento actual é o primeiro passo no sentido de melhorar o exercício da prática clínica. Existe o potencial para o desenvolvimento de políticas e estratégias especificamente dedicadas à avaliação e tratamento da dor no recém-nascido. Pois só através destas medidas se podem obter mais conhecimentos, ser instituída uma prática mais sofisticada e serem desenvolvidas melhorias na gestão da dor, durante o período neonatal.

Para a garantia de uma prestação de cuidados de saúde de qualidade ao recém-nascido, ao nível da avaliação da dor, são necessários conhecimentos renovados e “teorias de acção” inovadoras. Advém, assim, a necessidade de uma educação e treino específico pelos profissionais de saúde para a aquisição e desenvolvimento de competências, nomeadamente ao nível da aplicação das escalas de avaliação da dor.

Perante uma sociedade, cada vez mais exigente e com direito a sê-lo, o caminho é a prossecução do objectivo do bem-estar e qualidade de vida, onde a saúde do recém-nascido depende do resultado de uma série de atitudes relacionadas entre si e que cada vez mais terão que fazer parte de todas as instituições e profissionais de saúde, que centram os seus cuidados no recém-nascido, através de um processo de consciencialização pessoal e profissional. Tudo isto conduz à necessidade de agir com base numa atitude de inconformismo e combate à não-qualidade.

De facto, se a prevenção, avaliação e tratamento da dor no período neonatal é uma acção prioritária, importa encontrar soluções funcionais que passam pelo esforço contínuo de todos, para fazer bem, produzir melhor, definir o que é desejável e agir em conformidade. São necessários modelos e atitudes renovadas e novas relações internas e externas. Esta atitude corrobora uma conhecida frase de Epícteto: “uva verde, uva madura, uva seca. Tudo é mudança, para não deixar de ser, mas para se tornar no que ainda não é”.

A importância e actualidade do trabalho desenvolvido justificam a sua leitura. Um convite que se traduz, ao mesmo tempo, num apelo à reflexão sobre metodologias de intervenção implicadas no processo de avaliação da dor no recém-nascido, contribuindo para a formação de profissionais de saúde cada vez melhor preparados para dar resposta a necessidades em constante evolução, como a problemática referente à dor no recém-nascido, e para a melhoria da qualidade dos cuidados circunscritos à esfera do bem-estar neonatal.

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