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Bullying versus Mobbing: Investigações em Profissionais

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Revista Nursing

Atualmente, as instituições revelam interesse sobre a qualidade de vida no trabalho, pelo que, a violência em contexto laboral é motivo de estudo

Título:

Bullying Versus Mobbing: Investigações em Profiissionais
Bullying versus mobbing: Investigations in Professionals

Nursing nº279

Autores:

PINTO Pós-Graduação em Higiene e Segurança no Trabalho

D. SARAIVA Especialização em Enfermagem Médico-Cirúrgica

Resumo

Atualmente, as instituições revelam interesse sobre a qualidade de vida no trabalho, pelo que, a violência em contexto laboral é motivo de estudo. O mobbing e o bullying enquanto fenómenos associados à violência assumiram, nas duas últimas décadas, crescente interesse da comunidade científica internacional, nomeadamente entre os profissionais da área da saúde, uma vez que este fenómeno tem consequências altamente negativas, quer do ponto de vista individual, organizacional e social.

Para facilitar o entendimento do bullying e mobbing, têm sido realizadas investigações a nível mundial em vários profissionais, no entanto, é necessário mais pesquisas para que ocorram mudanças positivas nas instituições. É neste sentido que surge este trabalho, através de uma pesquisa bibliográfica que analisa e clarifica estes dois conceitos. Após uma breve abordagem concetual, serão mencionados estudos em enfermeiros e outros profissionais, bem como programas de prevenção e formas de intervenção.

Palavras-Chave: Bullying; Mobbing; Prevenção.

Abstract

Currently, the institutions, reveal concern about the quality of work life, so that the violence in workplace is cause for study. Mobbing and bullying are associated with violence, in the last two decades have taken increasing interest in the international scientific community, particularly among health professionals, because it has highly negative consequences, both in terms of individual, organizational and social.

To understanding of bullying and mobbing, investigations have been conducted worldwide in several professional, however, more research is needed to make positive changes occur in institutions. This is what comes up this work, through a literature that analyzes and clarifies these two concepts. After a brief conceptual approach, studies will be mentioned in nurses and other professionals as well as prevention programs and ways of intervention.Keywords: Bullying; Mobbing; Prevention.Introdução

Na sociedade atual os fenómenos de bullying e mobbing articulam-se dentro de um tema mais vasto que diz respeito ao amplo espetro da violência.

A questão da violência aparece nos dias de hoje como grande ameaça à vida em sociedade, domina as conversas, monopoliza a atenção dos mídia e figura como um tema sério de estudo entre investigadores de todo o Mundo.

Bradaschia (2007) citando Johnson e Indivik (2001) refere que a cada semana atingimos um novo patamar de incivilidade e que segundo Agamben (2002) citado pelo mesmo autor temos hoje diante de nós uma vida exposta a uma violência sem precedentes precisamente nas formas mais profanas e banais.

Trata-se de uma violência excessiva que visa suprimir não somente o indivíduo, mas o seu próprio sentido, traduzindo um importante problema de Saúde Pública, devido às consequências para as vítimas, ao impacto que causa na comunidade e ao seu enorme custo para a sociedade.

Nos últimos anos, a violência no trabalho tem sido objeto de inúmeros estudos especificamente no campo das Ciências Sociais. Não obstante a proliferação destes dentro e fora do país, constata-se que a investigação nesta área está segmentada e dispersa por diferentes áreas do conhecimento (Medicina, Psicologia, Administração etc.).

Neste sentido, surge o presente artigo que visa a sistematização e diferenciação destes dois conceitos e a divulgação de formas de intervenção e prevenção nos variados domínios.

Bullying versus Mobbing

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (Chapell e Di Martino, 2006), a violência pode-se categorizar em dois tipos:

1) Física – uso da força física contra uma pessoa ou grupo com resultados prejudiciais em termos físicos, sexuais ou psicológicos, ou

2) Psicológica – uso do poder de forma intencional, incluindo ameaça e a força física contra uma pessoa ou um grupo, podendo originar dano físico, mental ou espiritual, moral ou social (caso do mobbing e bullying).

Ao pretendermos definir conceptualmente o fenómeno bullying, vários são os aspetos a considerar; em primeiro lugar, uma definição do fenómeno, em segundo lugar a caracterização dos diferentes tipos de comportamento de bullying existentes e, finalmente, a diferenciação face a outras situações semelhantes que, não raras vezes, se confundem com o bullying.

A palavra bullying deriva do verbo inglês bully que significa usar a superioridade física para intimidar alguém. Também pode ser empregue como adjetivo referindo-se a valentão ou tirano (Duque et al. , 2008) e explica um fenómeno relacional comummente observado em grupos, sobretudo em escolas, caracterizado pela presença de comportamentos agressivos, cruéis, intencionais e repetitivos adotados por uma ou mais pessoas contra outras, sem motivação evidente (fig.1).

Destaca-se a palavra repetitivo, pois é a persistência do comportamento hostil, repulsivo e intimidador contra uma mesma pessoa ou grupo que determina o bullying (Fante, 2005; Duque et al. , 2008).

Fig. 1 – Características do bullying enquanto forma de agressão.

É um fenómeno característico de adolescentes excluídos e discriminados, agredidos por outra pessoa (Neto, 2005).

Fante (2005: 9) refere que se vem “disseminando em meios escolares, cresce e envolve, de forma quase epidémica, um número cada vez maior de alunos. A sua ação maléfica traumatiza o psiquismo das suas vítimas, provocando um conjunto de sinais e sintomas muito específicos, caracterizando a Síndrome dos Maus-Tratos Repetitivos”.

Neste contexto, constitui preocupação de inúmeros pesquisadores, educadores e profissionais da Saúde do mundo inteiro por ocorrer em qualquer tipo de circunstância: instituição pública ou privada, zona rural ou urbana, independente das condições sociais e económicas das pessoas envolvidas. De modo paradoxal, ocorre justamente no lugar em que, pela sua génese, as vítimas deveriam aprender o convívio social com respeito ao outro e a exercitar e desenvolver a sua individualidade e subjetividade sem coerção (Duque, 2007).

Em contrapartida, em contextos de trabalho, na Inglaterra e Áustria, há quem utilize o termo bullying in a adult ou bullying at work.

Também, Gonzalez-de-Rivera (2005) opina que o termo bullying, pode ser considerado sinónimo de mobbing, sendo o primeiro termo mais utilizado em Inglaterra e o termo mobbing no resto da Europa e Estados Unidos.

No entanto, Hirigoyen (2001) faz distinção entre mobbing e bullying. Segundo a autora, mobbing refere-se a perseguições coletivas ou a situações de violência por parte da organização (fig. 2).

 Fig. 2 – Características do mobbing  enquanto forma de agressão.

Bullying, por outro lado, é um termo mais amplo, que abarca as piadas, condutas com conotações sexuais ou agressões físicas, sendo uma violência com caráter mais individual do que organizacional.

Também Leymann (1996), sugere a utilização do termo bullying em casos de agressão ou violência física, e o termo mobbing para o assédio de caráter psicológico.

Do mesmo modo, Di Martino et al.  (2003) mencionam diferença nos termos bullying e mobbing, o primeiro é usado para situações de assédio individual enquanto o último está relacionado com situações em que o assédio parte de um grande número de agressores (assédio coletivo).

Chappel e Di Martino (2006) sugerem, no entanto, que nalgumas circunstâncias os termos auto-assimilam-se e alguns investigadores utilizam indiscriminadamente os dois conceitos independente do número de agressores envolvidos.

Analisando cada um dos fenómenos per si:

Relativamente às características pessoais dos autores de bullying, frequentemente podem ser citadas as disposições como a impulsividade, agressividade, irresponsabilidade, ansiedade, insegurança e elevada auto-estima. A insegurança traduz-se justamente na manutenção de um padrão que muitas vezes inibe as relações interpessoais e processos proximais, mas que no contexto em que ocorre é encorajado e valorizado, tornando os autores de bullying reconhecidos, ainda que pelo medo que inspiram. Possivelmente por não terem experienciado padrões relacionais diferentes, esses indivíduos não puderam desenvolver a habilidade – recursos – de relacionar-se de forma recíproca e afetiva. Entre os atributos dos autores de bullying geralmente encontram-se: beleza, alta estatura, utilização de roupas e acessórios da moda (Duque et al. , 2008).

Aqueles que somente sofrem bullying são chamados de vítimas ou alvos de bullying (sendo a última a denominação mais frequente na literatura) e podem ser vítimas passivas ou vítimas provocadoras, no caso das que provocam e desafiam os autores. Algumas pessoas, entretanto, podem tanto sofrer quanto praticá-lo. Estas são denominadas alvos-autores. No que concerne aos alvos ou vítimas de bullying passivas apresentam, em geral, características como fragilidade, timidez, baixa auto-estima e, por vezes, apatia. De modo geral, são consideradas pelos demais como pertencentes a um status social inferior e transformadas em objeto de diversão e prazer por meio de ‘brincadeiras’ maldosas e intimidadoras realizadas por um indivíduo ou grupo. Já os alvos ou vítimas provocadores podem possuir disposições como hiperatividade, inquietação, dispersão e condutas ofensivas (idem).

Quanto à categorização dos diferentes tipos de comportamento de bullying, nomeadamente a sua forma de expressão, parece consensual pela maioria dos autores uma primeira grande divisão entre comportamentos diretos e indiretos (Fontaine e Réveillère, 2004; Griffin e Gross, 2004).

O bullying direto ocorre “face a face”, ou seja, caracteriza-se por comportamentos de confrontação direta face ao sujeito-alvo (mais frequentemente físicos, verbais, de ameaça ou de intimidação). Neste caso os indivíduos envolvidos conhecem a identidade um do outro (o agressor e a vítima) e assume-se como o tipo de bullying mais fácil de reconhecer porque, na maioria dos casos, existem sinais observáveis de dano.

No âmbito do bullying indireto, não há uma confrontação direta entre os sujeitos envolvidos e, como tal, é mais difícil de reconhecer porque a vítima pode não se aperceber seja da identidade do agressor seja de quando o comportamento de bullying ocorreu. O principal objetivo do bullying indireto é excluir socialmente a vítima do seio do grupo (Seixas, 2006).

Vários estudos sugerem que, tanto o bullying como o mobbing afetam de forma negativa a saúde psicológica e física das suas vítimas. Assim, os alvos de bullying escolar, por exemplo, podem ser reconhecidos por apresentar, com frequência, desculpas para faltar às aulas ou indisposições, como dores de cabeça, de estômago, vómitos e diarreia antecedendo o horário de ir à escola; solicitação para mudar de sala ou de escola, sem apresentar motivos convincentes; desmotivação com os estudos, queda do rendimento escolar ou dificuldades de concentração e de aprendizagem; regresso da escola irritado ou triste, com as roupas ou materiais escolares sujos ou danificados; aspeto contrariado, deprimido, com medo de voltar sozinho da escola; com dificuldades de relacionamento com os colegas, de fazer amizades; e isolamento, sem desejo de contacto com outras pessoas, incluindo os familiares, etc. (Centro Multidisciplinar de Estudos e Orientação sobre o Bullying Escolar, 2008).

Relativamente ao efeito do mobbing sobre a saúde das vítimas, Piñuel y Zabala (2003) refere: efeitos cognitivos e hiper-reação psíquica: perdas de memória; sintomas psicossomáticos: pesadelos; dores abdominais; diarreias/colite; vómitos; náuseas; anorexia; isolamento; sintomas de alterações do sistema nervoso autónomo: dores no peito; sudorese; boca seca; palpitações; falta de ar; hipertensão arterial; sintomas de desgaste físico resultantes de stress prolongado: dores nas costas e nuca; dores musculares; distúrbios do sono: dificuldades para dormir; insónias; cansaço e debilidade: fadiga crónica; astenia; debilidade; desmaios e tremores.

Mobbing – Investigações em Profissionais

A OIT (Organização Internacional do Trabalho), menciona que, no ano 2000, 13 milhões de trabalhadores europeus foram vítimas de mobbing (Yerro et al. , 2002).

Estudos levados a cabo por ILO (2000), revelam que na Finlândia, Alemanha e Portugal, 70% ou mais dos agressores são colegas de trabalho do mesmo nível hierárquico.

Piñuel y Zabala (2004) realizou vários estudos, em trabalhadores espanhóis. Os resultados dos relatórios – Cisneros I e Cisneros II – concluíram que aproximadamente 2,3 milhões de trabalhadores espanhóis foram vítimas de mobbing nos últimos seis meses, ou seja, 15% da população ativa daquele país.

Di Martino et al.  (2003) analisou o tema de violência no trabalho e comparou os resultados das pesquisas sobre mobbing (estudo chamado de intimidação) nos vários países da Europa. Apesar das pesquisas não terem sido conduzidas pelos mesmos pesquisadores e seguirem procedimentos distintos na colheita de dados, verificou-se que a Finlândia e Holanda são os países que têm mais vítimas de mobbing e Portugal e Itália os que têm menos vítimas.

De referir, no entanto, que em Portugal há poucos estudos sobre o tema, ao contrário do que ocorre noutros países da Europa.

Também o quarto inquérito europeu sobre condições de trabalho realizado em 2005, pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho concluiu que: 5% (1 em cada 20) dos trabalhadores Europeus referem ter sofrido exposição à violência ou ameaças de violência; essa percentagem é referida aos últimos 12 meses e as mulheres são mais atingidas (6%) que os homens (4%). Relativamente aos países da União Europeia, é mencionado que a exposição ao mobbing ocorre: 17% na Finlândia; 12% na Holanda, 2% na Itália ou na Bulgária e Portugal tem um nível inferior à média comunitária, mas mais elevado que a Itália ou a Espanha (EFILWC, 2007).

Salin (2005) estudou especificamente a incidência deste fenómeno em executivos e verificou que 11,6% das mulheres executivas se consideravam vítimas versus 5% dos homens. Estes dados são congruentes com os alcançados por Hirigoyen (2001) ao demonstrar que as mulheres estão mais sujeitas ao assédio psicológico que os homens. No entanto, na investigação realizada por Piñuel y Zabala (2003) os homens e as mulheres são assediados de igual forma. Hirigoyen (2002) menciona que existe maior prevalência de mobbing em trabalhadores com idades superiores a 50 anos, não tendo sido encontrado nenhum caso em menores de 25 anos.

Piñuel y Zabala (2003), discorda com a autora supracitada, ao referir que nos jovens com menos de 30 anos o mobbing é mais elevado. O autor menciona que este fenómeno ocorre devido a uma maior preparação a nível académico (predominância de licenciados e pós-graduados), o que causa nos indivíduos mais velhos sentimentos de insegurança. Ainda segundo o mesmo autor, os que trabalham há menos de um ano e os que trabalham há mais de 10 anos manifestam ser vítimas de maior assédio moral: os primeiros pelo sentimento de ameaça nos mais velhos e os que trabalham há mais de dez anos,porque muitas vezes a própria empresa quer livrar-se deles.

Relativamente à classe profissional, Hirigoyen (2002) cita que este fenómeno está presente em quase todos os setores laborais: tendo maior prevalência 26% na área da gestão, contabilidade e funções administrativas; 9% na área da saúde; 9% no ensino; 9% em secretariados, balcões e centrais telefónicas; 9% em meios de pesquisa, investigação, informática e 9% nas áreas do comércio e vendas.

Estudos recentes revelam que os setores mais afetados são: a segurança social (15,2%), os profissionais de Saúde (15,3%) e os serviços de proteção (14,5%), (EFILWC, 2007).

O estudo de Barreto (2005, 96) menciona que o mobbing “ocorre em função da cor, orientação sexual e religiosa, portadores de necessidades especiais, sero-positivos, sindicalistas ou dirigentes combativos, ter doença/acidente de trabalho e até mesmo por ser solidário e ajudar o outro”.

Moreno-Jiménez et al.  (2005) e Nakamura e Fernández (2005) demonstram que o mobbing está associado a altas taxas de absentísmo e turnover e que os funcionários públicos apresentam mais probabilidades de ser assediados, quando comparados aos funcionários de empresas privadas.

Também o estudo de EFILWC (2007) confirma que os maiores níveis de mobbing se observam em instituições de grande dimensão, sendo o setor público o mais atingido. Cerca de 23% dos trabalhadores inquiridos referem absentismo e doença, nos 12 meses anteriores ao inquérito, dos quais 7% atribui o facto a causas relacionadas com o trabalho.

O estudo Cisneros V, realizado com 6.800 funcionários públicos (com 4.120 questionários válidos), revelou que 22% dos funcionários públicos espanhóis sofreram mobbing, sendo a frequência semanal ou diária, e que 53% destes apresentavam sintomas físicos ou psicológicos (Piñuel y Zabala, 2004).

Mobbing em Enfermeiros

O estudo Cisneros III de Piñuel y Zabala (2004), realizado em Espanha, com trabalhadores da área de Saúde, mostrou que 33% das enfermeiras espanholas estavam sujeitas a fenómenos de mobbing.

Carvalho (2007) realizou um estudo na Unidade Hospitalar de Bragança e refere que dos 70 enfermeiros inquiridos, 64 experimentaram pelo menos uma conduta de assédio. As condutas mais experimentadas foram: “interrupções quando fala” (73%), “críticas acerca do seu trabalho” (66%), “caluniam-no/a e falam nas suas costas” (53%), “criticam a sua vida privada” (50%) e “gritam-lhe ou repreendem-no em voz alta” (40%).

Posteriormente, a mesma autora deu continuidade ao estudo tendo constituído uma amostra de 399 enfermeiros, a exercerem funções no Centro Hospitalar do Nordeste e Centro Hospitalar de Trás-os-montes e Alto Douro. Verificou que 89,5% dos enfermeiros experimentaram pelo menos uma conduta de mobbing, 75,1% mencionam que o “interrompem quando falam”, 67,5% mencionam que “criticam o seu trabalho”, 55,5% queixam-se que “os seus superiores não os deixam expressar ou dizer aquilo que têm para dizer”, 52,9% citam que os “caluniam e falam nas suas costas”, 48,2% expõem que “criticam a sua vida privada”, 42,3% apontam que “quando solicitam uma autorização para um seminário ou formação é-lhe negado”, entre outras (Carvalho, 2010).

Um estudo realizado por Sá (2009) em várias unidades Hospitalares da região norte de Portugal, com 107 enfermeiros, mostrou que a maioria dos enfermeiros assediados têm entre 31 e 40 anos de idade (57%). Os tipos de assédio moral mais experimentados foram: “ser obrigado a realizar tarefas abaixo das suas competências” (50%); “serem-lhe retiradas áreas de responsabilidade ou serem substituídas por outras mais triviais ou indesejáveis” (50%); “estar exposto a uma quantidade de trabalho impossível de realizar”, (50%); “pressões para não reclamar aquilo a que tem direito” (43%) e “excessiva monitorização do trabalho” (36%).

Prevenção e intervenção no Bullying / Mobbing

Atendendo à incidência destes processos no âmbito laboral e não só, e às implicações ao nível da saúde decorrentes da vivência de episódios de bullying e mobbing, atrás descritas, e às repercussões que se estendem igualmente ao grupo de pares, ao clima das instituições e à comunidade em geral (sob a forma de criminalidade e problemas de saúde mental) a prevenção e intervenção precoce exige uma atenção privilegiada.

Frente à diversidade de pessoas e sistemas envolvidos e às suas múltiplas interações, não se pode reduzir o bullying apenas às características individuais dos sujeitos em questão e, tão pouco, a uma interação autor-alvo que ignore a teia complexa de relações envolvidas na manutenção do fenómeno. Além disso, é necessário investigar as condições e implicações do sujeito ao se colocar nas posições de alvo, autor e/ou testemunha dos episódios de bullying.

Por fim, deve considerar-se a história e a cultura de cada sujeito participante, bem como a história de cada relação existente no contexto estabelecido (Catini, 2004). Salientando que a prevenção pode ser considerada a diferentes níveis, com diferentes graus de intervenção, alguns autores têm caracterizado algumas medidas preventivas a nível primário, secundário e terciário (Elinoff, Chafouleas e Sassu, 2004; Mooij, 1998; Spivak e Prothrow-Stith, 2001; citados por Seixas, 2006) (fig. 3).

 Fig. 3 – Estratégias de prevenção do Bullying.

Assim de acordo com Seixas (2006: 191-192), “a prevenção primária dos comportamentos de bullying que decorrem em escolas destina-se a toda a comunidade escolar e à alteração do clima da instituição, procurando eliminar os fatores que promovem os comportamentos de bullying e de vitimização, e promovendo o desenvolvimento de competências pró-sociais de interação interpessoal. Inclui geralmente medidas complementares ou modificações no plano curricular, de forma a incentivar o desenvolvimento de competências linguísticas, sócio-comunicativas e procurando alcançar uma certa estabilidade emocional e psicológica por parte dos alunos”.

Neste domínio, defende que devem ser feitos esforços para alterar as normas sociais acerca do bullying, nomeadamente através do desenvolvimento de regras claras e sanções ou consequências decorrentes da sua infração. Já no que se refere à prevenção secundária, é fundamentalmente dirigida a alunos em risco (que exibam sinais de desordens ou problemáticas), no sentido de lhes proporcionar apoio e suporte complementar em domínios específicos, de modo a prevenir o desenvolvimento de problemas sociais mais severos. “Ao nível dos comportamentos de bullying, as estratégias de intervenção focalizam-se nos alunos identificados como de risco ou com alguns sintomas emergentes de agressividade ou de vitimização” (idem, 2006: 192).

Por último, a prevenção terciária, dirigida a alunos que manifestam comportamentos anti-sociais e necessitam da implementação de estratégias interventivas com o intuito de reduzir o seu comportamento agressivo. Na sua tese de Doutoramento a autora refere que, merece particular realce os trabalhos que, ao abordarem as estratégias de intervenção face ao bullying, se focalizam num abrangente plano de intervenção que contempla uma diversidade de passos com início numa avaliação do problema, na divulgação de informação e sensibilização para o fenómeno, na supervisão dos espaços pelos adultos, no incentivo de uma cultura de escola com regras e sanções que transmitam uma atitude de intolerância face ao bullying, no treino de professores e funcionários, no incentivo à participação parental, e na intervenção direta com os alunos, de acordo com o seu envolvimento em comportamentos de bullying. À semelhança deste processo, também a abordagem do mobbing requer um enfoque multidisciplinar, na prevenção e tratamento.

As intervenções podem centrar-se em dois campos: a resolução da situação de assédio psicológico e a abordagem das consequências do assédio para o próprio sujeito (fig. 4).

 Fig. 4 – Estratégias de abordagem do mobbing.

Como primeira estratégia a instituição de trabalho tem de estabeler planos preventivos, de informação e formação, a implementação de protocolos de ação. Estes protocolos permitem a abordagem dos seguintes aspetos: a) Criar uma cultura organizacional que minimize e evite o mobbing; b) Gerar estilos de gestão do conflito e de liderança participativos; c) Dotar as potenciais vítimas de instrumentos de comunicação formal do problema na organização; e d) Dispor de indicadores que circunscrevam a situação da organização com relação ao assédio psicológico.

O planeamento de estratégias para a avaliação dos riscos psicossociais da instituição, a avaliação dos riscos ocupacionais de origem psicológica, psicossocial e organizacional, a criação e execução de projetos para o desenvolvimento da qualidade de vida profissional. A segunda estratégia de tratamento do assédio psicológico na organização requer a ativação de planos de ação paliativos dos efeitos do mobbing e a minimização das consequências que este processo tenha causado aos trabalhadores. O assediado necessita, na maior parte dos casos, de tratamento de urgência (Blanco e López, 2002; Velásquez, 2001).

Algumas das medidas preventivas que a European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions (Seco, 2003) cita, como sugeridas pelo Parlamento Europeu, são: distribuir revistas sobre o assédio moral para informar as pessoas dos seus direitos e dos perigos que podem enfrentar no trabalho; publicar artigos em jornais e revistas internas da empresa ou mesmo na internet; apresentar vídeos sobre assédio moral; organizar exposições e debates sobre o assédio moral; abordar o tema em reuniões da empresa.

Neste contexto, Carvalho (2007) menciona que a prevenção deve atender a situações específicas do trabalho, tais como: proporcionar um baixo nível de stress, autonomia, atender ao comportamento dos líderes (devem desenvolver habilidades para reconhecer conflitos e geri-los adequadamente, conhecer os sinais e sintomas do mobbing), assim como atender à posição social do indivíduo (desenvolvimento de regras claras, explícitas, escritas e públicas sobre a resolução de conflitos pessoais, que garantam o direito à queixa, ao anonimato e a existência de sistemas de mediação.

Conclusões

Os estudos sobre bullying e mobbing realizados nas duas últimas décadas, por pesquisadores dos mais diversos países, têm demonstrado que estes fenómenos se encontram presentes no quotidiano das instituições, constituindo um problema real e grave para uma percentagem significativa da população ativa.

Com consequências a nível individual e organizacional, caracterizam-se por uma alta prevalência em várias profissões, nomeadamente nos enfermeiros.

Para evitar o seu aparecimento e desenvolvimento é necessário conhecer as suas manifestações e intervir precocemente enquanto abordagem coletiva e organizacional e não como um problema individual. Assim, é imperativo que as instituições de trabalho implementem medidas de prevenção bem como os fatores protetores que possam atenuar o impacto e minimizar o risco.

Para lutar eficazmente contra este problema, é necessário: repensar a cultura organizacional, a postura frente aos colegas e estimular a cidadania. Também neste âmbito, consideramos essencial a realização de investigações que possibilitem caracterizar a incidência e abrangência do problema e favoreçam o diagnóstico atempado e intervenção precoce.

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