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Congresso de Enfermagem de Reabilitação

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Congresso de Enfermagem de Reabilitação

Neste momento, existem um número crescente de ofertas, na comunidade, para suprimir as necessidades da pessoa dependente.

CONGRESSO DE ENFERMAGEM DE REABILITAÇÃO
“ A PESSOA, FUNÇÃO E AUTONOMIA – REABILITAR NOS PROCESSOS DE TRANSIÇÃO”

“All nurses can save lifes, rehab nurses save the quality of life.”

Laura Solkowitz, RN CRRN

Enf.ª Teresa Pais

(Ortopedia A r/c, CHUC – HUC, EPE)

Decorreu nos dias 23 e 24 de Março de 2012 na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC), o Congresso de Enfermagem de Reabilitação. A sua organi-zação foi levada a cabo pela UCP de Enfermagem de Reabilitação da ESEnfC, em cola-boração com os alunos do VI CPLEER da mesma escola.

Numa sociedade atual, em constante mudança e com o aparecimento de novos fenómenos sociodemográficos e de saúde, decorrentes de uma população cada vez mais envelhecida, do aumento das doenças crónicas e do aumento dos acidentes de viação/trabalho, a existência de um número crescente de pessoas com dependência nos autocuidados é notória. Esta realidade tem repercussões na qualidade de vida e nos custos individuais, familiares, profissionais, sociais e económicos.

Os Enfermeiros, nomeadamente os Enfermeiros de Reabilitação, suportados por um conjunto de conhecimentos e competências científicas, técnicas, humanas e culturais, são um elemento importante para a melhoria da qualidade de vida do doente em todas as suas dimensões e nos seus processos de transição.

Neste contexto, a realização deste congresso teve como grandes objetivos debater temáticas que nos fizessem refletir e discutir o conhecimento numa perspetiva de atualização e adquirir/desenvolver competências para intervir nos processos de transição dependência/autonomia.

O primeiro dia do congresso foi inaugurado pelo Dr. Adalberto Fernandes (Instituto Nacional para a Reabilitação), numa reflexão sobre a “Sociedade e pessoas em transição: que reabilitação”, que apelou acima de tudo ao nosso papel como enfermeiros/cidadãos, a importância da solidariedade e do exercício da cidadania em pleno, fazendo alusão à música “Movimento Perpétuo Associativo” do grupo “Deolinda”, que personifica a nossa postura atual como cidadãos. “Agora não, que…”, sempre encontramos uma justificação para evitarmos dedicar algum tempo aos outros e a tentar suprir as suas necessidades. Em suma, dever-se-ia refletir para uma maior abertura dos Enfermeiros de Reabilitação para a comunidade e suas entidades, como promotores da pessoa com deficiência.

A primeira mesa redonda, subordinada ao tema “Enfermeiro (Reabilitação) e a pessoa dependente em contexto familiar, domiciliar e comunitário – práticas de sucesso”, contou com o contributo de profissionais que trouxeram relatos de projetos de sucesso, já implementados, assim como com o testemunho de uma familiar de uma pessoa dependente, no papel de prestadora de cuidados.

O Enf.º Fernando Petronilho (docente da ESE da Universidade do Minho), autor, entre muitos outros, do livro “Preparação do Regresso a Casa”, abordou quais os critérios e decisões sobre o destino após a alta, da pessoa dependente. Da autoria do mesmo, foi apresentado o instrumento de avaliação/decisão, que está a ser aplicado neste momento nos hospitais do Alto Minho. Este apresenta seis categorias de decisão e é aplicado pelos enfermeiros do internamento, no momento da alta: 1 – Potencial de reconstrução da autonomia do cliente dependente no autocuidado; 2 – Tipo e nível de dependência no autocuidado; 3 – Compromisso dos processos corporais; 4 – Complexidade do regime terapêutico; 5 – Potencial do membro da família prestador de cuida-dos para tomar conta; 6 – Processo familiar. Numa comparação feita pelo Enf.º Fernando Petronilho dos itens contemplados pelo mesmo em cada categoria e os contemplados na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), verificou-se que os critérios considerados na RNCCI são em número inferior, o que pode contribuir para uma tomada de decisão menos assertiva.

O planeamento da alta hospitalar, desde o momento da admissão, envolvendo a pessoa, a família e a equipa multidisciplinar, garante um processo mais célere e seguro, com respostas mais adequadas às necessidades da pessoa dependente.

Neste momento, existem um número crescente de ofertas, na comunidade, para suprimir as necessidades da pessoa dependente. Com a constituição da RNCCI pretendeu-se promover a continuidade de cuidados de forma integrada a pessoas em situação de dependência e com perda de autonomia. A prestação dos cuidados de saúde e de apoio social é assegurada através de unidades de internamento e de ambu-latório e de equipas hospitalares e domiciliárias.

Neste contexto, as Enf.as Fátima Batista e Teresa Coelho, da Equipa de Cuidados Continuados Integrados (ECCI) de Vizela, compartilharam connosco a sua experiência nesta unidade, que presta serviços domiciliários, a pessoas em situação de dependên-cia funcional, doença terminal ou em processo de convalescença, cuja situação não requer internamento, mas que não podem deslocar-se do domicílio. Esta é composta por uma equipa multidisciplinar da responsabilidade dos cuidados de saúde primários e das entidades de apoio social. Esta unidade entrou em funcionamento em dezembro de 2010 e durante o ano de 2011 receberam 36 utentes, 55% dos quais foram referenciados pelas Equipas de Gestão de Altas (EGA), como os seguintes motivos: reabilitação (82%), tratamento de feridas (15%) e gestão do regime terapêutico (3%). Durante o mesmo ano, 9, dos 36 utentes tiveram ganhos, segundo o índice de Barthel, 24 manti-veram a mesma situação, ouve dois óbitos e duas altas a pedido. O balanço é portanto positivo, apesar da curta existência da ECCI de Vizela.

Outro testemunho foi o do Enf.º Otávio Ferreira, do setor domiciliário do Servi-ço de Medicina Física e de Reabilitação do HUC, EPE. Este setor existe desde 1992 e tem como missão a reabilitação e readaptação funcional dos utentes encaminhados do internamento e/ou consulta externa, desta instituição. Numa primeira fase, é realizada uma visita domiciliária, pelo enfermeiro, médico e assistente social, onde é feita a avaliação do potencial de reabilitação/capacidades restantes (Medida de Independência Funcional – MIF), avaliação e proposta das adaptações necessárias no edifício residencial e prescrição/fornecimento das ajudas técnicas adequadas à situação. Posteriormente é planeada uma intervenção domiciliária, no sentido de potencias as capacidades restantes e prestar apoio ao prestador de cuidados informal/formal.

Muitas vezes o papel de cuidador da pessoa dependente cabe a um ou mais elementos da família. A adaptação da família ao exercício do papel de cuidadora inicia-se desde a admissão da pessoa no hospital, mas não termina com a alta hospitalar, por isso, é fulcral a continuidade dos cuidados, onde o exercício profissional dos enfermeiros, nas diferentes etapas, é relevante. O testemunho da Daniela Abreu Antunes mostrou isso mesmo. A Daniela foi cuidadora informal da sua avó, que devido ao diagnóstico de fibrose pulmonar em 2004, viu a sua situação clínica agravar em 2010, tendo estado internada e a quando da alta hospitalar estava dependente nos autocuidados e necessitava de cuidados específicos, nomeadamente oxigenoterapia a 12 l/min (que implicava a substituição da bala de oxigénio de 3 em 3 horas). A avó da Daniela era assistida pela equipa do Setor Domiciliário do SMFR dos HUC, que segundo a própria, foi muito importante no apoio à avó e a ela própria, no plano emocional e técnico, apresentado total disponibilidade. As principais dificuldades que a Daniela sentiu foram o desgaste físico e emocional, devido à situação da avó, que acabou por falecer e a escassez de informação técnica sobre as suas funções como cuidadora informal.

A manhã do primeiro dia terminou com a “Dança – uma forma de expressão e terapia na pessoa em reabilitação”, com o contributo da Enf.ª Ana Falcão do CMFR do Alcoitão e de um grupo de cidadãos com deficiência motora, utentes da mesma instituição, numa homenagem ao fado e ao flamenco.

Na segunda mesa redonda do congresso, foi abordado o tema “Mobilidade comprometida”, na fase aguda e fase crónica.

O doente do foro ortotraumatológico está sujeito, muitas vezes, a períodos prolongados de imobilidade. Como foi abordado pelo Enf.º Rogério Amaro (Ortotrau-matologia, CHUC – Hospital Geral), estes doentes beneficiam de um plano de reabilitação precoce, quanto possível, que se reflete no aumento da sua qualidade de vida e diminuição do tempo de internamento e utilização subsequente dos serviços de saúde. Nesta fase, as intervenções do Enfermeiro de Reabilitação passam pela realização de uma avaliação inicial (escala da força muscular, goniómetro, capacidade funcional para as AVD’s), definição dos diagnósticos e das intervenções de Enfermagem (posicionamento terapêutico, exercícios terapêuticos, cinesiterapia respiratória, transferências, marcha e realização de ensinos). O envolvimento da família no processo de reabilitação é facilitador para o sucesso do mesmo.

Na fase crónica, o Enfermeiro de Reabilitação segue os mesmos passos da fase aguda, e elabora um plano de reabilitação que visa para promover a independência e da autonomia do doente, potenciando as capacidades restantes. Como foi referido pelo Enf.º José Vitor Silva da Unidade de Convalescença do HAJC – Cantanhede, o envolvimento da família neste processo é essencial. Não só para motivar o doente, mas, também, para capacitar o prestador de cuidados para satisfazer as necessidades do doente da forma mais adequada, após a alta. A equipa da Unidade de Convalescença tem em curso dois projetos:

  • “Saber cuidar – um direito” – Visa avaliar os ganhos, em aprendizagem de habilidades, dos prestadores de cuidados;

  • “Visita domiciliária pós-alta” – Das visitas realizadas, os principais problemas identificados foram fatores ambientais potenciadores do risco de queda, sobrecarga (física e emocional) do prestador de cuidados e conhecimento não demonstrado nas necessidades identificadas. As intervenções de Enfermagem passaram essencialmente por suporte emocional, motivação/elogio ao utente e prestador de cuidados, aconselhamento sobre precauções de segurança/aquisição de ajudas técnicas/eliminação de barreiras arquitetónicas e ensino/instrução das necessidades identificadas.

O primeiro dia terminou com a mesa redonda “O Enfermeiro de Reabilitação: uma mais-valia?” na pediatria, unidade de cuidados intensivos e na área da oncologia mamária.

A Enf.ª Paula Pleno, do Hospital Pediátrico de Coimbra, falou-nos da sua experiência na área da pediatria. Os princípios da Enfermagem de Reabilitação são idênticos aos aplicados aos adultos, mas adaptados às fases de desenvolvimento da criança. A principal dificuldade com que se depara será mesmo o rápido crescimento e a rápida transição entre as várias fases de desenvolvimento. As funções do Enfermagem de Reabilitação em pediatria passam pela prevenção de complicações, readaptação funcional e inserção social. Para uma intervenção de sucesso, o Enfermeiro terá de possuir uma visão global do meio familiar e social que envolve a criança e deverá estabelecer com a família uma parceria de cuidados, funcionando como Enfermeiro de referência para a família e outras instituições. As intervenções do Enfermeiro de Reabilitação serão, então, não apenas destinadas à criança, mas centradas na família.

Na sociedade atual, em que há uma diminuição da mortalidade infantil e, simultaneamente, um aumento de co-morbilidades e situações crónicas, o número de crianças com necessidades especiais tem aumentado. De momento, não há respostas de apoio suficientes para estas crianças. Para superar esta realidade, tenta-se encontrar nos pais parceiros de cuidados e dotá-los de conhecimentos técnicos para fazer face às necessidades dos seus filhos. O Enfermeiro de Reabilitação em pediatria é uma mais-valia neste sentido. Funciona como o profissional de referência, facilitador na acessibilidade aos cuidados de saúde e com disponibilidade para as crianças.

A trabalhar na Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) do CHUC – Hospital Geral, a Enf.ª Helena Rodrigues transmitiu a sua experiência como Enfermeira de Reabilitação nesta unidade. A permanência nas UCI’s, pode acarretar:

  • Efeitos adversos da imobilidade – físicos e psicológicos –, pela doença crítica e/ou ventilação mecânica prolongada;

  • Síndrome de neuropatia adquirida em UCI, por aumento da sobrevivên-cia: tetraparésia, desmame ventilatório difícil e prolongado…

A intervenção do Enfermeiro de Reabilitação passa essencialmente pela reabilitação motora e cinesiterapia respiratória. Após uma avaliação inicial do doente, será estabelecido um plano de intervenção, tendo por base uma abordagem multifatorial, uma monitorização adequada para garantir a segurança do doente e sempre um adequado controlo da dor. A mobilização precoce, através dos posicionamentos no leito e da reabilitação motora, tem efeitos positivos nos valores da MIF, levando a diminuição do tempo de desmame ventilatório e em última instância, diminuição do tempo de internamento e aumento da qualidade de vida.

A exercer funções no Instituto Português de Oncologia do Porto, a Enf.ª Rosa Ascensão, falou-nos da sua experiência como Enfermeira de Reabilitação na área da oncologia mamária. O tratamento da neoplasia mamária pode passar pela cirurgia, radioterapia, hormonoterapia e quimioterapia. A cirurgia é a mais utilizada, associada normalmente às outras formas de tratamento. A área de intervenção do Enfermeiro de Reabilitação, após a cirurgia, será atuar na prevenção das principais complicações que podem ocorrer: alterações cutâneas (aderências,…), alterações posturais (posição anti álgica), alterações da imagem corporal, alterações respiratórias, fadiga e astenia, dor relacionada com a inflamação dos nervos e músculos peitorais, alterações da amplitude de mobilização do membro superior e linfedema. O linfedema é uma das principais preocupações dos profissionais de saúde. Os cuidados com o braço homolateral da cirurgia passam por manter a pele limpa e hidratada, evitar temperaturas elevadas, picadas, avaliações de tensão arterial, roupas/adereços apertados, usar mala ao ombro, pegar pesos superiores a 2 Kg, não cortar as cutículas, entre outros. Para além destes cuidados, deve ter uma alimentação equilibrada (cuidados com o sal), manter o peso ideal, manter o membro em drenagem, sempre que possível e efetuar os exercícios de mobilização 3 a 5 vezes ao longo do dia, de preferência em frente ao espelho.

O momento de confirmação do diagnóstico dá início ao processo de reabilitação, que é feito a nível motor, mas também a nível da autoestima, área fundamental para o sucesso da reabilitação motora. A reabilitação deve ser iniciada o mais precoce possível, tendo em vista a recuperação da mobilidade articular e da força muscular, assim como, a diminuição da dor.

O segundo dia do congresso começou com a conferência “Criatividade, inovação e empreendedorismo na reabilitação”, com o Enf.º Pedro Parreira, Coordenador do Gabinete de Empreendedorismo da ESEnfC. O Enfermeiro de Reabilitação possui um conjunto de competências específicas, presentes no Regulamento n.º 125/2011. A sua área de intervenção implica, muitas vezes, recurso à criatividade para proporcionar intervenções terapêuticas que visam melhorar as funções residuais, manter ou recuperar a independência nas atividades de vida e minimizar o impacto das incapacidades instaladas. Cabe ao Enfermeiro de Reabilitação transformar as necessidades dos utentes em valores, pensar global e agir localmente.

A transformação de ideias em projetos exige o estabelecimento de parcerias com outras áreas de conhecimento, no sentido de conseguir encontrar a solução para um problema. Mas para isso é necessário correr riscos (de forma calculada), resiliência, determinação, etc.

A última conferência do congresso, realizada pelo Dr.º Avelino Fraga, Urologista no CHP – Hospital Geral de Santo António, foi relativa à “Fisiopatologia da eliminação vesical – que intervenções?”. A perda involuntária de urina apesar de comum e ao contrário da crença popular, não é normal a partir dos 5 anos de idade. A incontinência urinária para muitas pessoas, é uma fonte de constrangimento e dificuldade social que é escondida e deixada sem tratamento.

O diagnóstico da incontinência urinária é essencialmente clínico (história clínica e exame físico). O recurso aos estudos urodinâmicos permite quantificar os sinais e sintomas, estabelecer um prognóstico, implementar terapêutica orientada e avaliar os resultados dos tratamentos. O estudo urodinâmico consiste no estudo das pressões e compartimentos durante o ciclo miccional e, como o próprio nome indica, trata-se de um estudo dinâmico.

O papel do Enfermeiro de Reabilitação é fundamental em todo este processo, quer na deteção precoce, na avaliação e realização dos estudos urodinâmicos e na reabilitação (técnicas comportamentais, exercícios de fortalecimento da musculatura pélvica, electroestimulação e biofeedback). É essencial uma maior exploração desta área de intervenção, pelos Enfermeiros de Reabilitação, nomeadamente na realização dos estudos urodinâmicos.

O congresso terminou com o debate produtivo “Pensar Enfermagem. O Enfer-meiro de Reabilitação em equipa ou na equipa”, que contou com a presença e contributo do Enf.º Belmiro Rocha (Presidente do Colégio da Especialidade de Enfermagem de Reabilitação), Enf.º Carlos Margato (CHUC – HUC, Coimbra), Enf.º Carlos Lourenço (HIP, Aveiro), Enf.ª Filomena Henriques (CHUC – HUC, Coimbra) e Enf.ª Maria Isabel Ribeiro (APER).

Paralelamente ao Congresso decorreram os Workshops “A tecnologia na mobi-lização das secreções”, “Massagem desportiva”, “Bandas neuromusculares”, “Reabili-tação cognitiva”, “Imobilizações funcionais gessadas” e “Avaliação do volume vesical por ecógrafo”. Os participantes do Congresso foram ainda brindados com um espaço de massagens onde, durante 15 minutos, podiam experimentar os efeitos de uma massagem de relaxamento e com visitas a laboratórios de reabilitação e de AVD / apartamento adaptado.

Para consulta: