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As necessidades de informação sobre sexualidade da Pessoa Ostomizada 

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Revista Nursing

Os mitos e os medos estão intimamente associados às questões sexuais, à sexualidade e à saúde sexual

Nursing nº 243

Resumo

O impacto físico e psicológico de uma ostomia na sexualidade em ambos os géneros exige que entendamos a sexualidade da pessoa Ostomizada como uma parte integrante e fundamental da sua qualidade de vida. Esta afirmação adquire maior significado se atendermos às conclusões de um estudo já realizado, denominado EPICO (Epidemiologia e Investigação em Cuidados em Ostomia), cujos resultados mostram que as pessoas ostomizadas portuguesas evidenciam alterações da sua vida sexual devido ao estoma e simultaneamente referem possuir um baixo nível de informação nesta área, por não lhes ter sido proporcionada ao longo do seu processo de reabilitação.

Atentos a esta realidade e procurando dar respostas eficazes para as necessidades específicas desta população a este problema, surgiu o presente trabalho, que teve como objectivo – Identificar as necessidades da pessoa ostomizada relativamente à informação sobre a Sexualidade.

Palavras-chave: Sexualidade, Informação, Pessoa Ostomizada

Introdução

A construção de uma ostomia implica mudanças no estilo de vida, nas relações familiares e sociais do indivíduo, podendo ainda ocorrer alterações no desempenho dos papéis sociais. Estas mudanças são consequência da perda de controlo esfincteriano, da alteração da auto-imagem, da auto-estima e das alterações sexuais que podem advir destas cirurgias.

A facilidade com que a pessoa ostomizada supera estes obstáculos depende muito da sua capacidade de expressar o que sente, manifestando os seus medos e dificuldades.

Segundo SERRANO E PIRES (2005:37) “para além do medo e ansiedade inerentes à própria cirurgia, pode também surgir medo da reacção da família e amigos perante a sua ostomia. Sentimentos de raiva, choque, inferioridade que aniquila a auto-confiança, a sensação de mutilação ou dependência podem surgir. Para além destes, pela alteração da imagem corporal, em que a saída das fezes passa a ser feita por abertura não natural do abdómen, o doente poderá sentir vergonha, sentir-se menos atraente, sentir repugnância e nojo de si próprio e refugiar-se num isolamento social”.

Numa concepção não reducionista da saúde/doença e do corpo, onde as acções não são unicamente cognitivas, mas representam uma carga afectiva simbólica, a alteração da imagem corporal na pessoa ostomizada representa um elemento chave e determinante de muitos aspectos da sua qualidade de vida, nas diversas fases do seu processo de reabilitação.

Situada na interface das dimensões física e psicológica, a sexualidade continua a persistir como uma valência frequentemente ignorada. Se associarmos a ideia socialmente enraizada da sexualidade na deficiência como uma ausência, surge o estereótipo de que a pessoa deficiente ou portadora de um corpo não saudável é assexuada, ou, na melhor das hipóteses, sexualmente inadaptada. Assim como foram socializados, segundo esta crença, as pessoas sujeitas a uma ostomia, sentem-sediminuídasedesprovidas de interesse sexual, assumindo atitudes de negativação da sua vida sexual futura (CARDOSO, 2003).

A sexualidade e as expressões sexuais são ainda assuntos difíceis de abordar, incluindo os profissionais de saúde e as pessoas Ostomizadas.

Os mitos e os medos estão intimamente associados às questões sexuais, à sexualidade e à saúde sexual. Muitos destes mitos e medos, estão presentes quer na educação quer no ambiente clínico, que condicionam os profissionais de saúde de abordar e tratar o ostomizado na sua plenitude e conferir-lhe bem-estar. Tanto a pessoa ostomizada, como os profissionais de saúde têm dificuldade de abordar a temática da sexualidade, resultante de ideias preconcebidas acerca das mesmas. A pessoa ostomizada sente que pode ser inapropriado ou embaraçoso abordar temas de índole sexual com a equipa terapêutica, por entender que esta pode ser uma preocupação secundária; que pode ter uma imagem corporal negativa, pensando ser indesejável ou pouco atraente, persistindo a ideia de que quando se está ostomizado “não se é desejado”. O parceiro, por sua vez, preocupa-se que o ostomizado esteja demasiado debilitado para desejar a actividade sexual e sente culpa pelo seu interesse (EVAN, 2001).

A complexidade da situação exige uma intervenção profissional diferenciada que responda às necessidades específicas, que só através de um acompanhamento personalizado, proporcionando informação e ensinos adequados às necessidades individuais, se pode ultrapassar. O ensino à pessoa ostomizada visa não só a preparação para o auto-cuidado e a sua independência, mas também a reinserção sócio-familiar, profissional, sexual e cultural.

Assim, na continuidade do projecto de Investigação EPICO, constituído por três estudos (com a participação da Pessoa Ostomizada, Familiares e Profissionais de Saúde de várias Instituições de Cuidados de Saúde Primários e Hospitalares a nível nacional, elaborado e realizado em 2005), e após a análise dos resultados do estudo 2 – Avaliar o nível de qualidade de vida da pessoa ostomizada e seus cuidadores em função da informação recebida, constatamos que, os ostomizados referenciam a necessidade de mais informação respeitante a alguns aspectos, nomeadamente às alterações da vida sexual após a realização de uma ostomia e à execução da técnica de irrigação. Existe o sentimento de que a ausência desta informação interfere na sua qualidade de vida. As conclusões deste estudo vieram reforçar os sentimentos vividos pelos profissionais de saúde que acompanham a pessoa ostomizada durante todo o percurso do seu tratamento.

Sendo este um problema referido pela pessoa ostomizada e que compromete a sua qualidade de vida, demos início a um trabalho, que, na 1ª fase, teve como principal objectivo identificar as necessidades da pessoa ostomizada relativamente à informação sobre a sexualidade: Que tipo de informação? Em que momento é que esta deve acontecer? Como e através de quem?

METODOLOGIA

Este estudo é quantitativo, exploratório, descritivo, com uma amostra não probabilística por acessibilidade, constituída por 135 indivíduos, distribuídos pelo território de Portugal Continental, que decorreu entre Setembro de 2006 e Abril de 2007. Os questionários foram entregues por enfermeiros com consulta de estomaterapia e dos 270 entregues foram recebidos 135, tendo sido cumpridos todos os aspectos éticos de garantia de privacidade e confidencialidade. Como critérios de inclusão definiram-se: indivíduos submetidos a uma ostomia de eliminação com pelo menos três meses, que soubessem ler e escrever, orientados no tempo e no espaço e com disponibilidade para participar no estudo.

O questionário utilizado para a colheita de dados foi elaborado pela equipa de investigadores que, de forma consciente, não utilizou nenhum instrumento de colheita de dados já validado, por não existir nenhum que desse resposta às questões que se pretendiam ver esclarecidas. A análise dos dados foi efectuada através de estatística descritiva recorrendo ao programa SPSS 15 e os gráficos realizados em Excel.

Dada a sensibilidade do tema, o grupo deparou-se com alguns constrangimentos para a realização do estudo, verificando-se estes, não só a nível institucional, nas comissões de ética, mas também nos próprios profissionais de saúde, por não se sentirem confortáveis para abordarem este tema.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Características da amostra

A amostra é constituída maioritariamente por homens (64%), com idades compreendidas entre os 51 e os 70 anos (60% do total). A maioria (81%) é casada ou vive em união de facto. Em relação à escolaridade, 44% tem até à 4ª classe. Dos elementos da amostra 79% foram submetidos a uma colostomia, sendo a causa mais frequente o cancro do cólon (42%). Em relação ao tempo de ostomia, 60% tem uma ostomia há 2 ou menos anos.

Entendemos ser importante conhecer se existem e quais são as alterações da vida sexual, servindo a cirurgia que deu origem ao estoma como marco. Estes resultados comparam quer a importância dada à vida sexual, quer a satisfação com a mesma antes e depois da cirurgia. É facilmente percebido que existe um decréscimo importante em relação à satisfação e à importância da vida sexual depois da realização da ostomia. Destaca-se para além da descida dos que atribuem graus de grande ou muito grande importância e satisfação antes da cirurgia, para uma subida acentuada depois da cirurgia dos graus de pequeno e nula importância e satisfação na vida sexual.

Em relação aos aspectos considerados pela nossa amostra como mais importantes na vida sexual, destacam-se os contactos de afecto (beijar, abraçar, acariciar) com 80%, seguidos do desejo com 68%. Existe ainda uma percentagem importante de respondentes que considera a atracção, o orgasmo, a erecção, a excitação e o coito como importantes. Nestes aspectos as mulheres valorizam mais frequentemente os contactos de afecto que os homens.

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No que diz respeito à existência de problemas a nível sexual, cerca de 90% refere que antes da cirurgia não tinha problemas e depois da cirurgia apenas 37% diz não os ter. Destes problemas, destacam-se a falta de erecção por 62%, falta de desejo sexual por 33%, a ansiedade referida por 19% e o cansaço por 16%.

Os homens afirmam, com maior frequência que as mulheres, ter problemas a nível sexual (70% de homens versus 51% de mulheres). Os homens referem como principal problema a falta de erecção (79%) e as mulheres referem maioritariamente a falta de desejo sexual (65%).É possível que seu navegador não suporte a exibição desta imagem.É possível que seu navegador não suporte a exibição desta imagem.

Quando questionados sobre o ínicio da sua vida sexual, 47% dos respondentes afirma não ter iniciado, apontando como principais causas a falta de desejo sexual, 56%, e o medo que o saco rebente, 33%.

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Problemas a Nível Sexual

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Cerca de 40% dos inquiridos afirma que a presença do estoma influencia a sua vida sexual, referindo comoprincipal causa a presença do dispositivo e a alteração da imagem corporal. Em relação à presença do estoma, as mulheres parecem um pouco mais afectadas que os homens (46% contra 37%).

No que diz respeito à informação, 50% afirma não ter recebido nenhuma informação. Dos que responderam afirmativamente, 58% receberam informação sobre a vida sexual, dos quais 38% receberam informação após a cirurgia e 20% antes da cirurgia. Em relação às fontes de informação, 66%, recebeu através da enfermeira estomaterapeuta e 42% através do cirurgião.

Informação Recebida pela Pessoa Ostomizada

É possível que seu navegador não suporte a exibição desta imagem.49.3% Não Recebeu Nenhuma Informação

Independentemente do tipo de informação, 86% gostaria de a obter através de um profissional de saúde. Em relação ao momento para receber esta informação, 50% prefere antes da cirurgia, 22% logo após a cirurgia e 22% 2 semanas a 4 meses após a cirurgia.

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Informação Recebida pela  Pessoa Ostomizada

86% quer receber informações através dos profissionais de saúde

 

Em relação ao tipo de informação que gostariam de obter, 52% não responde. Os que responderam (48%), referem os temas de forma geral como a sexualidade (17%) e alterações da auto-imagem (11%). Esta grande percentagem de não respondentes pode dever-se ao facto dos ostomizados desconhecerem que tipo de informação é que podem receber.

CONCLUSÃO

Os resultados deste estudo permitiram-nos responder às questões colocadas, umas de forma mais directa e outras de forma mais indirecta.

Em relação à questão informação através de Quem, o mais referenciado é o profissional de saúde, tendo o enfermeiro estomaterapeuta um papel de destaque.

No que diz respeito ao Quando, a maioria, cerca de 75%, refere antes e logo após a cirurgia. De salientar que o momento antes da cirurgia é preferido por 57% dos homens versus 36% das mulheres.

Em relação ao Tipo de informação e Como, as respostas obtidas nestes itens não são conclusivas, mas evidenciam as alterações que surgem após a cirurgia e identificam quais são. Estas dificuldades expressas pela pessoa ostomizada, orientam a nossa abordagem em relação a estas duas questões.

Os resultados deste estudo foram apresentados no WCET (Congresso Mundial de Estomaterapia), na Liubliana, na Eslovénia, em 2008.

Após esta fase de identificação das necessidades, como objectivo final e numa nova fase do projecto, as nossas intervenções serão direccionadas ao profissional de enfermagem e à pessoa ostomizada e sua família. Estas intervenções passam pela definição de estratégias facilitadoras da abordagem desta temática; pela formação específica nesta área aos enfermeiros que trabalham directamente com as pessoas ostomizadas, uma vez que estes têm um papel muito importante no processo de reabilitação da pessoa com ostomia; pela criação de parcerias com outras especialidades; e também pela elaboração de suportes escritos direccionados quer a profissionais, quer à pessoa ostomizada e sua família.

BIBLIOGRAFIA

  • CARDOSO, Jorge – Sexualidade e deficiência. Adaptação psicológica e sexualidade na lesão medular – Coimbra: Quarteto, 2006. ISBN 989-558-060-6.
  • EVAN, David T. – Falar de sexo: a necessidade de descartar os mitos e superar os medos. Nursing. ISSN 0871-6196.Nº 154. Ano 13 (Abril. 2001), p. 34-40.
  • SERRANO, Cláudia Marisa; PIRES, Pedro Miguel D. Ferreira – Enfermeiro e o Doente Ostomizado. Nursing. Lisboa.ISSN 0871-6196. Nº 203 Ano 16, (Outubro. 2005). p. 35-41.